O caso de uma trabalhadora espanhola obrigada a reformar-se antes do tempo trouxe novamente para debate a temática das carreiras contributivas longas. Depois de quase meio século de descontos, acabou penalizada pela Segurança Social em quase 1/4 da sua pensão.
Uma carreira iniciada na adolescência
Lola Meño afirma que começou a trabalhar aos 14 anos numa tipografia, algo comum nas décadas de 60 e 70. A empresa onde trabalhava cresceu, mudou de cidade e acabou por entrar em insolvência. Aos 59 anos ficou desempregada e, sem conseguir regressar ao mercado de trabalho, viu-se obrigada a pedir a reforma antecipada aos 61, de acordo com o jornal digital espanhol Noticias Trabajo. Explica num vídeo: “Depois de ter descontado 47 anos e uns dias, vejo a minha pensão reduzida em 24 por cento.”
Penalizações que não distinguem carreiras muito longas
A lei espanhola aplica coeficientes redutores permanentes também a carreiras com mais de 40 anos, não prevendo uma isenção específica para quem tem trajetórias muito longas.
A associação ASJUBI40, da qual faz parte, denuncia que estas penalizações atingem sobretudo quem começou a trabalhar muito cedo e não tem alternativa senão reformar-se antes da idade normal. Lola resume esse sentimento dizendo: “É uma injustiça e estamos a lutar por dignidade e por justiça.”
O que diz a lei portuguesa
Em Portugal, a reforma antecipada está sobretudo regulada pelo Decreto-Lei n.º 187/2007, que exige, na modalidade de flexibilização da idade, 60 anos de idade e 40 anos de descontos. Quando estes critérios são cumpridos, aplicam-se duas penalizações permanentes previstas no mesmo diploma: o corte de 0,5% por cada mês de antecipação e o fator de sustentabilidade, associado à esperança média de vida.
Existe também o regime de carreiras contributivas muito longas, previsto no artigo 21.º-A, na sequência do Decreto-Lei n.º 126-B/2017. Só escapa a penalizações quem tiver 60 anos e 48 anos de descontos, ou 60 anos e 46 anos, desde que tenha começado a trabalhar antes dos 17 anos.
Carreiras contributivas muito longas
Existe também o regime de carreiras contributivas muito longas, previsto no artigo 21.º‑A do Decreto‑Lei n.º 187/2007, na sequência do Decreto‑Lei n.º 126‑B/2017 e de alterações posteriores. Neste regime, podem aceder à reforma antecipada sem penalizações os beneficiários que, à data do início da pensão, cumpram uma das seguintes condições:
- Terem pelo menos 60 anos de idade e 48 anos de descontos;
- Terem pelo menos 60 anos de idade e 46 anos de descontos, desde que tenham começado a descontar antes dos 17 anos.
Nestes casos, não se aplica nem o corte de 0,5% por mês de antecipação, nem o fator de sustentabilidade.
Se fosse em Portugal, o que poderia acontecer?
Se um percurso como o de Lola Meño tivesse ocorrido em Portugal, com início de trabalho aos 14 anos e 47 anos de carreira contributiva à data da reforma aos 61 anos, o enquadramento seria diferente do espanhol.
Em teoria, alguém com este perfil cumpriria os requisitos do regime de carreiras contributivas muito longas (60 ou mais anos de idade, pelo menos 46 anos de descontos e início de carreira antes dos 17 anos), podendo aceder à reforma antecipada sem cortes na pensão ao abrigo do artigo 21.º‑A.
Um debate que continua atual
O caso, de acordo com o Noticias Trabajo e com a ASJUBI40, mostra que trabalhadores que iniciaram a vida profissional muito cedo continuam vulneráveis sempre que perdem o emprego perto da idade da reforma e são empurrados para a reforma antecipada com cortes definitivos na pensão.
Apesar de Portugal ter introduzido proteção adicional para carreiras muito extensas, muitos trabalhadores com trajetórias irregulares ou interrupções longas ficam fora dos critérios das carreiras muito longas e acabam penalizados, mesmo depois de quase toda uma vida de contribuições.
















