A dupla cobertura em saúde: sintoma de um sistema sob pressão
A discussão sobre o futuro do sistema de saúde português tem vindo a ganhar intensidade, com sinais claros de que o modelo atual já não responde plenamente às necessidades da população. Entre esses sinais destaca-se a crescente dupla cobertura em saúde — a combinação voluntária entre o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e seguros ou subsistemas privados — que se tornou uma opção cada vez mais comum.
Esta tendência reflete a procura por alternativas ao SNS, motivada por fatores como tempos de espera, maior personalização do atendimento e acesso mais rápido a especialidades. Os dados mostram que a percentagem de portugueses que utilizam simultaneamente o SNS e uma cobertura privada passou de 26% em 2015 para 35% em 2023, evidenciando a insatisfação de parte da população com o desempenho do serviço público.
A expansão da dupla cobertura levanta questões relevantes sobre equidade. Para quem a tem, garante resposta rápida e diversificada, mas implica também duplo pagamento: impostos para financiar o SNS e despesas próprias com seguros. Para outros, sem capacidade financeira, o acesso aos cuidados continua dependente exclusivamente do SNS, aprofundando desigualdades no sistema.
Não surpreende, por isso, que Portugal seja hoje o 3.º país da OCDE na Europa onde a despesa privada em saúde representa maior peso na despesa total (38%), através de seguros voluntários ou pagamentos diretos.
Em suma, a dupla cobertura revela as tensões do sistema de saúde português: um SNS universal sob pressão e um setor privado em crescimento. Com a população a recorrer a soluções híbridas para garantir proteção, torna-se urgente repensar o equilíbrio entre setores, reforçar a sustentabilidade do SNS e garantir que o acesso à saúde não depende da capacidade financeira de cada um.
- Os factos vistos à lupa por André Pinção Lucas e Juliano Ventura – Uma parceria do POSTAL com o Instituto +Liberdade

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