A Rebelião, de Joseph Roth, com tradução do alemão por Paulo Osório de Castro, foi recentemente publicado pela Cavalo de Ferro (em livro físico e em ebook).
De entre os 156 doentes nos barracões do Hospital de Guerra Número XXIV destacar-se-á Andreas Pum (por um golpe de sorte, ao tremer no momento certo). Homem simples, de cerca de 45 anos, devoto de Deus e da pátria, veterano condecorado da Primeira Guerra Mundial que, tendo perdido uma perna em combate, obtém do Estado uma licença especial para tocar realejo e pedir esmola na rua. Essa licença confere-lhe uma honra e uma dignidade que o distinguem de outros falsários que alastram pelas ruas, e que entram na categoria daqueles a quem ele chama «pagãos».
Apesar da sua pobreza e da sua invalidez, e de nunca lhe terem conseguido a prótese prometida, Andreas possui uma crença inabalável em Deus, na justiça, no governo, na ordem moral do mundo: «As coisas, no mundo, estão montadas de maneira que cada um só possa desfrutar daquilo que pode pagar.» Andreas Pum é também um optimista fantasioso, talvez por ser «um autêntico músico», ainda que não faça mais do que tocar as músicas do seu realejo, uma caixa de música com a forma de um cubo que contém oito cilindros, capazes de tocar oito melodias entre as quais o hino nacional. E a sua bondade, proporcional à crença na possibilidade de um futuro generoso, tornam possível concretizar a sua fantasia de conseguir o amor de uma viúva.
No entanto, certo dia, «o mundo mostrou não ser tão simples como ele, na sua candura devota, o tinha visto». Por um conjunto de circunstâncias alheias, que espoletam um momento de fúria cega em Andreas (capaz de angustiar o leitor mais empedernido), este pobre aleijado deita por terra num ápice o futuro risonho que se delineava no horizonte. E um momento de rebelião contra o sistema é o suficiente para destruir um homem: «Já as grandes rodas rolantes do Estado tinham metido o cidadão Andreas Pum na sua engrenagem e, sem que ele o soubesse ainda, estava sendo lenta e minuciosamente triturado.»
Romance publicado originalmente em 1924, A Rebelião é o retrato cru de uma sociedade austríaca humilhada e fracturada.
Joseph Roth, escritor austríaco de origem judaica, nasceu em 1894 na cidade de Brody (actual Ucrânia). Estudou Filosofia e Literatura Alemã na Universidade de Viena. Em 1916, alista-se como voluntário na Primeira Guerra Mundial e torna-se prisioneiro do exército russo, experiência que o marca profundamente. O final da sua vida será marcado pela tragédia, morrendo exilado em Paris nas vésperas de uma nova guerra mundial, consumido pelo alcoolismo.