Milhares de camas turísticas paralelas no Algarve ignoram a lei que obriga a registo [Idálio Revez | 24 de abril de 2009]
Turismo espera que o “simplex” do novo diploma sobre alojamento local ajude a sair da clandestinidade 200 mil a 300 mil camas. (…) num seminário sobre Alojamento Local (…), António Pina, presidente do Turismo do Algarve, por outro lado, calculou em 200 mil a 300 mil o número de camas turísticas ilegais ou paralelas que passam ao lado do controlo fiscal.
“Parece que o ‘simplex’ chegou ao alojamento local”, observou António Pina, sublinhando a ideia de que esta medida “vem contribuir para o aumento da qualidade do turismo”.
Este era o sentimento em 2009, num texto de Idálio Revez, que reflete a vontade de incluir na oferta turística muitas camas que existiam sem fiscalização, controlo e a qualidade mínima exigível. Hoje, é o próprio sector do turismo que critica aquilo que pode voltar a ser um desastre económico e social para o Algarve. O Expresso, num artigo de 20 de fevereiro de 2023 às 11:38, fazia eco de um comunicado da AHETA – Associação de Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve.
Hotéis do Algarve criticam vontade do Governo em “aniquilar” alojamento local: “Foi fácil encontrar um ‘papão’ para a falta de habitação”
As medidas para a habitação aprovadas no último Conselho de Ministros “são castradoras” da atividade de alojamento local “e anunciam a sua morte, a um prazo muito curto”.
“Foi mais fácil encontrar um “papão”, considerado responsável pela falta de habitação, no país, e assim lançar para o desemprego e falência milhares de pessoas. Foi mais apelativo atacar a propriedade privada”, sustenta a associação hoteleira do Algarve, que defende “a existência de segundas residências / imobiliária turística/alojamento local, devidamente controladas e licenciadas” e contribuindo, com os seus impostos, para o crescimento do país.
“Pensar que estas medidas, no que toca ao alojamento local, resolvem ou contribuem para resolver o problema do país, em matéria de habitação, é uma falácia”.
ALOJAMENTO LOCAL RESOLVEU O PROBLEMA DAS “CAMAS ILEGAIS”
Recuando “alguns anos e para relembrar os mais desatentos, entre os quais os nossos governantes”, a AHETA destaca “que um dos enormes problemas que afetavam, nessa altura, a imagem e a economia do Algarve eram as tão propagadas “camas paralelas””, falando-se então de cerca de 400 mil.
Com o advento do alojamento local, estas camas paralelas entraram no mercado legal, frisa a associação. “Gradualmente pessoas e empresas foram inscrevendo as suas casas e apartamentos, na câmara municipal” e passaram a fazer-se investimentos em aquisição de casas, recuperação de outras, até então abandonadas, com esta finalidade”, passando esta atividade a “estar legal e a pagar impostos”.
“No Algarve, acreditamos que há hoje mais camas inscritas em alojamento local que em todas as outras tipologias de alojamento classificado”.
Passaram cerca de 15 anos, sobre a publicação da legislação que enquadrada na figura do alojamento local [Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de março], a prestação de serviços de alojamento temporário em estabelecimentos que não reunissem os requisitos legalmente exigidos para se qualificarem como empreendimentos turísticos.
Podemos constatar que existem hoje no Algarve registados como Alojamento Local nas suas diferentes modalidades 42.434 unidades, com 87.511 quartos, com 153.074 camas, para acolher 221.113 utentes – as ditas camas ilegais do início dos anos 2000.
Já os Empreendimentos Turísticos, ou chamada hotelaria tradicional. Têm hoje registados 639 empreendimentos, onde existe disponível 45.912 quartos, com 127.066 camas / utentes.
Não é uma guerrilha de números. E muito menos medir forças entre dois tipos de oferta que são importantes na diferenciação e se complementam no todo. O Algarve oferece hoje 133.423 quartos, com uma capacidade de acomodação para 348.179 visitantes.
