Realizou-se no Auditório Municipal de Olhão, na passada segunda-feira, um seminário dedicado a Boris Skossyreff, o homem que em 1934 tentou tornar-se rei de Andorra, acabando por ser deportado para Portugal em 1935, onde ficou conhecido como “mano-rei” em Olhão.
O momento alto do evento foi a exibição de um documentário que retrata a vida extraordinária deste personagem, que atravessou os principais acontecimentos da Europa no século XX: desde a Primeira Guerra Mundial e a Revolução Bolchevique, passando pela tentativa de golpe em Andorra, a passagem por campos de concentração na França de Vichy, a Segunda Guerra Mundial, o cativeiro num gulag siberiano, até ao seu falecimento na Alemanha em 1989.
Financiado pelo governo andorrano, o documentário – que inclui imagens captadas em Olhão, Espanha, Andorra, França e Alemanha – foi muito bem recebido pelo público presente, tal como tem acontecido nos vários festivais de cinema onde já foi apresentado. Encontra-se atualmente em negociação a sua exibição num canal de televisão português.
O evento contou com a presença da ministra da Cultura de Andorra, Mònica Bonell, da representante da embaixada de Andorra, Karina Nobre, do presidente da CCDR Algarve, José Apolinário, e do vice-presidente da Câmara Municipal de Olhão, Ricardo Calé. O programa incluiu ainda conferências de especialistas vindos de Espanha (Gerhard Lang e Eduard Moya), Andorra (Jorge Cebrián) e Portugal (António Paula Brito Pina).
A organização do seminário esteve a cargo da APOS – Associação de Valorização do Património Cultural e Ambiental de Olhão e da Câmara Municipal de Olhão.

A extraordinária vida de Boris Skossyreff
Boris Skossyreff foi um russo branco que fugiu da Revolução Bolchevique em 1917. Em 1934, autoproclamou-se rei de Andorra, sendo preso e deportado para Portugal no ano seguinte. Em Lisboa, foi bem recebido pelas autoridades, concedeu entrevistas e estabeleceu amizade com intelectuais como Mário Domingues, Ferreira de Castro e Roberto Nobre.
Determinado a regressar a Andorra, mas sem conseguir obter passaporte, dirigiu-se a Olhão, onde permaneceu seis meses. Neste período, conquistou a simpatia dos olhanenses, desde humildes marítimos que o alcunharam de “mano-rei” até figuras ilustres como o Dr. Francisco Fernandes Lopes e o Dr. Carlos Fuzeta. Com a ajuda destes amigos, conseguiu embarcar para França em novembro de 1935.
O seu périplo continuou com a prisão em França, a passagem por campos de refugiados e, posteriormente, o recrutamento como intérprete pelo exército alemão na frente russa. Após a guerra, foi sucessivamente capturado por americanos e franceses, acabando por trabalhar para os serviços secretos americanos antes de ser preso pelos soviéticos em 1948. Condenado a 25 anos de trabalhos forçados na Sibéria, foi libertado em 1956 no âmbito de um acordo político.

Mistérios por desvendar
A vida de Skossyreff permanece envolta em mistério. Como sobreviveu como prisioneiro dos soviéticos, sendo considerado um traidor? As suspeitas de que terá servido como espião para múltiplos países – Reino Unido, Alemanha nazi, EUA e possivelmente URSS – continuam a intrigar investigadores.
O seu período em Portugal, particularmente em Olhão, representa um capítulo mais luminoso na sua atribulada existência. As cartas que enviou ao Dr. Francisco Fernandes Lopes, a última datada de 23 de julho de 1965 a anunciar a morte da esposa, testemunham esta ligação. Estes documentos, juntamente com arquivos da polícia política portuguesa, revelaram-se fundamentais para reconstituir a sua história, razão pela qual o documentário atribui especial relevância à passagem de Skossyreff por Portugal.
Nota: texto com a colaboração de António Paula Brito Pina
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