A escritora Lídia Jorge defendeu que a ideia de algumas pessoas de que a variante europeia da língua portuguesa “ia ser preponderante caiu por terra”.
“A miragem que alguns tiveram que eram donos, que a vertente europeia ia ser preponderante caiu por terra”, disse à Lusa Lídia Jorge, na terça-feira, à margem da inauguração de uma cátedra com o seu nome na Universidade Federal brasileira de Goiás.
“Qualquer pessoa que é mais ou menos inteligente e se apercebe da realidade compreende que, de facto, aquela ideia mal apropriada de [Fernando] Pessoa que ‘a minha pátria é a língua portuguesa’ – de que isso podia ser uma bandeira de domínio – não é mais”, frisou.
A autora portuguesa, recebida por uma sala que se tornou pequena para a multidão de alunos e docentes que a queriam homenagear, afirmou ainda que a língua portuguesa “não é mais uma bandeira de domínio”.
“O que nós temos de ter é a alegria de perceber que é uma língua tão forte que aguenta várias variáveis, várias variantes da mesma língua e que se realiza de modos diferentes e, no entanto, mantendo um núcleo tão forte”, disse.
Até porque, defendeu, as únicas variáveis existentes entre o português falado nos diferentes hemisférios “são fonéticas, dos sons e algumas flutuações do ponto de vista sintático, morfológico, do ponto de vista semântico, mas são redores”.
“Há aqueles que continuam a ter esse preconceito mas esses passarão”, frisou.
Em relação à homenagem através da inscrição do seu nome numa cátedra, a autora frisou o “carinho que os brasileiros têm” pelos estudos da literatura portuguesa “que é imensa e que muitas vezes em Portugal não se percebe bem”.
“Não se consegue ter a perceção, o impacto que têm os livros literários portugueses aqui no Brasil” disse, acrescentando ainda que Portugal devia “procurar do ponto de vista editorial, do ponto de vista académico corresponder mais a esta ligação que o Brasil faz com Portugal”.
A cátedra com o nome de Lídia Jorge na Universidade Federal brasileira de Goiás é a primeira do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua no Brasil a homenagear uma escritora e a nona no país sul-americano.
Poeta, contista e romancista, Lídia Jorge iniciou a carreira com o romance “O Dia dos Prodígios”, em 1980. Ao longo dos anos, foi galardoada com vários prémios, incluindo o Grande Prémio de Literatura em Línguas Românicas da FIL (2020) e o Prémio Médicis Estrangeiro (2023).
Mais recentemente, em 2022, escreveu “Misericórdia”, a pedido da mãe, internada numa instituição para idosos, no Algarve, que várias vezes lhe pediu que escrevesse um livro com este título.
A história decorre entre abril de 2019 e abril de 2020, data da morte da mãe da autora, que foi uma das primeiras vítimas da covid-19 no sul do país.
Os livros de Lídia Jorge estão traduzidos para diversas línguas, como alemão, galego, búlgaro, castelhano, esloveno, grego, francês, hebraico, húngaro, italiano, holandês, romeno, sueco e inglês, entre outras.
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