Como profissional do Turismo, Eliseu Correia falou ao POSTAL da conjuntura turística que o Algarve vive no momento. Explicou quais as suas expectativas para os próximos anos e qual a sua opinião sobre a nova equipa da Região de Turismo do Algarve. Para além disso, o empresário deu ainda a sua opinião sobre o projecto “Algarve 365”.
Segundo as últimas estatísticas, o Algarve teve uma descida no número de turistas. Como é que um profissional do Turismo vê esta situação?
Para mim e para muitos de nós que trabalhamos no Turismo isso não é surpresa nenhuma. Já há muito tempo que alerto para o facto de andarmos a viver do mal dos outros. Tudo o que tínhamos a nível de acréscimo não tinha nada a ver com a nossa pro-actividade, eram sim os efeitos inerentes a uma conjuntura que nos era francamente favorável. Ou seja, não tinha a ver com o nosso mérito, mas sim com a desgraça dos outros destinos. Como era claro, destinos como a Tunísia, Egipto ou Turquia, ligados ao comércio devido às raízes culturais, não iam ficar a chorar sobre o leite derramado e que mais tarde ou mais cedo iriam tentar recuperar o que tinham perdido. É também claro que quem manda no Turismo a nível nacional, apesar de não serem melhores ou piores que os que estavam anteriormente, são políticos e não técnicos do Turismo.
Quando estão na mó de de cima são tipo surfistas e apanham as ondas e quase que dão a entender que os resultados são mérito da estratégia deles e do seu trabalho. Hoje em dia, os resultados são negativos e é como se uma praga ou epidemia os tivesse assolado que nunca mais ouvimos falar deles.
O que é que quer dizer com isso?
O que é preocupante é que isto é de tal maneira previsível que é só demonstrativo da total incompetência e da total imprudência das pessoas que comandam os nossos destinos. Ou seja, tivemos aqui uma oportunidade única para captar e fidelizar novos mercados, que só vieram para aqui devido ao azar dos outros e o que é que nós lhes demos? Demos um Aeroporto de Faro, sem capacidade de escoamento, com obras a decorrer e que mesmo assim continua com muitas dificuldades em dar vazão ao fluxo que tem. Demos uma A22 com todas as suas vicissitudes. Demos uma EN125 que mata gente todos os dias com uma sinalização que não existe. Foi isso que nós lhes demos.
E a nível de privados?
Nós, os privados, demos uma restauração de qualidade e serviços de qualidade na hotelaria. Ora, isso só em si não é o suficiente. Eu acho que não só não aproveitámos a oportunidade que tínhamos, como menosprezámos a capacidade dos outros. Eles estiveram a dormir enquanto os outros estiveram bem acordados. Por exemplo, era previsível a falência da Monarch Airlines há meses e nós temos por obrigação acreditar que as pessoas que ocupam os cargos que ocupam, terão acesso a mais informação do que outro qualquer mortal comum. Nesse caso, teria sido normal que, como gestores dessa área, tivessem tomado as devidas providências para antecipar o cenário e terem na manga uma solução para essa situação, mas foi exactamente o contrário que aconteceu.
Em Agosto, por exemplo, os preços dos voos de Inglaterra para cá são proibitivos. Estamos a ver um Algarve com uma capacidade ainda tremenda de disponibilidade e já passámos os feriados e não tivemos aqui nada de especial e essa é que é a grande verdade. Não perceberam que o problema que nós temos, os espanhóis também tiveram e as Canárias e as Baleares, ao contrário dos nossos, atacaram forte os mercados alternativos para tapar os buracos, um deles o mercado português.
E o que é que isso significa?
Ora, isto significa que todos aqueles que achavam que era o português e o espanhol que nos ia resolver o problema, enganaram- se, porque esses estão nas Canárias ou nas Baleares a usufruírem daquilo ao preço a que estão a usufruir. Há um livro fantástico que se chama “A arte na Guerra” e as únicas pessoas que não o leram são as pessoas que mandam no nosso Turismo. É lamentável que ninguém tivesse tido essa inteligência e essa preocupação. Em vez de estarem preocupados a passearem os seus egos e as suas caras nas televisões enquanto isto esteve bem, deviam ter feito o trabalho deles, salvando-nos daquilo que está a acontecer no Algarve e na Madeira à força toda. Não está a acontecer em Lisboa e no Porto, obviamente porque principalmente o Porto ainda está numa fase de crescimento e Lisboa atrai mercados diferentes como a China e o Brasil. Os números maquilhados, no fim do ano, se calhar vão dizer que tivemos um ano turístico melhor do que em 2017. O que será possivelmente verdade para Lisboa e Porto, mas não será de certeza verdade para as outras principais áreas turísticas do país. Eu como algarvio e profissional da área de Turismo não estou nada surpreendido. Esta empresa tomou as devidas providências em Junho do ano passado.
