A justiça e o equilíbrio
O Governo alterou a lei a fim de permitir a construção de edifícios em prédios rústicos, com o objetivo de minimizar a crise habitacional.
O drama da habitação transformou-se numa questão política e social, de dimensão crescente, que se agrava e vem a assumir contornos transversais a toda a vida em sociedade.
Não tenhamos ilusões! Não nos parece que as questões habitacionais se resolvam com recurso às operações urbanísticas de edificação, ou seja, com a construção de edifícios.
Habitação, não significa “morada fiscal”
A habitação de uma família representa muito mais do que a sua residência. Envolve equipamento social, educativo, de segurança, saúde, cultura, relações de vizinhança, que nos acompanharão…, ou seja, um mundo de circunstâncias interativas, que moldam a nossa existência e cuja memória perdurará durante a nossa vida.
O Governo alterou a lei, a fim de permitir a construção de habitação em prédios rústicos.
Habitação significa lar… relações de “vizinhança”, equipamento e muito mais
Destinados à construção de edifícios de habitação a custos controlados, ou não, os prédios rústicos abrangidos, multiplicarão o seu valor várias vezes.
Inclusivamente, a esmagadora maioria destes prédios rústicos, presentemente, apenas implicam encargos de limpeza e manutenção.
Nesta perspetiva, são largos milhares os proprietários de prédios rústicos – infraestruturados – localizados nas proximidades, ou confinantes com os limites de perímetros ou espaços urbanos consolidados.
Quantos prédios rústicos, infraestruturados, se encontram no lado oposto das vias que delimitam os perímetros ou espaço urbanos?
Estes proprietários permanecem agora na expetativa de beneficiarem desta iniciativa e rentabilizar o seu património. Com toda a legitimidade…
Muitos proprietários, até para habitação dos seus próprios filhos, aguardaram durante longos anos pelo que dizem ser uma “alteração ao PDM” que lhes permitisse tornar a sua propriedade tão valiosa como tantas outras que, simplesmente e apenas, se localizam no “lado oposto da estrada, ou rua…”, que delimita a zona ou espaço urbano.
Outros aguardaram durante décadas pela “alteração ao PDM” que lhes permitisse construir, tal como os seus vizinhos, no lado oposto da via
O sistema de planeamento em vigor impõe, naturalmente, a delimitação de perímetros urbanos e servidões restritivas.
Assim o entende e exerce a Administração Pública, bem com o poder local, porque a delimitação dos espaços urbanos é uma exigência incontornável. Porém, existem várias metodologias e mecanismos para implementação de tais limites.
Com a alteração do regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial, a fim de permitir a edificação em prédios rústicos, não enfrentaremos um grave problema…
Serão, com certeza, alguns milhares de situações a ponderar, pelo menos no que respeita aos critérios de justiça a aplicar na transformação de prédios rústicos em urbanos, não prevista nos sequenciais regimes jurídicos, que antecedem e deram origem à legislação agora alterada. Porém, convém lembrar que o sistema de planeamento do território teve origem em mecanismos artesanais.
Não nos devemos esquecer que muitos dos planos ainda em vigor são de primeira geração e foram, literalmente, desenhados a cores, a marcador, sobre as cartas militares – em papel – à escala de 1/25000.
Com tal metodologia, os traços delimitadores utilizados na classificação dos solos ocupam uma extensão muito considerável do território.
Uma parte dos PDMs são de primeira geração. O que significa?
Embora, variando os tons, na carta militar foi então “pintada” a REN, a cor azul, a verde a RAN, a tons de castanho as áreas edificadas ou (ainda), edificáveis, etc…
Muito frequentemente, a carta de condicionantes, não coincidia, nem coincide – em termos de informação geográfica – com a de ordenamento.
Parece complexo… Mas voltaremos a esta parte do tema…
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