As Identidades Assassinas, de Amin Maalouf, com tradução de Helder Guégués, é um ensaio publicado em março deste ano, que infelizmente se torna uma leitura premente e atual, uma vez que a História insiste em repetir os erros do passado. A obra do autor, jornalista e romancista libanês, tem vindo a ser publicada pela Marcador.
Como acontece muitas vezes com os protagonistas dos seus romances históricos, Amin Maalouf fala-nos aqui na primeira pessoa, a partir da sua condição de homem situado entre o Oriente e o Ocidente. A pergunta que serve de mote para a introdução a este ensaio é uma questão que lhe é várias vezes dirigida: se ele se sente mais libanês ou mais francês. O autor responde invariavelmente que é “as duas”.
«O que me torna eu mesmo e não outra pessoa é que estou na estrema de dois países, duas ou três línguas, várias tradições culturais. É precisamente isso que define a minha identidade. Seria eu mais autêntico se amputasse uma parte de mim mesmo?» (p. 11)
O autor tenta, a partir do seu caso, demonstrar como todos nós mesmos somos identidades compósitas constituídas por um número variado de elementos. Seja a nacionalidade, a religião, um grupo étnico ou uma língua, até mesmo um clube de futebol ou um clã, o nosso sentimento de pertença. Por isso, definir a nossa identidade com um simples “sou árabe” ou “sou cristão” é tão redutor quanto inexacto, até porque se pode ser ambas. Também por isto, o autor alerta: “é o nosso olhar que muitas vezes fecha os outros nas suas estreitas pertenças, e é também o nosso olhar que os pode libertar” (p. 28)
Em frases tão liricamente lapidares quanto cortantes, o autor deixa-nos uma série de reflexões, que vão da migração à globalização, de um novo conceito de identidade que advém da evolução, do desejo da modernização ocidental mascarado de “universalidade” aos perigos da “uniformidade”, das releituras do texto religioso ao longo do tempo que ganham significados inéditos e extrapolados à necessidade de separação do religioso e do identitário.
Sem procurar desculpas, o autor desvela ainda como é fácil ao movimento islamita encontrar facilmente adesão junto de jovens desfavorecidos em luta contra a corrupção, a desigualdade, a arbitrariedade do Estado, a falta de horizontes… Pois é através do sentimento de pertença a uma causa que encontram algum sentido.
Amin Maalouf, jornalista e romancista libanês, venceu o Prix Maisons de la Presse, o prémio Goncourt, o prémio Príncipe das Astúrias e o Prémio Calouste Gulbenkian.
É membro da Academia Francesa desde 2011. Foi chefe de redação, e mais tarde editor do Jeune Afrique. Durante 12 anos foi repórter, tendo realizado missões em mais de 60 países.
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