Que medidas foram essas?
Foram medidas a nível da contratação de hotéis, a nível estratégico sobre como havíamos de colocar o produto e como nos haveríamos de antecipar a certos cenários. Fomos afectados de um ano para o outro, devido ao tempo atípico que tivemos e ao Mundial, ambas situações que roubaram muita gente em Junho, logo a soma disto só poderia ser pancada brutal. Nós notámos e foi um ano tremendo também para a área da restauração com bastantes prejuízos.
Os clientes que ainda vêm face àquilo que era proposto, vêm com menos capacidade financeira, logo, poupam em tudo o que seja refeições fora. A verdade é que os únicos restaurantes que continuam cheios são aqueles tradicionalmente reconhecidos e cuja qualidade está muito acima da média e que não vivem só do fluxo do Verão. Já aqueles que vivem só do fluxo turístico, obviamente, que tiveram um Verão para esquecer. Acredito que o Setembro e o Outubro possam atenuar alguma coisa.
A Tunísia e o Egipto estão já com estratégias para 2019 e 2020, coisa que não vi aqui ninguém falar, e nós vamo-nos divertindo com campanhas com músicas. Acho que se vive de um mundo que não é real enquanto os outros estão no terreno, que é onde se ganham as batalhas e onde se vê como as coisas funcionam. Eles estão a fazer o trabalho deles e nós estamos aqui a dormir e não me parece que isso vá mudar. Esperamos um 2019 e um 2020 muito difíceis e não tenho dúvidas quanto a isso.
Essas são as suas perspectivas?
Sim, a minha perspectiva é que as coisas não vão mudar nos próximos dois anos. Digo isto com muita mágoa e sou um optimista por natureza que olha sempre para o copo meio cheio. Nós quando trabalhamos e estamos no terreno não nos podemos dar ao luxo de ter algumas pessoas a viver no mundo do faz de conta, porque neste mundo o faz de conta não paga ordenados, nem garante sobrevivências de empresas.
Como referiu, já estava à espera desta situação e precaveu- se antecipadamente. Que medidas tomou?
A nível da estratégia da própria aquisição de contratualização de hotéis, e não só. Ou seja, tentar especificar mais, antecipar o lançamento de certos produtos no mercado, sabendo que o Julho e o Agosto iam ser difíceis porque não iam existir lugares de avião, logo, iam-se atingir valores insuportáveis. Quem mais cedo chegasse ao mercado com boas ofertas, seria certamente quem iria atenuar o impacto futuro. Dentro daquilo que é a nossa estratégia como empresa de intercâmbio, foi isso que nós fizemos e é isso que nos irá levar até ao fim de 2018 com resultados bastante melhores do que os resultados das próprias regiões. Não tenho dúvidas quanto a isso. Estamos a falar de um mercado inglês em que as quebras devem andar nos 10%, Irlanda, Holanda e Alemanha na casa dos 20 e isto são os principais mercados emissores.
Quando esses mercados têm quebras de 20% ou mais, tanto para o Algarve como para a Madeira, é natural que todos nós que temos esses clientes como referência, temos de tentar fazer das tripas coração para atenuar essas coisas que nos ultrapassam. Não somos nós que trazemos para aqui os aviões, não somos nós que contabilizamos os voos, não somos nós que vamos arranjar estradas. Portanto nós só temos de fazer um ‘damage control’ e foi isso que fizemos.
Basicamente e, segundo o que me explicou, isto é tudo um ciclo que se vai criando…
Sim. É natural. Quando a procura é menor e a oferta ainda decresce mais do que a própria procura, é natural que se apliquem as regras económicas. Quando há mais procura para o pouco lugar disponível, o preço cresce e, como eu disse, quem quiser voar de Londres para o Algarve paga 400 libras. Depois temos a Turquia e a Tunísia com preços de 250 euros com tudo incluído em hotéis de cinco estrelas, com voos a partir de Gathering.
Nós nunca conseguimos competir com os principais concorrentes nesses mercados porque são mercados que têm outras realidades e outros custos que nós não podemos acompanhar. Possivelmente com o valor de um empregado de mesa no Algarve se calhar compra-se uma brigada inteira na Turquia. Nós já sabemos que não é comparável, mas também sabemos que sendo essa a realidade, temos de apostar no cliente que está disposto a pagar mais alguma coisa para ter um serviço diferente. Nós não estamos a falar que nos outros sítios as pessoas são maltratadas ou que a gastronomia não está à altura, mas temos outros argumentos, nomeadamente a segurança. Esse argumento serviu-nos muito tempo. Comparativamente com o Egipto, por exemplo, temos o facto da proximidade europeia.