Alojamento Local representa quase dois terços da oferta turística no Algarve
A prestação de serviços no alojamento e a sua qualidade através das suas diversas tipologias de oferta. São fundamentais de uma construção mais larga do perfil do turista que visita e escolhe o Algarve para passar uns dias de lazer.
O Alojamento Local no Algarve, hoje com dados do Turismo de Portugal a 31 de março de 2023, nas suas 4 tipologias Apartamento, Moradia, Estabelecimento de Hospedagem e Quarto, representa 63,5% de toda a oferta turística no Algarve.
No passado dia 13 de março foi apresentado o estudo “Turismo Cultural no Algarve – Perfil do Turista e Perspetivas de Desenvolvimento” , realizado para a Região de Turismo do Algarve pela consultora Opium no âmbito do projeto “Algarve Premium”, com o objetivo de atualizar o conhecimento sobre este segmento turístico na região.
Daí destacam-se alguns hábitos dos turistas que nos visitam e que são transversais aos vários segmentos da oferta:
Relativamente aos hábitos turísticos no Algarve, observa-se uma distribuição das suas referências, essencialmente, pelas tipologias de alojamentos em hotel (27,8%), propriedade privada (23,7%) e Airbnb / quarto em casa privada / Bed & breakfast / Guest house (17,2%). Do lado oposto, as tipologias de alojamento de Agro-turismo / Turismo rural (2,2%) e o Hostel (2,7%) são as menos procuradas pelos turistas. De realçar, contudo, que a segunda residência representa 10,4%, a estadia com familiares e amigos (7,0%) e em Caravana/tenda (8,5%).
Analisando por mercado, é notória a preferência dos espanhóis (35,7%) e dos ingleses (35,1%) pela tipologia de alojamento em hotel; já os alemães (31,7%), os holandeses (31,1%) e os portugueses (26,6%) optaram por arrendar propriedades privadas. A tipologia de Airbnb / quarto em casa privada / Bed & breakfast / Guest house é preferida pelos franceses (28,6%) e pelos outros mercados (28%). A opção pela estadia com família e amigos, bem como pela segunda residência são modalidades de alojamento mais comuns entre os turistas nacionais, em cerca de 12,1% e 17,6, respetivamente.
Quando à permanência no destino, em média, os turistas permanecem cerca de dez noites no Algarve, o que se revela bastante acima da média no mês de agosto de 2022 divulgada no INE (4,54). Vale a pena sublinhar que o cálculo deste indicador pelo INE apenas considera os alojamentos turísticos registados, o que não se verifica no inquérito conduzido para este estudo, que inclui todas as modalidades de alojamento utilizadas pelos turistas, inclusive casas de familiares e amigos, caravanas/ tendas e propriedades privadas não registadas de alojamento. Esta situação justifica a discrepância elevada das duas fontes de dados para o mesmo período, neste indicador. Neste sentido, os dados recolhidos especificamente para este estudo induzem, provavelmente, um resultado mais próximo da realidade deste destino de férias.
Os turistas de visita ao Algarve gastam em média um total de 1.359€, durante o período de permanência na região, montante que traduz a receita média gerada por cada turista. As despesas são na sua maioria gastas no alojamento (57,0%) e ainda distribuídas pelos gastos de transporte com a viagem (36,5%), alimentação e compras (30,0%) e entretenimento/cultura (13,4%). Novamente, para o cálculo deste indicador, foram eliminados da amostra os dez casos mais discrepantes (outliers) – os dez mais elevados e os dez mais reduzidos –, para a obtenção de uma média de despesas mais representativa da realidade deste estudo.
O que cada um dos 16 Municípios do Algarve vai perder na sua oferta de alojamento turístico
Conhecendo a oferta e o perfil de quem nos visita. Podemos tentar avaliar o impacto que seria retirar do mercado ‘alguns’ apartamentos turísticos que estão no regime de Alojamento Local. E vou só concentrar-me na tipologia ‘apartamento’, que segundo a proposta do Governo é aquela que deve ser revista, isto é, as autorizações para exercer a atividade de AL e colocá-la no mercado de arrendamento.
