Em artigos anteriores tivemos oportunidade de abordar alguns problemas da atualidade, como seja a “crise climática”, procurando destacar o contributo que as artes visuais podem ter na sensibilização e responsabilização das pessoas.
Desta vez gostaríamos de chamar a atenção para aquele que é um dos principais problemas humanitários no presente, a crise dos migrantes e dos refugiados.
Os refugiados são pessoas que procuram fugir de zonas de guerra ou de perseguições, enquanto os migrantes procuram mudar de país ou de região em busca de melhores condições de vida.
Numa época em que cada vez mais se apela à paz, são ainda muitos os conflitos armados em várias zonas do planeta. A situação mais recente que preocupa todos os que defendem a paz e a defesa dos direitos humanos está a ocorrer no Afeganistão, com a tomada do poder pelos Talibã.
Mas, para além da gravidade das situações relativas aos refugiados, também merece uma atenção especial a situação dos migrantes em várias zonas do planeta, nomeadamente aqueles que procuram deslocar-se do México para os EUA e aqueles que procuram ir do continente africano para a Europa. Segundo a Organização Internacional para Migrações (OIM), desde 2014 já perderam a vida mais de 20 mil migrantes a tentar atravessar o Mediterrâneo.
Num mundo cada vez mais global, em que a internet nos permite circular e estarmos virtualmente em todo o lado, sem fronteiras, é paradoxal que sejam cada vez mais restritivas as fronteiras físicas entre países e territórios.
Simultaneamente, num mundo em que cada vez mais se fala da importância dos direitos humanos, da tolerância e da inclusão, são inúmeras as situações de racismo e xenofobia que limitam as possibilidades de interação social e de mobilidade física entre países e entre espaços territoriais.
Desde há muito tempo que a arte tem servido como instrumento de crítica e para serem tomadas posições políticas em relação a diversos assuntos, nomeadamente questões sociais. Aliás, os artistas envolvem-se frequentemente em movimentos sociais, expressando a grande relação das artes com o ativismo político e social. As obras produzidas procuram ter impacto comunicacional, chamando a atenção para aspetos da realidade que deveriam ser corrigidos ou resolvidos.
Um dos artistas que se tem destacado neste âmbito, no que diz respeito às questões ligadas às migrações, é JR, o qual procura expressar ideias com grande valor simbólico e afetivo, tendo uma das suas últimas produções artísticas, em 2017, consistido na colocação da uma fotografia com cerca de 20 metros de altura de um bebé que olhava por cima do muro que divide os EUA e o México. A emigração tem sido um dos temas trabalhados por JR, pois já em 2007 havia colocado fotos de grande dimensão de palestinos e israelitas cara a cara em oito cidades do mundo, procurando chamar a atenção para o muro que os separa.
Também o artista mexicano-estadounidense Ricardo Hernández utiliza a arte como forma de ativismo para criar consciência sobre a situação difícil dos emigrantes centro-americanos e mexicanos com a política de imigração dos EUA.
No mesmo sentido, Banksy, um dos artistas mais conceituados na atualidade e ao qual já fizemos referências em diversos artigos anteriores, tem realizado diversos trabalhos sobre os problemas das migrações e dos refugiados, sobretudo do Médio Oriente e do Norte de África.
Por exemplo, em 2015, pintou um retrato de Steve Jobs, cofundador da Apple e filho de um imigrante sírio nos EUA, numa parede de um campo de refugiados em Calais (norte da França). Esta obra foi intitulada como “The Son of a Migrant from Syria” (“O filho de um migrante da Síria”), mostrando Jobs a carregar uma mochila e um computador da Apple. Desta forma, na “Selva” de Calais, Banksy relembra que a Apple só existe porque os EUA um dia deixaram entrar um rapaz oriundo de Homs (Síria), o pai de Steve Jobs.
Em 2018, Banksy realizou uma dezena de murais nas ruas de Paris sobre a crise migratória e, em 2019, na Bienal de Veneza, apresentou uma obra de um menino vestindo um colete salva-vidas e segurando uma chama de socorro rosa.
Mais recentemente, em 2020, Banksy doou um tríptico intitulado “Mediterranean sea view” (“Vistas para o Mar Mediterrâneo”) para arrecadar fundos para a reforma e compra de equipamentos de reabilitação infantil para um Hospital da Cisjordânia. A obra mostra coletes salva-vidas laranja perdidos entre o mar e uma costa rochosa, foi leiloada pela Sotheby’s por cerca de 3 milhões de euros. Esta obra faz alusão aos milhares de vidas perdidas no mar mediterrâneo e representa uma crítica face à resposta hesitante da Europa em relação à crise migratória.
Terminamos fazendo referência a uma exposição que está a decorrer, até 31 de outubro, na Ilha de Menorca, em pleno Mar Mediterrâneo, intitulada “Masses and Movements” (“Movimentos de Massas”), da autoria do artista de Los Angeles Mark Bradford, que, através da linguagem visual evoca múltiplas narrativas de um mundo em movimento, com destaque para a crise dos migrantes. Além disso, Bradford está a procurar levar educação artística às comunidades de imigrantes, como forma de os ajudar na sua inclusão e integração social.
Estes exemplos mostram que a imagem visual pode sintetizar questões psicossociais complexas e atuais e pode ajudar a promover a necessária reflexão sobre as mesmas.
A arte visual é uma forma de comunicação, permitindo sintetizar em imagens, as emoções e os sentimentos sociais já existentes em relação a certas questões polémicas.
A propósito das questões climáticas, havíamos referido num artigo anterior que “as novas gerações vão viver no mundo que ajudarmos a criar e, por muitas diferenças que haja entre as pessoas, as culturas e os países, o planeta terra é a Casa de todos nós, sendo fundamental ajudar a preservá-lo!”. Acrescentaria agora que isto é importante em relação ao ambiente, à natureza e à preservação das espécies, mas devemos começar desde logo pela espécie humana, pelas atitudes em relação aos outros que, como nós, querem tentar ser felizes neste planeta em que vivemos!