ÉTICA E POLÍTICA
Sendo o ser humano a obra imperfeita de Deus, o gene corruptivo está lá desde o momento da criação, do início dos tempos que outros tempos a seguir virão. A corrupção, tal como hoje a percebemos, o tirar vantagem indevida de um lugar na sociedade por métodos fraudulentos, violentos em certa medida, por meio de extorsão, chantagem, mercantilagem, troca de favores, sempre existiu, dificilmente deixará de existir, seja no meio social, comercial, político, militar ou religioso. Está no sangue, corre pelas veias do poder, qualquer poder, grande ou poderzinho. São células que se reproduzem imortalmente, entre a ganância de ter mais e mais e mais, e o desespero de fugir da pobreza. Claro que há princípios, há regras, há códigos e leis, e existe a Ética e a Moral, antibióticos que se administram para controlar o vírus, tipo vacina que funciona em mais ou menos indivíduos, mas nunca em todos.
Há povos, Nações, Estados e países que controlam a doença de forma mais ou menos eficaz, nunca a cem por cento. Ela está lá, tem altos e baixos, estados febris, mas torna-se mais notada quando atinge pessoas com notoriedade, heróis com pés de barro na política, no desporto, nos negócios. E também é larvar, rasteira, comezinha, caminha entre o cidadão comum e anónimo desde a porta de uma discoteca à triagem da burocracia das repartições públicas, desde o economato de um hotel à cantina de um quartel. Ela prolifera em toda a água.
Ninguém vai para a política de forma forçada. Ao fazê-lo, existem incómodos e exposições dolorosas da vida privada, e deve aceitá-las
Raramente um corrupto assume os actos que pratica. Existe um sentimento de legitimidade autodesculpabilizante. A injustiça maior da corrupção é o efeito de contágio em pessoas inocentes, a generalização. Cada vez que um corrupto é apanhado em flagrante, a suspeição cai sobre gente que não o merece, que está ali ao lado, no mesmo grupo ou profissão, mas para quem honestidade e probidade são valores de uma vida inteira. São as vítimas colaterais de uma guerra tão suja, quanto necessária. Em Portugal, os interesses instalados sempre neutralizaram o efeito prático de um mecanismo de combate à corrupção a sério. Temos um sistema judicial híper protector do direito ao recurso de quem tem dinheiro para pagar a advogados durante anos, durante décadas, até à prescrição ou sentença de efeito nulo. Por isso chegámos onde chegámos. À pandemia de casos envolvendo políticos, à inusitada avalanche de demissões de governantes, de incompatibilidades envolvendo parlamentares, de prisão e condenação de autarcas por prevaricações sortidas.
Existe uma onda de indignação e desaprovação que varre a sociedade, até por parte de quem não tem moral para levantar o dedo acusatório. Há um lugar cativo nas primeiras páginas da imprensa, nas notícias de partir o caco (agora diz-se “breaking news”) dos telejornais. Sim, a democracia está em crise, sempre esteve, mas as ditaduras nunca foram modelos de virtude. Ao menos que se fale, que se leia, que se discuta com liberdade. Ninguém vai para a política de forma forçada. Ao fazê-lo, existem incómodos e exposições dolorosas da vida privada, e deve aceitá-las. Implica renúncias, à carreira profissional, ao descanso, à família, ao rendimento até.
O grau de escrutínio público sobre quem exerce cargos políticos ou de alta responsabilidade no Estado é hoje muito maior do que era há vinte anos. É difícil de perceber por que razão um ministro ou um presidente de Câmara Municipal têm de exercer o seu mandato em dedicação exclusiva, e um deputado pode acumular actividades públicas e privadas, sujeito a ser apanhado na malha do conflito de interesses. A revista Sábado publicou uma lista com os políticos mais ricos de Portugal, entre património e rendimentos declarados. Há lá gente do Algarve. O que é que isso prova? Nada! Tão importante como saber o que têm, é a forma como o obtiveram. Mas aí, a casa das leis, sempre se recusou a legislar sobre o enriquecimento ilícito. Para que se possa separar o trigo do joio. Quem não deve não teme, não é verdade?
TAXAS E TAXINHAS CHEGAM AO TURISMO ALGARVIO
Em 2021, apenas seis milhões num total de 14,5 milhões de hóspedes registados pelo turismo português eram estrangeiros. Ou seja, 59% das pessoas que pernoitaram nos alojamentos em Portugal, o chamado Turismo Interno, já são contribuintes encartados e escaldados pelo Fisco nativo. A introdução da agora tão falada Taxa Turística por cada noitada fora de casa, vem acrescentar-se à longa lista de 4.300 taxas e taxinhas que povoam o pesadelo fiscal dos portugueses. Curiosa Taxa, aliás, que serve dois propósitos de sentidos opostos. Há países que estão a introduzi-la para impedir a chegada massiva de turistas, o Sobreturismo, e há outros que olham para ela como mais uma forma de engordar os orçamentos públicos locais. E há também quem a não tenha.
Cá pelo Algarve, afadiga-se a AMAL a discutir a sua introdução, qual o seu destino, e a repartição do bodo. Parece que as autarquias querem a parte de leão (90%). Os restantes 10% iriam para um fundo regional para a promoção (ligações aéreas em época baixa) e animação (grandes eventos internacionais). Parecem sensatos os propósitos do sector turístico. Parece miserável a fatia financeira. Numa expectativa global de arrecadar 41 milhões de euros, 10% são 4 milhões. Dá para fazer o quê? Que grandes eventos internacionais podem atrair-se com esse orçamento? Já agora, uma sugestão.
A receita que vai para as autarquias deveria ter uma parte consignada à protecção e regeneração das áreas naturais (terra ardida não faz grande cartaz turístico…). É verdade, como dizem vozes de Silves, que se trata de mais um imposto em forma de taxa. Então, façam lá a maldade mas com bom fim.
* O autor não escreve segundo o acordo ortográfico