Eu acho que o factor preço nunca foi uma coisa com que pudéssemos competir com ele, mas podemos estar mais próximos. Se o nosso preço e se aquilo que nós oferecemos tiver uma diferença mais pequena, o factor segurança e o factor cultural farão depois a diferença. Agora, se um voo for mais caro do que toda uma estadia, a nossa capacidade de resposta e de reacção diminui drasticamente. Obviamente que não há nenhum destino, a não ser que seja só servido por mar, que consiga sobreviver se não tiver uma boa ligação aérea.
Eliseu Correia trabalha na área do Turismo há mais de 30 anos. Nasceu em Hamburgo, mas cedo veio viver para o Algarve, mais propriamente para Montenegro, em Faro, motivo esse que o faz considerar-se um algarvio de gema. Passou pelo Atlantis Vilamoura, Quinta Nova, Marinotel Vilamoura e pelo Sheraton. Há oito anos, em 2010, fundou a sua empresa de incoming, a EC Travel. No primeiro ano contou com uma facturação de seis milhões, actualmente o valor ronda os 34 milhões. Eliseu foi agraciado com a Medalha de Mérito de Grau Prata pela Junta de Freguesia de Montenegro e com a Medalha de Honra pela Junta de Freguesia de Olhão.
Então o segredo passa por ter uma boa acessibilidade aérea?
A acessibilidade aérea é o segredo disto tudo e se não há aviões, não há destino. Acho que todas as sinergias, verbas disponíveis e forças regionais e nacionais devem-se juntar no sentido de tentar trazer para aqui cada vez mais companhias aéreas. Depois, também é necessário que os aeroportos tenham a capacidade de escoar esse fluxo e prestar um serviço à altura dos esforços feitos pelos outros. Eu não estou a dizer que a promoção é a única culpada disto tudo, há diversos factores. Contudo, uma pessoa que chega ao Aeroporto de Faro e precisa de três horas para passar pelo controlo de passaporte com um ar condicionado que funciona como funciona, é natural que não sinta um bom cartão de visita. É natural também que os clientes depois reclamem junto às companhias aéreas e as companhias em vez de pensarem em pôr mais lugares, pensem em cortá-los. Essa é a grande realidade. No fundo, toda a gente diz que o Turismo é uma grande alavanca da nossa economia, mas todas as medidas que vejo a serem tomadas é exactamente como se fosse o contrário. E já nem refiro as estradas e as sinalizações que isso já foi extremamente discutido em várias frentes, mas a verdade é que isto é uma relação bipolar. Por um lado, toda a gente reconhece a importância do Turismo, mas por outro lado não vejo uma medida a ser tomada há muito tempo, que seja favorável ao exercício das nossas competências. Eu, como algarvio, continuo a achar que ter a A22 paga não faz sentido. Já que é para pagar ao menos que estivessem pessoas a cobrar. Aquele sistema é estapafúrdio e ninguém percebe como se faz. Nada, mas mesmo nada, é feito. Eu tenho mais de 30 anos disto e já vi este ciclo imensas vezes e as queixas de 1990 são muito parecidas às minhas queixas de 2018.
Porquê?
Porque nada mudou. Essa é a triste realidade. Eu não estou aqui a personalizar ou a individualizar aquilo que estou a dizer, isto é um problema estrutural. O Turismo é comandado por pessoas que não trabalham em Turismo e isso é o mesmo que eu mandar para um laboratório químico um indivíduo que é da área do Turismo. Não me parece que seja a pessoa acertada para tomar as decisões certas para aquilo. Quero com isto dizer que as pessoas que lá estão não têm culpa nenhuma. Que culpa é que um advogado ou um engenheiro de um determinado partido tem de o colocarem na área do Turismo? Nenhuma.
Agora como nos partidos em si não existem técnicos de Turismo, e essa é a verdade, quem vai para lá é quem é nomeado. Depois, quem lá está faz aquilo que pode e quando finalmente começa a perceber alguma coisa do assunto, vai-se embora e vem outro. E o que vem a seguir, em 99% dos casos, diz que tudo o que está para trás foi mal feito e começamos tudo de novo. Não existe um fio condutor, não existe consistência e não existe um plano que faça sentido e que os mercados emissores respeitem. Ou seja, tem a ver com a coerência e com a consistência do próprio plano. Vem um diz que é para a direita, depois vem outro e diz que é para a esquerda e nós acabamos por nunca ter ninguém que nos leve a sério, porque não temos o plano.