Assim, por Município:
- Albufeira: 6942 registos, – 32%
- Alcoutim: 1 registo, – 1,7%
- Aljezur: 248, – 10,9%
- Castro Marim: 207, – 28,3%
- Faro: 426, – 21,9%
- Lagoa: 1748, – 25,3%
- Lagos: 3663, – 40,2%
- Loulé: 4183, – 34,5%
- Monchique: 8, – 1,5%
- Olhão: 720, – 28%
- Portimão: 5135, – 52%
- São Brás de Alportel: 6, – 2,9%
- Silves: 1503, – 41,1%
- Tavira: 1938, – 40,4%
- Vila do Bispo: 340, – 12,7%
- VR Santo António: 859, – 26,5%
Estas são as percentagens que cada um dos 16 Municípios do Algarve vai perder na sua oferta de alojamento turístico.
Já o Algarve na sua totalidade tem 27.927 apartamentos registados em AL. E ao serem retirados do mercado, haveria uma perda de -33,9%, (118.220) da capacidade da oferta total de alojamento turístico na principal região turística de Portugal.
Sendo o Alojamento Local um ecossistema de proximidade e assenta num relacionamento interpessoal – de pessoas, para pessoas. Não é uma atividade dominada por grandes grupos ou por fundos imobiliários. Na sua grande maioria são famílias que reabilitaram o património familiar (como é o meu caso), e/ou fazemos a gestão diretamente ou partilhamos com alguém mais profissional e com mais disponibilidade para dar um serviço de qualidade superior.
“Os anfitriões contribuem para que os hóspedes descubram a região onde estão alojados: 82% dos anfitriões recomendam de serviços perto do seu alojamento, 70% recomendam aos hóspedes que visitem locais menos conhecidos e, em consequência, cerca de metade das despesas totais dos hóspedes (excluindo o alojamento) correspondem a serviços nas proximidades dos seus alojamentos”.
Os clientes dos AL’s vão almoçar ou jantar aos restaurantes de proximidade na própria rua, ou ao virar da esquina, vão ao mercado da fruta, do peixe e da carne, compram no comércio local, consomem cultura local, e é por isso a oferta do AL diferenciador pela sua genuinidade, tem um alto valor acrescentado pela oferta e pelo impacto na economia local. É a arte de saber bem receber com um sorriso personalizado e com rosto.
De acordo com o mais recente estudo realizado pela Universidade do Algarve sobre o perfil do turista que visita a região (2016), 98% dos turistas estão satisfeitos com o Algarve.
Os turistas residenciais permanecem, em média, 12,6 dias na região, sendo que a grande maioria já conhecia o Algarve (87%). Para além da casa própria, utilizam também o arrendamento privado (47%) que é reservado maioritariamente online (61%), no Booking.com (23%) ou no AirBnb (28%), sugerindo que cada vez mais o alojamento local ganha consistência e quota de mercado.
Os turistas gastam em média por dia 136 euros, valor este que se traduz numa receita média por turista de 1400 euros, montante que simboliza a receita média que cada turista gera.
Estes números têm por base os dados indicados no estudo sobre “O PERFIL DO TURISTA QUE VISITA O ALGARVE”, Universidade do Algarve, com a coordenação da Professora Antónia Correia e do Professor Paulo Águas.
O Travel BI by Turismo de Portugal diz-nos que o valor da taxa de ocupação acumulado no ano de 2022, no Algarve foi 54,6%, por cama/utente.
Se considerarmos a oferta disponível na modalidade de apartamento em AL é de 118.220/dia multiplicando pelos 365 dias/ano, teremos – 43.150.300 de dormidas no ano de 2022.
Aplicando o percentual médio de 54,6%, concluímos que os apartamentos registados no regime de Alojamento Local venderam 23.560.064 de noites durante 2022.
Segundo o estudo sobre “O PERFIL DO TURISTA QUE VISITA O ALGARVE”, feito pela Universidade do Algarve para a Região de Turismo, o valor indicativo que os turistas gastam em média por dia é de 136 euros.
