O acorrentamento de cães não está diretamente previsto na legislação portuguesa de proteção animal, no entanto, a situação em que se encontram os animais acorrentados constitui violação de uma ou mais das seguintes disposições do Decreto-Lei nº 276/2001 de 17 de Outubro (com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 315/2003 de 17 de Dezembro), por não permitir a liberdade de movimentos e a prática de exercício físico e ainda constituir um perigo de enforcamento:
Artigo 7.º
1 – As condições de detenção e de alojamento para reprodução, criação, manutenção e acomodação dos animais de companhia devem salvaguardar os seus parâmetros de bem-estar animal.
Artigo 8.º:
1 – Os animais devem dispor do espaço adequado às suas necessidades fisiológicas e etológicas, devendo o mesmo permitir:
- a) A prática de exercício físico adequado;
- b) A fuga e refúgio de animais sujeitos a agressão por parte de outros.
O acorrentamento de animais de companhia, sobretudo de cães, é um fenómeno observável em todo o território português, rural e urbano, que tem merecido a atenção cada vez maior de cidadãos e instituições, sendo disso exemplo a seguinte recomendação.
Em Janeiro de 2016, a Provedora dos Animais de Lisboa, no âmbito da sua missão e das competências do seu cargo, recomenda à Câmara Municipal de Lisboa a proibição da detenção de animais acorrentados, a partir da fundamentação contida no parecer emitido pela OMV (Ordem dos Médicos Veterinários) da análise de casos concretos, alvos de denúncia à Provedoria, que aponta para a suscetibilidade do acorrentamento causar lesões e de infligir dor e sofrimento (físico e emocional) a animais e, assim, comprometer o seu bem-estar.
A OMV refere que a presença de correntes poderá criar lesões que poderão ir de contusões a abrasões e que, ao controlarem os animais por uma coleira no pescoço, local onde passam importantes vasos sanguíneos, faringe, laringe, traqueia, esófago, tiroide, são responsáveis por lesionar todas estas estruturas.[1]
A desinformação dos tutores sobre os riscos e as consequências físicas e psicológicas do acorrentamento animal, sobretudo de cães, constitui um dos principais motivos que subjazem a essa prática, para além das dificuldades económicas para a criação de um espaço livre de correntes e ainda a aspetos como hábitos ou costumes, passados de geração em geração.
Consciente do incontável número de animais acorrentados em Portugal, o Movimento Quebr’a Corrente surgiu com a missão de apoiar o fim do acorrentamento, através da libertação, sobretudo de cães, em áreas exteriores vedadas, junto à habitação dos tutores, e promover, junto destes, conhecimento sobre bem-estar animal que inverta a perspetiva unicamente utilitarista dos animais como os “guardas” da casa, mantidos em inobservância com os requisitos mínimos de alojamento previstos na legislação de proteção animal.
Assente em princípios de não violência e prosseguindo uma ação livre de julgamentos, o Quebr’a Corrente dirige o seu trabalho a animais, a tutores e à comunidade no geral, na perspetiva de contribuir de forma integrada para a promoção de comunidades mais desenvolvidas, nas quais animais e tutores mais informados, interagem numa relação saudável e respeitadora.
Fazem parte do Movimento mais de uma centena de ativistas da causa animal, voluntários e apoiantes, de norte a sul de Portugal, tendo já sido desacorrentados mais de 20 cães em colaboração com os tutores, para quem as correntes não voltarão a ser uma opção.
[1] Excerto retirado do Parecer da Ordem dos Médicos Veterinários sobre os efeitos físicos e emocionais resultantes do acorrentamento de animais de companhia, citado pela Provedoria dos Animais de Lisboa na Recomendação n.º 3/2016, emitida em Janeiro de 2016, sobre este tema.