Voltando ao mercado emissor, saiu recentemente uma notícia que refere que este ano existiram muito menos turistas britânicos no Algarve.
Perdemos tempo a apostar em mercados como a Polónia e a Itália. Atenção, que tenho o maior respeito por eles, mas a verdade é que esses turistas só vêm ao Algarve em Julho e Agosto. Esta empresa nasceu a facturar seis milhões de euros e hoje factura 34 e 95% está sobre os mercados do Reino Unido, alemão e holandês. Ou seja, eu sempre defendi que não faz sentido plantar uma semente no deserto e esperar que se desenvolva quando há sítios que se joga uma semente para o chão e o terreno é fértil e em cinco minutos nasce algo
Se nós temos cerca de 5% de market share no Reino Unido e nem 1% no mercado alemão, que é o país que mais viaja no mundo… Portugal não tem 1% dos alemães a viajar para o nosso país e são pessoas que viajam o ano inteiro, logo porque é que hei-de ir para um país que tem cerca de três ou quatro milhões de habitantes, quando mesmo que traga 10% daquele mercado para cá, equivale a 0,1% do mercado alemão ou inglês? Nós não podemos e não devemos virar costas àquilo que é a nossa cultura.
O Reino Unido sempre foi próximo de Portugal e há razões culturais e históricas que fazem destes dois pólos países irmãos. E isto é a mesma coisa com a Irlanda. Eu não vejo mal nenhum em estarmos dependentes desse mercado porque estão longe de estarem na sua maturidade, estão longe de estarem saturados. Se tivéssemos 50% do mercado inglês tínhamos de ter cuidado, mas só temos 5%, logo qual é o problema? Temos muito espaço para renovar stocks anualmente, temos muito ainda por onde crescer, logo, porque é que havemos de perder tempo com mercados que não nos dizem nada e que não têm culturalmente a ver connosco? Por arrastamento nunca foi o destino deles e só vêm em Julho e Agosto, mas não é esse o nosso problema.
Claro que precisamos de ajuda, precisamos sempre, mas a questão da sazonalidade combate- se havendo aviões o ano inteiro e havendo campanhas em destinos que viajam o ano inteiro. O que é que um polaco tem aqui para ver? Aqui há uns anos houve um secretário de Estado com uma inteligência suprema que queria pôr voos da Polónia para aqui no Inverno. Toda a gente sabe que os polacos só vêm a Portugal para vir a Fátima ou para fazer praia. Logo, a probabilidade de termos polacos no Algarve no Inverno é muito reduzida. Isto, só para mostrar que há decisões que são tomadas por pessoas que em frente a uma folha de Excel acham que aquilo é giro. Pior que não saberem é não ouvirem quem sabe. Isto é como um hamster numa rodinha, ele faz um exercício tremendo e sua bastante, mas na prática não sai do mesmo sítio, nós estamos muito iguais a isso.
Acha que a nova equipa da Região de Turismo do Algarve (RTA) irá conseguir dar a volta a esta situação?
Primeiro, a Região de Turismo do Algarve, como está agora, pouco ou nada influi na região. Custa-me dizer isto, mas a verdade é esta. A Região de Turismo do Algarve comanda a promoção interna, ou seja, o mercado nacional e Espanha, logo o João Fernandes irá comandar essas duas áreas, em termos de promoção. Obviamente, sendo o presidente de Turismo do Algarve terá os Postos de Turismo e essas coisas, mas não me parece que vá mudar seja o que for.
Nós temos aqui um flagelo que nos assola que se chama taxa turística e nós ainda não ouvimos o novo presidente da Região de Turismo, que está cá para defender os interesses turísticos do Algarve, dizer uma única palavra contra essa taxa. Isto, mesmo quando sabe que 80% do tecido empresarial algarvio tem consciência do mal que essa taxa traz numa altura destas. Estou a falar dos que trabalham do Turismo no dia-a-dia e dos que têm de pagar ordenados. Ainda não ouvi uma única palavra contra, mas já ouvi, nas entrelinhas, dizer que ia estar presente na discussão dos valores da taxa. Ou eu percebi mal, ou para ele a taxa turística é uma realidade em que só é preciso ser discutido o seu valor.
