EXCESSO DE ZELO
Ser polícia, guarda prisional ou fiscal de múltiplas actividades não é fácil. Há leis e regulamentos para cumprir, sem elas e sem eles seria o caos, e existe uma tendência inata de muitos cidadãos para os driblar sempre que têm oportunidade. Isso é muito visível nas estradas, onde o desrespeito pelas regras e pelos outros são o pão nosso de cada dia. Há condutores que, por inépcia ou vocação, colocam-se em risco e põem os outros em perigo de vida. Há quem conduza alcoolizado, drogado, alienado, com o ódio à flor da pele. Existe muito de vaidade, exibicionismo, sede de mostrar poder, um volante nas mãos equivale a uma metralhadora com munição nos pedais. Daí que a prevenção é didáctica e essencial, tal como a fiscalização é necessária e indispensável. O problema é quando se passa de uma função regulatória do funcionamento da sociedade, para um excesso de zelo ao serviço dos cofres públicos e até do interesse pessoal dos agentes. Entra-se no domínio da caça à multa.
Alô Apolinário. Alô CCDRA. Não se faz nada para resgatar Monchique da pobreza? Recuperação? Resiliência? PRR?
No último ano, uma bateria de radares tecnologicamente mais avançados rendeu à Câmara Municipal de Lisboa 4,5 milhões de euros, e a contagem ainda agora vai no adro da igreja. Em 2022, o Governo arrecadou 138 milhões de euros em multas de trânsito, a grande maioria por excesso de velocidade, o que só espelha a dramática realidade em que vivemos. Mas há dias ficou-se a saber que três agentes da EMEL sovaram um automobilista por razões fúteis, com investigação em curso. A ocasião teve o mérito de revelar que este corpo de segurança municipal tem direito a comissões, bónus e prémios de produtividade em função das multas que aplicam. Revoltante! Lá como cá pelo Algarve, é vulgar ver polícias municipais num afã de encontrar viaturas estacionadas no sítio certo, com o ticket no tablier, a multar mal passou um segundo sobre a hora limite que o pagamento permitiria. Tolerância zero! Chama-se a isto excesso de zelo, e um péssimo contributo para a imagem da corporação.
Os agentes deixam de ser vistos como protectores, e passam a ser vistos como uma ameaça, contribuindo para uma cultura do medo entre os cidadãos. Os automobilistas são um alvo demasiado fácil. É pena que tanto empenho a penalizar os donos das viaturas não seja empregue a fiscalizar a construção clandestina que se encontra no Algarve em fase de dinâmica imparável, ou a impedir a grafitagem que os gatafunheiros pintalgam nas paredes, nas vedações, nos viadutos, nas pontes e até nas carruagens da CP. Aí, certas autarquias que tanto contribuem com políticas urbanísticas erradas para a densificação dos centros habitacionais e para a falta de estacionamentos, fazem nada ou muito pouco. Acredita-se que os seus responsáveis não gostariam de ser vistos como zelotes, beatos falsos ou tartufos. Porém, passa-se do excesso de zelo para a falta de zelo em absoluto com demasiada facilidade. Um desequilíbrio de prioridades.
AMARGO E DOCE
Duas notícias colocaram o Algarve em destaque há poucos dias. Uma é boa, outra é triste. Comecemos pela primeira. Dum total de 658 águas balneares em Portugal, apenas 54 foram consideradas Praias Zero, ou seja, onde não foi detectada qualquer contaminação microbiológica. O Algarve é campeão, com 21 praias distinguidas. Albufeira (6), Tavira (4), Vila do Bispo (4), Aljezur (3), Faro (3) e Vila Real de Santo António (1) estão de parabéns. Prémios avalizados pela Ciência, não são prémios comprados. No vértice oposto, Monchique apareceu no top-10 dos municípios mais pobres de Portugal, em índice de poder de compra per capita. Alô Apolinário. Alô CCDRA. Não se faz nada para resgatar Monchique da pobreza? Recuperação? Resiliência? PRR?
PARÁGRAFO DE HUMOR
Tal como sempre vos disse (não é verdade, mas faz de conta que é…), não tenho bem a certeza de ter remetido a semana passada ao Director Henrique Dias Freire o original secreto e classificado das Percepções e Realidades. Aliás, consultado o meu mano José, ele garante que isso foi enviado no domingo às 20h30m. Coisa que a chefe de gabinete do primo do meu cunhado Mendes garante ter acontecido já para lá da meia noite, depois de ter falado com todo o grupo de excursionistas do meu padrinho Bota, pedindo conselho sobre se deveria ser chamado o MI5 de sua Alteza Real o Pretendente ao Trono de Portugal para recuperar a saca de alfarroba que o handyman Friedrich Pinetree se preparava para galapiar do Convento dos Ministros Adventistas da Primeira Hora, dentro da mochila e a cavalo da trotineta. São todos muito sérios, excepto quando se estão a rir para dentro e a mentir para fora…
*O autor escreve de acordo com a antiga ortografia