Os agricultores de regadio pediram esta terça-feira que se aproveite melhor a água que o país tem, acreditando haver soluções para a sua escassez no Algarve, região onde as reservas estão em níveis extremamente baixos.
“Há mais alternativas do que aquilo que se fala. Há soluções, e aqui bem perto. Não estamos a necessitar propriamente de trazer água do Minho para o Algarve”, disse à agência Lusa o presidente da Federação Nacional dos Regantes de Portugal (Fenareg), José Núncio.
“No Algarve ainda há margem nas fontes de água superficial, nas águas subterrâneas, nas tecnologias de rega e no aproveitamento das águas residuais tratadas, são soluções que se complementam e podem contribuir para atenuar o grave problema da seca que afeta o abastecimento de água à agricultura e às populações”, salientou José Núncio.
O presidente da federação – que representa cerca de 28 mil agricultores regantes, ou seja, mais de 97% do regadio organizado nacional -, falava à Lusa à margem do Encontro do Regadio 2023: XIV Jornadas da Fenareg, que terminaram esta terça-feira em Alcantarilha, no concelho de Silves.
“Mesmo aqui ao lado […] há potencial para aproveitar águas. Temos um Guadiana que tem água, temos um aquífero que é o segundo aquífero mais importante de Portugal, que também tem possibilidades de exploração”, assegurou, acrescentando que “se há zonas que estão sobre exploradas, outras zonas têm potencial de exploração”.
O Algarve é a região que enfrenta o maior problema de falta de água no país, com as reservas hídricas das albufeiras dos aproveitamentos hidroagrícolas da Bravura (08%) e do Arade (15%), no barlavento (oeste) algarvio, em níveis extremamente baixos.
O presidente dos regantes portugueses pede que se “olhe para todas as soluções”, porque “não há uma única solução”, mas sim “um ‘mix’ de soluções”, defendendo que terá de haver “soluções de reserva para situações muito drásticas”.
“Temos de estudar caso a caso (…) não nos podemos queixar, [a água] pode estar mal distribuída, mas Portugal tem água, tem muita água e temos é que ter a capacidade de conseguir geri-la e utilizá-la”, disse José Núncio no final do encontro de dois dias.
Na mesa-redonda que decorreu no primeiro dia da reunião foram debatidas soluções para o regadio em tempos de escassez, nomeadamente, nas águas superficiais e a perspetiva do aumento da capacidade de armazenamento.
Quanto às águas subterrâneas, foram discutidas estratégias para a recarga dos aquíferos, assim como a rega com águas para reutilização e a utilização da rega deficitária.
A construção de novas albufeiras ou o transvase de caudais de água do Norte para o Sul do país foram outras possíveis soluções para o problema crónico da falta de água no Algarve que foram referidos durante a reunião.
Presente na sessão de encerramento do encontro da Fenareg, o secretário de Estado da Agricultura do Governo em gestão desde sexta-feira, Gonçalo Rodrigues, afirmou que “o caminho tem que continuar a ser percorrido”.
O responsável governamental sublinhou “o trabalho continuado” do executivo “na tentativa de encontrar soluções e dar resposta às necessidades dos regantes, tentar dar cumprimento às suas expectativas e tentar encontrar soluções”.
Agricultores podem enfrentar novas restrições no acesso à água
As albufeiras dos aproveitamentos hidroagrícolas da região encontram-se em mínimos históricos e os agricultores podem enfrentar novas restrições no acesso à água na próxima campanha de rega.
“Na Barragem do Arade estamos praticamente no volume morto, à data de hoje, a água que temos dá apenas para um mês, não é suficiente para assegurar a próxima campanha de rega”, revelou João Garcia, presidente do Aproveitamento Hidroagrícola de Silves, Lagoa e Portimão.
Para fazer face à escassez hídrica no Algarve está em preparação o Pacto Regional para a Água, que complementará o Plano de Eficiência Hídrica do Algarve e inclui propostas dos setores agrícola, urbano e do turismo.
Na mesa-redonda das Jornadas, regantes e académicos apresentaram soluções para o regadio em tempo de escassez de água. António Carmona Rodrigues, antigo ministro do Ambiente, especialista em hidráulica e professor da Universidade Nova de Lisboa, defendeu o recurso a fontes de água superficiais, considerando vital para a região do Algarve a concretização dos projetos da Ribeira Foupana e a captação de água do Pomarão para reforço da capacidade de armazenamento existente nas albufeiras de Odeleite/Beliche.
José Paulo Monteiro, especialista em hidráulica e professor da Universidade do Algarve (UAlg), referiu que existem, na região, aquíferos com capacidade de ser explorados e que a sua recarga artificial também poderá ser uma alternativa. Manuela Moreira da Silva, bióloga e também professora na UAlg, defendeu o uso de águas residuais tratadas na rega de campos de golfe e pomares, revelando que o Algarve reutiliza apenas 3,7% da água residual tratada na região. Já Anabela Fernandes Silva, especialista em agronomia e professora da Universidade de Trás-os-Montes, referiu a adoção de estratégias de rega deficitária, que implicam regar com menos água em determinadas fases do ciclo fenológico das culturas.
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