A introdução de portagens na Via do Infante, para além de taxar injustamente os algarvios, representa mais um imposto sobre a actividade económica mais importante do país e a que mais contribui para esbater a maior fraqueza da economia nacional – o endividamento externo. Ou seja, na prática, matar a galinha dos ovos de ouro. Na minha terra, um povo de montanheiros incultos, chama-se a isto “graganeirice”.
Os governantes, políticos em geral, académicos, banqueiros – as chamadas elites nacionais -, conhecem mal o sector dos bens transaccionáveis, ou seja, as exportações, sobretudo as intangíveis (serviços), como é o caso do turismo do Algarve.
A galinha já de si mal alimentada espera apenas o golpe final, acabando mais tarde ou mais cedo por sucumbir
Começou por se chamar VLA – Via Longitudinal do Algarve e teve parto difícil. A discussão sobre qual o melhor traçado envolveu discussões acesas e esgrimiram-se razões, fundamentações técnicas e políticas, etc., para justificar um em detrimento de outro. A opção final foi a que ficava no meio, que é, segundo diz o povo, onde está a virtude.
Passou de VLA a Via do Infante enquanto o diabo esfrega um olho. Mais tarde foi baptizada de IP1 e, como quem não quer a coisa, do dia para a noite, rebaptizaram-na de A22.
Soubemos depois que “SCUT” significava sem custos para o utilizador, o que deixava desde logo antever que, mais tarde ou mais cedo, teríamos todos que pagar, nem que fosse com um palmo de língua de fora.
O primeiro troço, entre a fronteira espanhola e o nó da Guia/Ferreiras, ficou concluído em 1992, construído com dinheiros comunitários, aquando da realização da Expo de Sevilha. O traçado final, tal como o conhecemos hoje, só ficou concluído onze (11) anos mais tarde.
Neste contexto, a Via do Infante não oferece, em caso algum, os requisitos técnicos de auto-estrada, nem a EN 125 constitui uma alternativa, como aliás ficou amplamente provado em 2004, na maior manifestação já realizada na região contra as portagens.
A EN125, então apelidada de Estrada da Morte, aquém e além-fronteiras, objecto de inúmeras reportagens televisivas e outras de países estrangeiros, era considerada como um dos aspectos mais retrógrados de um país que se pretendia turístico, competitivo e desenvolvido.
No Algarve, a maior Sala de Visitas do País, enquanto se demorava duas horas e meia de avião entre Londres e Faro, precisávamos de seis horas para chegar do aeroporto até Lagos. Só a paciência dos algarvios permitiu pactuar com estes desmandos, e a muita vontade e teimosia dos turistas em vir passar férias ao Algarve.
A introdução de portagens na Via do Infante é irresponsável e própria de políticos e governantes que não conhecem as realidades económicas e sociais do país onde vivem, ou que acham que governar bem é continuar a extorquir cada vez mais à plebe para que uns quantos continuem a gastar à grande e à francesa, mesmo que isso signifique pôr em causa a economia e o bem-estar de todos nós.
Não admira, portanto, a imagem negativa que o povo tem dos políticos e da política, sobretudo no Algarve.
Esta medida, contrariamente ao que se possa pensar, não é contra os algarvios em particular, mas antes contra os milhões de turistas que procuram anualmente o Algarve para as suas férias, dos quais cerca de 50 por cento são estrangeiros. Nestes termos, os mini descontos, sucessivamente, anunciados não passaram de mais areia para os olhos dos algarvios, assim como a extinção das portagens aprovada, recentemente, na Assembleia da República, algo em que ninguém acredita.
Por tudo isto, quem mais deveria proteger a galinha é, precisamente, quem a quer matar, reclamando todos os ovos de ouro de uma assentada, embora esta não se tenha cansado de, diariamente, deixar o seu ovo de ouro na mão daqueles que só pensam em si próprios, nas suas benesses e em mais ninguém.
A galinha já de si mal alimentada espera apenas o golpe final, acabando mais tarde ou mais cedo por sucumbir, tal como na fábula, às mãos da ganância e da inveja dos que não se importam de pagar portagens desde que os algarvios também paguem.
É por isso que a nossa galinha dos ovos de ouro está condenada e não tem salvação.
*O autor escreve de acordo com a antiga ortografia
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