numa perspetiva de democratização da cultura, de permitir o acesso de todos às manifestações culturais. Assim, a arte tem “saído” dos museus e galerias, vindo para a rua, para junto das pessoas.
Por definição, a arte urbana diz respeito a manifestações artísticas realizadas no espaço público, coletivo ou urbano, permitindo uma aproximação da arte às pessoas, e distinguindo-se das manifestações de caráter institucional ou do mero vandalismo.
A arte urbana tem vindo a tornar-se cada vez mais popular, havendo até algum aproveitamento turístico nalgumas cidades europeias, contribuindo para a animação e embelezamento das mesmas. Em Portugal este fenómeno também tem ocorrido nalgumas cidades, em particular em Loures. Tendo sido realizada em 2016 a primeira edição do “Loures Arte Pública”, com a participação de cerca de 100 artistas portugueses e estrangeiros, esta cidade tem vindo a afirmar-se como uma referência nacional e internacional em termos de arte urbana. Tendo começado na Quinta do Mocho, uma zona da cidade ainda há poucos anos marginalizada, as manifestações artísticas propagaram-se a todo o concelho, considerando-se atualmente Loures como uma galeria de arte a céu aberto, constituindo motivo de orgulho para os quase 3000 residentes, com visitas guiadas para os visitantes, mostrando que a arte pode ser fator de desenvolvimento e inclusão social.
Em artigos anteriores temos feito referência a trabalhos de vários artistas que desenvolvem arte urbana, nomeadamente Bansky, JR, Bordalo II e Vhils, estes dois últimos portugueses que se têm destacado com várias produções artísticas no exterior.
Sendo a arte uma expressão da sociedade, as manifestações de arte urbana abordam temas geralmente relativos a questões sociais, como a discriminação racial, os direitos das crianças, a paz, a natureza, a multiculturalidade e a igualdade.
Nesta forma de expressão artística, talvez Bansky seja o artista cujas obras são mais conhecidas a nível internacional. As mensagens visuais que produz abordam questões da atualidade, sobretudo de crítica política e social, com um forte viés revolucionário e anti guerra, mensagens bem necessárias neste período conturbado da história da humanidade, em que corremos o risco de ser iniciada uma 3ª Guerra Mundial.
Em 2019, antes da “guerra” contra a Covid-19, várias cidades do mundo, incluindo Lisboa, receberam a exposição “Bansky: Genius or Vandal”, em que foram apresentados mais de 70 trabalhos de Bansky cedidos por vários colecionadores privados internacionais. Desta forma, conseguimos ter acesso a um conjunto de obras de Bansky reunidas num mesmo espaço.
Este é um fenómeno curioso pois, no passado, o acesso à produção artística em artes visuais obrigava a que as pessoas fossem a museus ou galerias de arte. A arte urbana contribuiu para inverter esta situação, aproximando a arte das pessoas. Paradoxalmente, torna-se agora também possível apreciar a “arte de rua” em espaços fechados, organizados para o efeito.
É o que acontece no Museu “STRAAT – The Museum for graffiti and street art”, o maior e melhor museu de arte de rua do mundo. Localizado no cais NDSM, em Amsterdão, este museu único, com imensa luz natural, apresenta obras de arte de rua do tamanho de uma parede.
Este Museu convida os artistas para irem pintar no STRAAT, tendo total liberdade para realizarem a obra que entendam, sendo-lhes paga a viagem, a estadia e os materiais necessários. Os trabalhos são realizados no próprio Museu, enquanto os visitantes passeiam dentro do Museu, observando as telas gigantes, verdadeiros murais com cerca de 5 x 10 metros.
Os artistas garantem os direitos de autor pelas obras que realizam, sendo as obras cedidas temporariamente ao STRAAT.
Assim, a exposição nunca é igual, pois as obras que um visitante pode ver a serem realizadas numa semana, estarão em exposição na semana seguinte. Também podem ser encontradas telas em branco, preparadas para alguns artistas que estão para chegar.
Desta forma, o STRAAT consegue juntar obras de cerca de 150 artistas, procurando ter ainda um papel educativo sobre a história e a terminologia da arte de rua, apresentando uma sistematização da informação, intitulada “From the streets to Straat. Six decades of graffiti and street art worldwide” (“Das ruas para Straat. Seis décadas de grafite e arte de rua em todo o mundo”), num espaço do Museu preparado para o efeito.
Quando visitámos este Museu, em maio passado, pudemos encontrar exposta a obra duma artista portuguesa, Wasted Rita, e tomámos conhecimento de que o STAAT tinha sido nomeado para o prêmio de Melhor Museu da Holanda de 2022.
Independentemente de ser ou não o vencedor, vale mesmo a pena visitar este Museu de arte de rua!
* Professor Catedrático da Universidade do Algarve;
Pós-doutorado em Artes Visuais;
http://saul2017.wixsite.com/artes