É ainda um personagem pouco conhecido, cuja popularidade não se aproxima da granjeada pelo Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky. Mas é de Valeriy Zaluzhny um dos papéis mais relevantes na resposta da Ucrânia à invasão russa. A sua distância dos holofotes, conta o “Politico“, mais do que circunstancial, é uma opção: o general de ferro é “herói”, mas não quer “ser estrela”, escreve-se sobre o chefe de Estado Maior das Forças Armadas ucranianas. Ele é, até agora, o principal responsável pelo bom sucesso das armas ucranianas face à invasão russa.
Criado numa família com ligações ao ramo militar, Zaluzhny foi nomeado para a liderança das Forças Armadas em julho de 2021, quando Zelensky já havia sido nomeado Chefe de Estado. As expectativas não eram as mais fáceis, após o precedente aberto pela anexação da Crimeia, em 2014, que tornou o Donbas numa região de conflito.
Dois meses após tomar posse, Zaluzhny alertou sobre a chegada de tropas russas às fronteiras da Ucrânia. “Falo disso desde que assumi o cargo – porque é uma ameaça de agressão em grande escala”, dizia, em entrevista à Rádio Svoboda. “A nossa missão como Forças Armadas não é esperar o maná [comida] do céu. Devemos preparar-nos para isso [a invasão]. E fazemos tudo para isso. Da nossa parte, estamos a a participar num conjunto de exercícios, incluindo com os nossos parceiros ocidentais, incluindo membros da NATO, bem como parceiros da NATO. Estamos a fazer todos os possíveis para tornar o inimigo, por assim dizer, menos disposto a implementar esse cenário.”
O cenário, porém, confirmou-se: a 24 de fevereiro, iniciou-se uma invasão russa que muitos analistas viam como perdida à partida para o exército ucraniano – menor e com muito menos meios que o russo. Ao 46º dia de guerra, é possível dizer que a resistência ucraniana tem permitido, pelo menos, conter os anseios expansionistas de Vladimir Putin. E é ao “general de ferro” que se atribui boa parte desse sucesso.
São pouco comuns as aparições públicas de Zaluzhny, o que, se por um lado permite conhecer pouco do seu perfil, por outro, garante força a cada declaração. No final de março, o general veio a público defender as suas tropas, a propósito do vídeo que mostrava imagens das alegadas agressões a prisioneiros russos.
O Governo ucraniano prometeu investigar o caso e o chefe das Forças Armadas sentenciou que os seus soldados “aderem estritamente às normas do direito humanitário internacional”. Colocou depois o ónus na Rússia e na “guerra da desinformação”. “O inimigo produz e partilha vídeos com o tratamento desumano de supostos ‘prisioneiros russos’ por ‘soldados ucranianos’ a fim de desacreditar as Forças de Defesa Ucranianas”, escreveu o general, no canal de onde partilha declarações públicas: a sua página de Facebook. Mais uma característica: a lealdade e a defesa dos seus.
Ao site “Politico”, um ex-oficial da força área ucraniana, Oleksiy Melnyk, dá uma nota sobre o perfil militar de Zaluzhnyy: “provavelmente posso falar dele não apenas como uma única pessoa, mas como um representante da nova geração de militares ucranianos.” Porquê?
Ao contrário dos soldados formados sob a ortodoxia russa, Zaluzhnyy esteve na frente de batalha no Donbas, a partir de 2014, e pelo meio, recebeu treino militar com os tais parceiros a que se referiu na entrevista acima citada. Segundo as mesmas fontes, essa colaboração com a NATO e com o ocidente deu a esta nova geração de militares ucranianos uma forma mais descentralizada e ágil de enfrentar o terreno. Características que têm sido apontadas como decisivas para os bons resultados na frente de guerra, perante o modelo mais rígido das forças russas.
A propósito desse tempo, há uma ideia que Zaluzhnyy repete quase sempre, nas intervenções a que é possível chegar: “a nossa guerra começou em 2014”. O agora comandante das Forças Armadas, como muitos ucranianos, estava preparado para o que aí vinha.
Num encontro de janeiro deste ano com o Comité Militar da NATO, ainda a invasão não tinha acontecido, o general resumiu essa preparação assim: “Os nossos parceiros da NATO tinham uma pergunta – se eu partilho das suas preocupações”, sobre a Rússia. “Respondi que só fiquei preocupado uma vez, em 2014, quando agarrei na minha espingarda, colete à prova de balas e fui para a guerra. Aí eu estava preocupado, mas desde então, tem sido simplesmente fazer o meu trabalho.”
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL