“As sociedades são conduzidas pela sua tecnologia, mas são definidas pela sua humanidade.” (Gerd Leonhard)
Hoje em dia somos, de facto, conduzidos pela tecnologia sem a qual nos sentimos isolados ou perdidos. Através da tecnologia e dos meios de comunicação social chegam-nos, entre milhares de imagens, novas palavras que passaram a fazer parte do nosso novo vocabulário covídico!
Agora a palavra do dia tem sido “desconfinamento”, depois de há cerca de dois meses o “confinamento” ter sido a palavra, provavelmente, mais pronunciada.
As palavras têm muito peso em nós, ainda que inconscientemente. O substantivo confinamento, é muito redutor. Poderíamos usar a designação recolhimento, até porque é uma palavra à qual associamos um tempo de introspecção e reflexão.
Experimentem dizer “estou recolhido/a” e a seguir dizer “estou confinado/a”. Há uma sensação diferente ao dizer uma ou outra palavra. Ao sentir que estamos recolhidos, associamos a essa palavra algum sentido de liberdade de pensamento, de retiro e auto-encontro e até a sensação de opção. Por sua vez, quando se diz “estou confinado/a” não temos a sensação de liberdade ou de opção, porque a palavra soa a obrigação, a limitação e soa a “finado”!
Se pensarmos que não estamos confinados em casa, mas estamos em casa por solidariedade, por respeito pelo futuro de todos nós, acabamos por sentir que é um recolhimento responsável e um recolhimento solidário.
Outra palavra que se usa muito é “higiénico”, como se não bastasse a corrida ao papel higiénico no início desta pandemia, ainda temos de ouvir essa palavra associada aos passeios! Quando muito os passeios são terapêuticos. Saímos para apanhar sol, o que é excelente para obter vitamina D e para fazer exercício físico. Andar ao sol a fazer exercício é mais uma terapia do que uma higiene!
A tecnologia é um facilitador e responde às nossas necessidades
Temos a tecnologia ao dispor e ela aproximam-nos dos outros. Passamos parte do dia a comunicar ou consultar redes sociais, a atender telefonemas, a escrever e responder a sms’s, a escrever e-mails, a receber e partilhar vídeos e a ler jornais digitais.
Por exemplo, as reuniões através do Zoom, Skype ou Teamsvêm mudar a forma de estar em equipa. E há um detalhe muito interessante: as reuniões começam sempre a horas e intervém uma pessoa de cada vez, o que não acontece assim tanto nas reuniões presenciais.
Acredito que depois da situação de pandemia estar mais controlada, muitas empresas e entidades públicas continuarão a utilizar esta forma de reunir. Para além da redução de custos com deslocações, permite mais foco e atenção durante as reuniões.
Estamos digitalmente mais experientes e esta tendência cada vez mais se reflecte nos nossos hábitos, como por exemplo nas compras online e na leitura do jornal online.
Com tudo o que foi referido, e graças à internet e aos telefones, creio que nós não estamos socialmente isolados. Imaginem como terá sido com a pandemia de há 100 anos, em que não havia internet, nem telemóveis. Isso sim, foi isolamento social.
Na semana passada participei num encontro de escritores através da plataforma Zoom e foi fantástica a partilha, de certeza que durante aquela hora ninguém se sentiu socialmente isolado.
O ser humano é um ser social, mas essa vertente, nesta fase, tem sido colmatada, tal como referi, com o acesso às novas tecnologias a partir de nossas casas.
O ser humano é igualmente um ser de contacto físico e talvez essa ausência seja mais estranha nesta altura.
Se alguém está triste, podemos dizer-lhe muitas palavras empáticas, mas um abraço caloroso e atencioso será muito mais eficaz. É certo que agora não são recomendados abraços, no entanto há novas formas de sermos presença, de sermos solidários, de sermos esse abraço, que apesar de intocado nos torna mais humanos.
Têm razão aqueles que defendem que a vida nunca mais será a mesma depois desta pandemia. Começamos a fazer cenários, a recordar filmes de ficção científica, mas não sabemos ainda para onde estamos a caminhar. É isso o futuro, o desconhecido, o incerto. No entanto, uma coisa é certa, dependeremos, daqui para diante, mais uns dos outros do que alguma vez teremos dependido.
Já estamos a experimentar essa mudança e está a ser muito rápida. Apesar da semelhança entre o que há décadas era ficção e hoje vai sendo realidade, existe em nós a esperança de um mundo melhor.
Gerd Leonhard refere que os próximos 20 anos irão trazer mais mudança do que os últimos 300 anos e a ficção científica irá dar lugar à realidade científica.
Fiquemos seguros e atentos aos próximos capítulos da humanidade!
(Artigo publicado no Caderno Cultura.Sul de maio)