Eu acho que isto tem a ver com a realidade política e a maioria das nossas Câmaras tem a mesma cor partidária. Coincidentemente, e estou seguro que é apenas uma coincidência, o novo presidente da Região de Turismo é da mesma cor partidária. E, coincidentemente, mais uma vez estou seguro que é apenas uma coincidência, com tanta coisa que ele podia ter falado no seu discurso inaugural, ele falou na taxa turística e não de uma forma depreciativa, dando quase como garantido que ia acontecer. Isto não tem nada a ver com a pessoa em si, tem a ver com a posição que ocupa e com a cor partidária. Vamos imaginar que a taxa turística seria um euro por cliente, significaria que no Inverno uma semana de alojamento ficaria por 14 euros para um casal. Se eu lhe disser que há preços no Algarve a 10 euros por noite, são 70 euros por semana por pessoa, logo os 14 euros equivalem a 20% desse valor.
Recapitulando: não temos voos, temos os turcos e os tunisinos a tirarem-nos clientes diariamente e o que é que nós vamos fazer para nos defender? Vamos agravar o preço de venda ao público, encarecendo ainda mais o nosso produto e aumentando a clivagem entre nós e os outros. Eu não vou entrar em mais pormenores, mas não acredito que vá mudar seja o que for. Acredito apenas que haja boa vontade, mas oxalá que me engane. Também vão haver eleições para a ATA e vamos ver o que vai acontecer. No fim, temos de dar sempre o benefício da dúvida, mas eu não tenho dúvidas nenhumas.
Falou que a solução não deveria passar apenas pela região, talvez seja por isso que a secretária de Estado, na tomada de posse de João Fernandes, afirmou que se encontrava à disposição da RTA?
Eu nunca fui político, mas isso é conversa de político. Uma coisa é aquilo que eles dizem, outra é aquilo que acontece na realidade. Vamos acreditar que até existe essa vontade, mas depois no terreno não é isso que acontece e acaba por valer zero. Eu não tenho conhecimento de que nos últimos dois ou três anos o Algarve tenha tido esse apoio incondicional.
A secretária de Estado referiu que ela e o antigo presidente trabalharam muito bem em equipa.
Sim, uma das coisas que ela criou foi o “Algarve 365”. Na primeira fase que foi lançado, surgiu como um programa de combate à sazonalidade, ou seja, fazer programas de animação no Algarve de maneira a atrair turistas nacionais e internacionais. Como se viu, esse programa serviu para os pseudo-intelectuais regionais ficarem satisfeitos. Por exemplo, uma declamação de poemas de Álvaro de Campos, em Tavira, em português, deixa- me seguro que esse evento promovido em Berlim ou em Liverpool é um êxito. Aliás, o aeroporto que se preparasse porque isso era algo que traria milhares de turistas. Vamos ao que interessa: o Algarve 365 foi um fiasco total e absoluto. Quem o criou no primeiro ano foi um departamento de cultura que fez um departamento para uma minoria intelectual, salvo seja. Aquilo serviu, apenas e só, para satisfazer egos de algumas pessoas. Gastou-se ali um milhão e meio de euros para nada.
O “Algarve 365” deste ano pode estar melhor mas não vejo diferença. Eu sou uma pessoa que lê muito e que está muito atenta e não me parece que haja diferenças. Tanto assim é que no início o programa servia para combater a sazonalidade e depois de todas as críticas, a intenção do “Algarve 365” passou a ser a de servir as gentes no Algarve, para que a animação chegasse a todos os campos da região. Então no início era para trazer turistas e depois era para me fazer feliz? No meu caso, aquilo nem trouxe turistas, nem eu me sinto feliz.
Como prevê que esteja o Turismo no Algarve nos próximos anos?
Temos de olhar para o Algarve e trabalharmos para mudar a situação que temos. Se não fizermos nada para inverter esta situação, em vez do ciclo demorar três anos, demora dez. Eu disse que isto era um ciclo, não disse quanto tempo demorava. Cabe-nos a nós encurtar este ciclo.
Eu gostava de dizer, em 2021, que estamos com uma enorme força, que houve uma requalificação nas estradas e que a A22 já não é taxada. Eu sonho com essas coisas todos os dias. Cabe-nos a nós todos, tanto privados como públicos, tentar falar dentro do possível, em uníssono, tentado evitar coisas como a taxa turística. Isto, com o objectivo de tentarmos encurtar e tornar este período o menos doloroso possível. Acho que é nisso que nos devemos concentrar e acho que essa tem de ser a forma e o único pensamento de todos aqueles que gostam verdadeiramente da nossa região.
Temos consciência que o Algarve vive directamente ou indirectamente do Turismo e que tudo isto está ligado, logo, quero acreditar que haja bom senso e que este prevaleça no sentido de tornarmos o Algarve ainda melhor e mais apetecível a quem nos visita. É para isso que vou continuar a trabalhar e a falar diariamente.
(Maria Simiris / Henrique Dias Freire)