Nos últimos tempos, circula nas redes sociais um vídeo viral que promete revelar um truque “secreto” para recarregar pilhas gastas utilizando água a ferver. Segundo o vídeo, bastaria mergulhar as pilhas num recipiente de água quente por um minuto e, em seguida, colocá-las em água fria para que voltassem a funcionar. Com mais de um milhão de visualizações, o vídeo gerou curiosidade, mas também levantou preocupações quanto à segurança e eficácia do método. Será que este truque realmente funciona? E, mais importante, é seguro?
O truque explicado
O vídeo inicia-se com a demonstração de várias pilhas aparentemente gastas. Para comprovar que estão descarregadas, duas pilhas são colocadas numa balança portátil, que não liga. O narrador então apresenta a solução: colocar as pilhas em água a ferver durante um minuto e depois mergulhá-las em água com gelo para arrefecer rapidamente. O passo final consiste em secá-las bem e colocá-las de volta no aparelho, que desta vez funciona. O vídeo sugere que este “truque” pode recuperar as pilhas velhas e prolongar o seu uso, mesmo que não sejam recarregáveis.
Mas funciona mesmo?
A primeira dúvida surge ainda antes de se avançar com a análise científica: no início do vídeo, as pilhas são inseridas com os pólos positivos virados para baixo, e no final, estão virados para cima. Este detalhe pode explicar, por si só, porque é que a balança não funcionava no início. Além disso, este processo levanta questões sobre a sua eficácia e segurança.
Helena Braga, investigadora e professora da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), foi questionada pelo Polígrafo sobre este método. Segundo a especialista, colocar pilhas em água a ferver não as “recarrega”. O que pode acontecer é que “com o calor, alguns produtos espúrios acumulados nas interfaces dos elétrodos com o eletrólito são libertados”, o que pode, temporariamente, fazer com que a pilha volte a funcionar. No entanto, esse efeito será de curta duração e não representa uma recarga verdadeira.
Helena Braga esclarece ainda que “as baterias primárias (não recarregáveis) não são todas iguais” e que diferentes tipos de baterias reagem de maneiras distintas a elevadas temperaturas. Baterias de Níquel-cádmio, por exemplo, podem suportar temperaturas até 60ºC, mas as de ião de lítio (Li-ion) não devem ser expostas a mais de 45ºC. Colocar uma pilha a ferver, a 100ºC, por um minuto, pode não só danificá-la como também apresentar riscos sérios.
Os perigos associados
A prática de ferver pilhas pode representar um risco significativo. Pilhas degradadas ou com danos internos podem liberar substâncias perigosas, como ácidos ou substâncias alcalinas, ambos altamente nocivos. No caso das pilhas de ião de lítio, há ainda o risco de explosão, especialmente se estiverem danificadas internamente, criando curtos-circuitos e libertando oxigénio, o que pode levar a reações químicas violentas.
Helena Braga alerta para os perigos desta prática: “As baterias podem babar substâncias ácidas ou alcalinas, ambas muito perigosas, e as baterias de ião-Li podem explodir”. Por esta razão, a especialista classifica este método como “uma má ideia”, sublinhando os riscos que pode representar tanto para a segurança das baterias como para quem as manuseia.
Embora o vídeo viral possa sugerir que este método é uma solução fácil e económica para reutilizar pilhas gastas, a realidade é que ferver pilhas não as recarrega e pode, na verdade, ser extremamente perigoso. O “extra” que pode ser conseguido ao aplicar calor nas pilhas gastas é mínimo e temporário, não justificando os riscos envolvidos. Além disso, este processo pode danificar permanentemente as pilhas e expor os utilizadores a substâncias tóxicas ou até mesmo a explosões.
A segurança e a eficácia devem sempre ser prioridade quando se lida com baterias. Se tem pilhas gastas, a solução mais segura continua a ser descartá-las corretamente em locais de recolha de resíduos perigosos e adquirir novas.
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