Apuramos que, se aplicarmos o gasto médio de 136€/dia, às 23.560.064 noites ocupadas, permitiu uma receita superior a três mil e duzentos milhões de euros (3.204.168.404€).
Nos termos do Projeto de Proposta de Lei n.º PL 64/XXIII/2023, de 03 de março de 2023, também conhecido por Pacote “Mais Habitação”, prevê em relação ao:
ALOJAMENTO LOCAL
As principais propostas de alterações com impacto no regime do AL são as seguintes:
- suspensão da emissão de novos registos de estabelecimento de AL, exceto em zonas para alojamento rural;
- suspensão de novos registos de AL até 31 de dezembro de 2030;
- caducidade dos registos de AL emitidos à eventual data de entrada em vigor da nova lei a 31 de dezembro de 2030;
- caso a atividade de AL seja exercida numa fração autónoma de edifício ou parte de prédio urbano suscetível de utilização independente, a assembleia de condóminos, por deliberação de mais de metade da permilagem do edifício, poder opor-se ao exercício da atividade de alojamento local na referida fração;
- atribuição de competências de fiscalização à ASAE, à câmara municipal e à junta de freguesia territorialmente competentes;
- relativamente à duração do registo de estabelecimento de AL, a duração de 5 (cinco) anos, contados a partir da data da comunicação prévia com prazo prevista no artigo anterior, carecendo a renovação do registo de autorização expressa da câmara municipal territorialmente competente.
É, também, proposto um incentivo fiscal, consubstanciado numa isenção de IRS ou IRS, aos correspondentes rendimentos prediais e aplicável aos proprietários que transfiram os seus imóveis do Alojamento Local para o Arrendamento Habitacional.
Podemos concluir que o desastre económico/social no Algarve será brutal
Retirar do mercado o que levou anos a conseguir, ou seja ‘algumas’ das camas paralelas e somente aquelas que se encontram na tipologia de apartamento em Alojamento Local. Representa tirar do mercado do alojamento 34%, 1/3 das camas disponíveis.
E como foi demonstrado atrás, trata-se de um impacto negativo de 3.204.168.404€ da economia regional por ano.
Por ironia, este é o valor que foi colocado na TAP através na privatização feita por este mesmo Governo.
Talvez valesse a pena pensar nisto…!
1cf. Milhares de camas turísticas paralelas no Algarve ignoram a lei que obriga a registo | LOCAL LISBOA | PÚBLICO (publico.pt)
2cf. Fonte ao dia 31.03.2023 https://rnt.turismodeportugal.pt/RNT/_default.aspx
3cf. Fonte https://cms.visitalgarve.pt//upload_files/client_id_1/website_id_3/Biblioteca/2023/OPIUM-ALGARVE-11.pdf pag’s 76 – 94
4cf.https://cms.visitalgarve.pt//upload_files/client_id_1/website_id_3/Biblioteca/Perfil%20do%20Turista%202016_RELATORIO%20FINAL.pdf
5cf. https://travelbi.turismodeportugal.pt/
Curiosidades de uma Lisboa entre 01.08.2007 a 06.04.2015
• Com 1556 registos de Alojamento Local, com 4560 quartos e 7867 camas, uma capacidade para 11512 utentes.
• Na tipologia de apartamento 1352 registos, 2623 quartos, 4484 camas e uma disponibilidade para 6481 utentes.
• Nos estabelecimentos de hospedagem 196 registos, com 1917 quartos, 3353 camas, uma capacidade de 4984 utentes.
• Nas moradias são 8 registos, com 20 quartos, 30 camas e disponibilidade para 47 utentes.
E perguntam vocês, qual o relacionamento desta informação e neste período temporal com o Algarve? Nenhum!
Simplesmente, o período em que o Dr. António Costa foi presidente da Câmara de Lisboa e tinha outra opinião sobre o AL e a sua capacidade de reabilitar os centros históricos e criar riqueza na economia local.