Sexta-feira foi o 51º dia da invasão da Ucrânia pela Rússia. A agência Tass explicou o afundamento do navio de guerra “Moskva”, na véspera, com uma explosão a bordo. Na verdade o cruzador foi atingido pelas Forças Armadas da Ucrânia, numa das maiores perdas navais da Marinha russa em várias décadas. A agência noticiosa oficial russa publicou um vídeo de uma cerimónia de homenagem “aos que cumpriram a sua missão até ao fim, pelo navio”, em Sevastopol, na Crimeia, base da frota do Mar Negro. Esteve presente um padre ortodoxo russo e foi depositada uma coroa de flores com uma faixa preta no monumento que assinala o tricentenário da frota russa. O site informativo “Fontanka”, de São Petersburgo, citou a inscrição na faixa preta: “Pelo navio e pelos marinheiros”. Ou seja, houve vítimas mortais, que a Tass não mencionou.
O afundamento do “Moskva” aconteceu no mesmo dia em que a Rússia deu conta de ataques ucranianos na região fronteiriça de Bryansk. Um dia antes, o major-general Igor Konashenkov afirmou que “centros de decisão” em Kiev seriam alvos legítimos se a Ucrânia disparasse contra a Rússia. Dirigentes ucranianos alertaram para operações de falsa bandeira na zona da fronteira.
No tabloide “Komsomolskaya Pravda”, o correspondente de guerra Dmitry Steshin relatou que as forças russas estavam prestes a tomar Mariupol, no sul da Ucrânia. Os civis já não podem sair da cidade cercada, porque há combatentes “nazis” — forma como a comunicação social estatal russa rotula os que defendem a Ucrânia — disfarçados de civis.
Esses órgãos de informação omitem que os residentes que restam em Mariupol e não conseguiram fugir estão a morrer à fome, nas palavras do Programa Alimentar Mundial das Nações Unidas. A versão russa da rádio Voice of América transmitiu essa informação.
O Presidente da Ucrânia disse à CNN, sexta-feira, que o balanço de mortes em Mariupol e noutras cidades era impossível de apurar. Volodymyr Zelensky avisou que o seu homólogo russo, Vladimir Putin, poderá recorrer a armas químicas ou nucleares.
Estimou as baixas russas em 19 a 20 mil, contra 2000 a 2500 para a Ucrânia. Moscovo só reconhece 1351 baixas.
Se a Rússia conquistar Mariupol, ficará com uma ponte terrestre entre a Crimeia, que anexou em 2014, e os territórios separatistas que controla no leste da Ucrânia. Margarita Simonyan, diretora do canal RT, participou no programa de debates de Vladimir Solovyov no Channel One. Segundo ela, os prisioneiros de guerra ucranianos, que descreve como “monstros”, reconstruirão a cidade em trabalhos forçados. O pivô afirmou que serão “reeducados” para “endireitar as suas cabeças”, ouvindo a rádio e a televisão russas.
O programa “Antifake”, cujo apresentador se celebrizou com um programa de vídeos domésticos humorísticos, adaptou-se ao papel de descobridor de mentiras nos órgãos de informação ocidentais. Tanto assim é que um artigo que etiquetou de “falso” — presos de guerra ucranianos a serem levados por Rostov enquanto eram insultados — nunca aconteceu.
A porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo, Maria Zakhatova, escreveu na rede social Telegram que os culpados da propagação de falsidades são Mark Zuckerberg e a sua firma Meta: “É claríssimo que a Meta e outras empresas digitais americanas participam abertamente na guerra de informação lançada por Washington contra o nosso povo, criando uma realidade alternativa e mentirosa”.
Mark Krutov, repórter da Radio Liberty/Radio Europe, localizou um soldado russo e a sua mulher, na Crimeia. Numa conversa telefónica, ela, em tom jocoso, dá autorização ao marido para violar mulheres ucranianas. A chamada tornou-se viral.
Outro choque, sexta-feira, foi novo ataque aos jornalistas e comentadores cujo trabalho está proibido na Rússia. O Ministério da Justiça declarou “agentes externos” Yury Dud, entrevistador num canal de entrevistas e documentários do YouTube visto por milhões e pessoas que falara contra a invasão da Ucrânia, e Ekaterina Shulman, politóloga conhecida pelas suas análises fluentes de assuntos variados e apelos à ação cívica.
Já o “Redaciya”, canal de YouTube de Aleksi Pivovarov, outro jornalista de televisão estrangeiro, publicou um trecho de quase 45 minutos com videochamadas entre parentes e amigos que estão uns na Rússia, outros na Ucrânia.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL