Antevisão de um mundo novo, com aceleração fulminante para uma nova ordem social, em que os supercomputadores serão cada vez mais potentes, em que a inteligência artificial estará em todo o lado, em que todas as profissões estarão dependentes do uso de sistemas inteligentes e a robótica, cada vez mais funcional, equipará boa parte das nossas indústrias e serviços. Inovação e flexibilidade impõem-se nas relações de produção.
Neste tempo de revolução tecnológica, o que nos deve fazer refletir é a guerra de colossos que temos vindo a assistir entre oligarcas, empresas e grandes potências mundiais, não apenas pela conquista de mercados, mas, acima de tudo, na construção de uma nova estrutura de poder. Concentração e multipolarização impõem-se nas relações de poder.
Sabíamos que as oligarquias tomaram o mundo. Sabíamos que as autocracias cresciam em cumplicidade com as oligarquias. Sabíamos que as oligarquias cresciam com o beneplácito dos poderes políticos democráticos e que os super-ricos eram “apaparicados” pelas lideranças políticas. Ninguém queria saber de onde vinha o dinheiro. Nada se fazia para conter a concentração de poder nos mercados. Na nova economia em rede, o poder monopolista foge a qualquer tentativa de regulação. Aplicam-se multas risíveis face às fortunas acumuladas pelas tecnológicas. O sistema político capitula, as oligarquias ganham influência.
Olhando para esse “farol democrático” que são os EUA, em poucas semanas, sabemos como é que os oligarcas dominam o poder e as instituições políticas podem ser transformadas em meras agências de negócios. Desmantelam-se as administrações públicas de forma despudorada. Rompe-se com a confidencialidade da informação financeira dos cidadãos. Fazem-se purgas no sistema de justiça. Pratica-se descaradamente a censura nos órgãos de informação, também eles tomados por oligarcas. Revogam-se os instrumentos de regulação e controlo. Abandonam-se bruscamente as organizações multilaterais. Desvirtuam-se as alianças geopolíticas. Fecham-se agências de ajuda humanitária. Pressionam-se as vozes dissonantes a nível global. Impõe-se a paz pela força, o que quer que isso queira dizer – cedências a agressores, troca de armas por “terras raras”, ameaça de deportação de populações inteiras…
Não restam dúvidas. Todos os atropelos são possíveis. O poder da política soçobra face aos poderes da oligarquia. É preciso continuar a crescer e, por todo o lado, se impõe a narrativa da desregulamentação dos mercados para promover a inovação, gerar investimento catalisador e promover mega-parcerias estratégicas. Aumentam-se as fronteiras físicas, derrubam-se as barreiras imateriais. O clique é, agora, o poder individual. A claque, a mola do poder político. As redes sociais, o espaço privilegiado do novo “império”.
Vivemos tempos desconcertantes e de perigos iminentes. As mudanças fazem-se com a ação coletiva consciente. Se é verdade que nesta nova Era digital o poder está mais concentrado, também é verdade que ele provoca mais movimentos difusos. E a indiferença tem limites. Acreditemos que a democracia tem a força para vencer a descrença e restaurar a credibilidade das instituições. Para que este não seja, mesmo, um ponto sem retorno.
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