Ken MacKenzie, reformado britânico com 64 anos, descreve a sua nova vida em Portugal com uma frase que tem despertado curiosidade no Reino Unido: “é como viver num hotel de cinco estrelas”. Reformou‑se, trocou Londres pela costa oeste portuguesa e, segundo o site espanhol Noticias Trabajo, passou por um processo exigente até transformar o antigo destino de férias da família na casa onde pretende envelhecer. A mudança, garante, valeu cada obstáculo ultrapassado.
Do sonho de férias ao plano de vida
De acordo com o Noticias Trabajo, o reformado britânico passava temporadas longas numa casa de férias em Praia d’El Rey, perto de Óbidos, e foi aí que percebeu que queria trocar a rotina britânica por uma vida mais tranquila junto ao mar. A esposa, Diane, já tinha adquirido um terreno na costa oeste em 2007 e, apesar de a crise financeira ter atrasado os planos, em 2011 o casal conseguiu concluir a construção de uma moradia com vários quartos, piscina e vista para o Atlântico.
Segundo a mesma fonte, a família dividiu‑se durante anos entre Portugal e Londres: Ken voava no início da semana para trabalhar como sócio numa empresa de contabilidade e regressava no fim da semana, juntando‑se à família nas férias escolares. Ainda assim, o plano estava traçado: um dia, mudariam definitivamente.
Esse momento chegou em 2024, quando decidiram transformar a casa de férias na residência principal. “Mudar de país é como mudar de casa, mas muito mais drástico”, afirmou o reformado, citado pelo Noticias Trabajo. “E quando se junta a reforma à mudança, é preciso alterar a mentalidade e passar de poupar para usufruir. É um desafio.”
Como se reformou em Portugal
A publicação explica que Portugal continua a atrair milhares de britânicos pela combinação entre clima, segurança, custo de vida e qualidade de vida. Estimam‑se cerca de 50 mil residentes do Reino Unido a viver no país.
Para quem pretende seguir o mesmo caminho que este reformado britânico, uma via comum é o visto D7. Este visto destina‑se a quem dispõe de rendimentos estáveis, como pensões, rendas, juros ou outros rendimentos passivos e, na prática, exige valores mínimos que têm como referência o salário mínimo português: regra geral, um valor próximo de um salário mínimo para o titular, uma fração para o cônjuge e outra para cada dependente. Após a chegada, é emitida uma autorização de residência válida por dois anos, renovável por mais três. Ao fim de cinco anos, torna‑se possível pedir a residência permanente ou a nacionalidade.
O Noticias Trabajo recorda que o antigo regime fiscal para Residentes Não Habituais (RNH), que garantia impostos reduzidos sobre certas pensões estrangeiras, terminou para novos residentes em 2024, mantendo apenas um regime transitório para quem preencheu determinadas condições até ao final de 2023.
Em alternativa, foi criado o regime IFICI, direcionado a determinadas atividades ligadas à investigação científica e inovação, que já não replica as vantagens generalizadas sobre pensões que existiam no RNH. Ainda assim, Portugal mantém elementos fiscais atrativos, especialmente no que toca a sucessões, dado que cônjuges e descendentes diretos estão isentos de imposto do selo em heranças.
Graças ao acordo de dupla tributação entre Portugal e o Reino Unido, também não há risco de pagar imposto duas vezes pelos mesmos rendimentos, desde que respeitadas as regras de residência fiscal.
Saúde, burocracia e adaptação
A inscrição no Serviço Nacional de Saúde garante acesso a consultas e cuidados com copagamentos relativamente baixos para residentes legais. Segundo o Noticias Trabajo, muitos britânicos estranham inicialmente a burocracia: vistos, registos e fiscalidade exigem tempo e conhecimento técnico. Por isso, muitos recorrem a especialistas em migração e consultores fiscais, como recomendam várias agências citadas pela publicação.
Para Ken, um dos principais desafios foi adaptar‑se a uma nova rotina. Depois de décadas num ambiente financeiro competitivo, a reforma trouxe‑lhe outro ritmo: “Nado todos os dias, uso a sauna, jogo golfe, passeio o cão, ando de bicicleta e vou ao ginásio. A praia fica a cerca de 250 metros.”
O reformado admite que o idioma é uma barreira e que continua a depender de profissionais para lidar com burocracias e assuntos fiscais. Mas, no balanço, descreve Portugal como o local perfeito para esta etapa da vida: “é como viver num hotel de cinco estrelas”, resume.
Finanças, pensão e estabilidade
O casal vive da pensão privada de Ken, dos rendimentos do arrendamento da antiga casa em Tunbridge Wells e das suas poupanças. Dentro de alguns anos, receberão também a pensão estatal britânica completa. Portugal está na lista de países onde os pensionistas britânicos continuam a beneficiar do mecanismo de aumento anual das pensões do Reino Unido, o chamado triple lock.
O reformado britânico deixa ainda um conselho a quem pretende seguir o mesmo caminho: “há muita informação errada nas redes sociais; procurem fontes oficiais e ajuda profissional”.
E em Portugal?
Portugal tem vindo a receber cada vez mais pensionistas estrangeiros, mas a tendência não se limita ao Reino Unido. Reformados franceses, alemães e nórdicos também procuram o país pela segurança, clima ameno, sistema de saúde universal e custo de vida relativamente mais acessível do que nos seus países de origem.
Para portugueses que planeiam reformar‑se cá dentro, o país enfrenta outro desafio: o valor das pensões nacionais. De acordo com dados recentes da Segurança Social e comparações europeias, a pensão média de velhice em Portugal continua significativamente abaixo da média da União Europeia, o que faz com que a realidade descrita por Ken, “como viver num hotel de cinco estrelas”, seja, na prática, quase exclusiva de quem chega de fora com rendimentos mais elevados.
















