O recente acórdão do Supremo Tribunal de Justiça estipula que um apartamento que tenha como finalidade a habitação permanente não pode ser usado para alojamento local, ou seja, utilizado temporariamente por turistas.
A decisão aplica-se também às unidades de alojamento local que já se encontram registadas, podendo qualquer condómino isoladamente exigir a cessação de tal actividade.
Assim sendo, a entrada em vigor deste acórdão, suspende a inscrição de novos registos de alojamento local,contrariando a tendência crescente que se vinha verificando em todo o País.
Esta jurisprudência significa um regresso à informalidade do passado, na medida em que potencia o aumento dos arrendamentos ilícitos dentro e fora dos empreendimentos turísticos, fuga aos impostos e outras ilegalidades e, por essa via, a concorrência desleal, os maiores inimigos da economia.
A entrada em vigor do Regime Jurídico do Alojamento Local em 2008, facilitou a integração desta oferta paralela na oferta oficial e, por essa via, na economia do País, esbatendo uma prática ilegal existente há décadas.
A visão sobre as camas paralelas aparece associada a fraude fiscal, concorrência desleal, falta de qualidade da oferta e dos turistas, identificação com apartamentos de gama baixa, massificação e, por conseguinte, má imagem da oferta turística nacional, designadamente da maior e mais importante região turística portuguesa o Algarve.
O fenómeno das chamadas “Camas Paralelas” em Portugal em geral e no Algarve em particular resultou, em boa medida, da inadequação das sucessivas Leis Hoteleiras, incapazes de interiorizar os novos conceitos de turismo e de alojamento turístico.
Esta realidade resultou, essencialmente, da cultura dominante nas Instituições Públicas e círculos de interesses, incluindo os ligados ao turismo em meio urbano e alguma hotelaria tradicional.
O não estar registado no Turismo de Portugal ou Câmara Municipal facilita a fuga ao fisco, mas não a implica, nem esta fuga é, obviamente, um exclusivo das camas paralelas.
É por isso que este acórdão judicial exige das entidades competentes, Governo e Assembleia da República, a clarificação urgente da legislação em vigor, visando manter o registo formal desta oferta, ou melhor, a que tem condições para poder ser legalizada, potenciando e não hostilizando ou atacando os mecanismos de distribuição e comercialização existentes, conforme decorre do interesse público do País.
A distribuição/comercialização das camas paralelas é actualmente assegurada por redes informais (amigos, conhecidos, colegas de trabalho, anúncios em jornais, etc.), mecanismos de estruturação que permitem o acesso a operadores turísticos clássicos e, mais recentemente, aos sistemas do e-commerce, facilidades não raras vezes transformadas em burlas, sobretudo quando as reservas são efectuadas através da internet.
O Algarve dispõe actualmente de mais de 140 mil camas registadas como alojamento local, enquanto a oferta classificada oficialmente em hotéis e empreendimentos turísticos não vai além das cerca de 135 mil camas. Mais de dois terços do alojamento local situa-se fora dos grandes centros urbanos de Lisboa e Porto.
Em boa verdade, a exploração ilícita de alojamento privado constituiu, desde sempre, uma realidade em todos as zonas balneares mundiais, sendo o Algarve um dos expoentes máximos desta actividade.
De um ponto de vista meramente conceptual, e contrariamente ao que se verifica no resto do país, especialmente em Lisboa e Porto, os empresários hoteleiros do Algarve consideram que não existe qualquer conflito entre os hotéis e o alojamento privado e local.
* O autor não escreve segundo o acordo ortográfico