Os doentes oncológicos e as suas famílias, bem como a população do Algarve em geral, assistem hoje, com compreensível desilusão e indignação, a mais um retrocesso na concretização do tão desejado Centro Oncológico de Referência do Sul (CORS). Trata-se de um equipamento há muito aguardado, essencial para garantir cuidados de saúde especializados na região, evitando as extenuantes deslocações a Lisboa ou até mesmo a Sevilha, que tantos doentes e familiares continuam a ser obrigados a fazer.
Depois de anos de expectativa e de promessas políticas, surgiu em abril de 2023 uma luz ao fundo do túnel: foi assinado um protocolo entre a Associação de Municípios Faro-Loulé e o então Centro Hospitalar Universitário do Algarve (atualmente Unidade Local de Saúde do Algarve – ULSA), na presença do então Ministro da Saúde, Manuel Pizarro. Na altura, este acordo foi celebrado como um passo decisivo para a concretização do CORS no Parque das Cidades. É impossível esquecer o clima de esperança e alívio que esse compromisso gerou na população algarvia, especialmente em todos aqueles que convivem, direta ou indiretamente, com a dura realidade da luta contra o cancro.
Porém, essa esperança revelou-se efémera. Menos de um ano depois, o projeto sofreu um revés inesperado: o pedido de licenciamento foi chumbado pela Câmara Municipal de Loulé, com o argumento de que o terreno cedido estava classificado como área verde no Plano de Pormenor do Parque das Cidades, impossibilitando a sua utilização para a construção do CORS. Um erro de planeamento tão básico e absurdo que, por si só, gera indignação e, sobretudo, muitas interrogações.
Como foi possível que, antes da assinatura do protocolo, ninguém na Câmara Municipal de Loulé, na Associação de Municípios Faro-Loulé ou na administração regional de saúde tenha verificado a viabilidade urbanística do terreno em questão? Como é que um compromisso desta importância foi publicamente anunciado e celebrado sem que se assegurassem as condições básicas para a sua concretização? E mais: se o terreno não reunia os requisitos legais para o efeito, por que razão o Presidente da Câmara de Loulé, Vítor Aleixo, não alertou de imediato para essa situação e procurou, desde logo, iniciar diligências para encontrar uma solução alternativa ou um regime de exceção que permitisse viabilizar o projeto?
A resposta a estas perguntas permanece por dar. O que temos, em vez disso, é um clima de fuga às responsabilidades e de aproveitamento político. O PS Algarve, numa inacreditável tentativa de limpar a sua imagem, tenta agora sacudir a água do capote, refutando responsabilidades e tentando atribuir culpas a terceiros. É um comportamento que revela um profundo desrespeito pela população do Algarve e pela gravidade da situação em causa. A saúde das pessoas não pode ser usada como arma de arremesso político. Os algarvios merecem respeito e, acima de tudo, merecem soluções.
Perante este quadro, é inevitável questionar: terão a Câmara Municipal de Loulé e o seu Presidente, Vítor Aleixo, verdadeiramente feito tudo o que estava ao seu alcance para desbloquear esta situação? Não teria sido possível recorrer à figura do interesse público municipal para contornar os constrangimentos urbanísticos? Como explicar aos algarvios que aquilo que foi oferecido com pompa e circunstância, afinal, não valia nada? Como se justificam estes recuos sucessivos e esta manifesta falta de sentido de urgência por parte de quem tem o dever e a responsabilidade de defender os interesses da região?
Apesar das justificações que agora possam ser apresentadas, nada apaga a sensação de abandono e desconsideração que este processo transmite às pessoas que vivem e lutam diariamente com a realidade do cancro. O CORS não é um capricho nem uma promessa eleitoral. É uma necessidade vital para o Algarve, que deve estar acima de qualquer disputa partidária ou burocracia paralisante. O tempo perdido não pode ser recuperado, mas ainda há tempo para fazer o que é certo: colocar a saúde das pessoas em primeiro lugar e garantir, de uma vez por todas, que o Centro Oncológico do Algarve seja finalmente uma realidade.
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