No balanço conhecido em fevereiro, depois da aprovação do Programa Mais Habitação, no qual consta a adoção de um regime de arrendamento compulsivo das casas devolutas, o Ministério da Habitação informou ter identificado mais de quatro mil imóveis devolutos com aptidão habitacional. Um deles é o antigo Hospital Miguel Bombarda, em Lisboa, onde, de acordo com a Carta Municipal de Habitação recentemente apresentada pela autarquia, existem 47.748 habitações vagas, das quais 1.756 são municipais.
No final de 2022, existiam em Lisboa, pertencentes a proprietários privados, 1.063 imóveis totalmente devolutos e 1.583 parcialmente devolutos, o que, considerando o universo de 55.000 edifícios sob gestão particular, corresponde a percentagens de 1,93% e 2,87% do total do edificado, respetivamente.
Questionada pela Lusa, a Câmara Municipal de Lisboa disse que está a analisar um Pedido de Informação Prévia (PIP) sobre o Hospital Miguel Bombarda, para “aferir a viabilidade de uma intervenção que inclui habitação, comércio, serviços e equipamentos, como uma escola básica”.
A “complexidade da intervenção” obriga ao envolvimento de vários departamentos municipais, realçou a autarquia, adiantando que houve, “nas últimas semanas, várias reuniões e visitas de trabalho ao local”, para iniciar, “brevemente”, um estudo estrutural e patrimonial dos edifícios do antigo hospital.
O estudo – que avaliará o estado de conservação e a situação estrutural do imóvel – “será essencial para tomar decisões sobre cedências patrimoniais e ponderar as demolições necessárias”, adiantou.
Outra lista, divulgada há um ano por um despacho do Tesouro e da Administração Local datado de 17 de março, dá conta de 717 itens patrimoniais do Estado “em inatividade, devolutos ou abandonados”, com predomínio de casas de guardas florestais e magistrados, mas incluindo também antigas escolas e residências de estudantes, alguns prédios urbanos, lojas, armazéns e garagens, e lotes de terrenos para construção.
Conforme explicou o Ministério das Finanças à Lusa, na referida lista estão imóveis do Estado central cuja gestão pode ser descentralizada para as autarquias.
O caso de Portimão
É o caso, por exemplo, de quatro apartamentos, três lojas, um bloco administrativo de uma escola e um terreno com uma área de 29.000 metros quadrados em Portimão, na tutela da Direção Regional de Agricultura e Pescas do Algarve.
Fonte da autarquia referiu que “foi já requerida a cedência dos apartamentos e do terreno”, aguardando-se “resposta das entidades que tutelam os imóveis”.
A Câmara de Portimão pretende utilizar os apartamentos para “responder a situações de carência de alojamento para professores, médicos e outros casos” e o terreno para construir habitação social.
Segundo o diretor regional de Agricultura do Algarve, Pedro Monteiro, os serviços da delegação regional que ocupavam o terreno foram desativados há cinco anos, tendo o imóvel sido entregue em 2018 à Direção-Geral do Tesouro e Finanças.
Os 717 imóveis mencionados no despacho têm “aptidão para uso habitacional”, indicou o gabinete do ministro Fernando Medina, adiantando que a próxima atualização da lista deverá ser publicada “em meados deste ano”.
O despacho prevê a atualização semestral “sempre que tal se justifique”, o que não aconteceu ainda.
Na resposta à Lusa, o Ministério das Finanças lembra que o inventário mais geral do património imobiliário do Estado com aptidão habitacional é da competência do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU).
Questionado pela Lusa, o Ministério da Habitação, liderado por Marina Gonçalves, não respondeu às perguntas sobre os planos e prazos de reconversão dos imóveis devolutos do Estado.
Ministério da Habitação não responde
No património do Estado devoluto estão também imóveis militares, que têm sido identificados, com as respetivas fotografias, por grupos nas redes sociais, como o #devolutosdoestado.
Questionado pela Lusa, o Ministério da Defesa Nacional respondeu que são “cerca de 180” os imóveis “disponibilizados pela Defesa para outros fins que não os operacionais”, assinalando que entre eles estão “antigos quartéis ou hospitais, que não correspondem a tipologia habitacional”. Segundo o gabinete de Helena Carreiras, esses 180 imóveis, listados num despacho de 2019, obedecem a uma “dupla finalidade: disponibilizar património sem uso operacional pelas Forças Armadas e, através dessas operações de rentabilização, reinvestir no edificado/infraestruturas com funções operacionais”. A Defesa adiantou que “está em curso, em conjunto com as Forças Armadas, um trabalho de levantamento dos imóveis que poderão vir a ser disponibilizados para rentabilização”.
O gabinete da ministra informou ainda que, em cooperação com o IHRU e com as autarquias, já disponibilizou “oito imóveis que darão lugar a mais de 1.000 fogos para arrendamento a preços acessíveis” e que tem cedido imóveis para universidades e unidades de saúde. A título de exemplo, a Câmara Municipal da Figueira da Foz (distrito de Coimbra) pretende adquirir dois edifícios devolutos na cidade, com 24 fogos no total, que pertencem ao Ministério da Defesa Nacional, para os transformar em residências universitárias ou habitação a custos acessíveis.
Os dois edifícios foram retirados do Fundo Nacional de Reabilitação do Edificado em 2019, para serem destinados ao arrendamento acessível, mas as obras nunca avançaram.
No Porto – onde, segundo dados recentes, existem 1.788 imóveis com indícios de situação devoluta, correspondentes a 2.273 proprietários –, o antigo edifício da Direção de Recrutamento Militar, abandonado há vários anos, foi um dos oito imóveis que, em dezembro de 2021, passaram da Defesa para o IHRU.