O século XV assistiu ao primeiro desígnio de globalização comercial da Era Moderna. Na sua essência, o projecto foi concretizado por mareantes algarvios que, experimentados na navegação, e aproveitando a conjuntura favorável nas relações com os países da fachada atlântica europeia, exploraram novas rotas comerciais, progredindo para Sul ao longo da costa africana, havendo de englobar as ilhas atlânticas da Macaronésia (Canárias, Açores, Madeira e Cabo Verde). Para o êxito desse movimento foi fundamental o impulso financeiro e político do Infante Dom Henrique, que – sendo dele o maior beneficiário – seria reconhecido pelas vicissitudes da história e a manipulação da memória das pessoas como o grande herói dessa conjuntura sociohistórica.
A abertura a um mundo novo (na visão ocidental) congrega o início de um comércio internacional, tendo como veículo principal o mar-oceano; uma nova etapa de desenvolvimento económico; uma nova geografia e conhecimento étnico; o encontro e miscigenação de culturas; o pioneirismo, o desenvolvimento da náutica e da navegação; a queda de barreiras físicas e mentais; o contacto com comunidades até então só imaginadas e fantasiadas; uma nova organização social e administrativa; novas arquitecturas (religiosas e defensivas) e manifestações artísticas.
Em 2015, a Região de Turismo do Algarve em parceria com a Direção Regional de Cultura, alguns Municípios do Algarve e as Direções Regionais da Cultura da Madeira e Açores, submeteram à Comissão Nacional da UNESCO a candidatura “Lugares de Globalização”, que levou à inscrição de uma rede de lugares na Lista Indicativa de Portugal a Património Mundial. A partir de uma herança comum em torno das rotas dessa Globalização da Era Moderna, pretende-se promover o intercâmbio cultural entre povos e contribuir para o diálogo entre culturas. Os “Lugares de Globalização” integram um conjunto de bens culturais que constituem: pontos de referência, material e imaterial, associados a acontecimentos relevantes (Sagres, Raposeira, Lagos), obras com mérito arquitectónico (alcáçova e antiga Sé de Silves), dispositivos de produção (engenhos de açúcar de Silves e Machico, salinas de Lagos), núcleos urbanos antigos (Lagos, Silves, Funchal, Machico, Angra, Vila Franca do Campo, Ponta Delgada), lugares de memória do tráfico negreiro (Lagos) com vários elementos e estruturas de natureza arqueológica. São lugares repletos de nomes, de experiências, de narrativas, densos em histórias, de tempos e de sentidos, com uma espessura antropológica de pessoas concretas e memórias associadas à fase de lançamento desse processo, que se querem integrados numa rede internacional, nela incluindo lugares como Ceuta, Alcácer Seguer, Arguim, Cidade Velha.
A Semana Cultural – Lugares de Globalização resulta de uma parceria constituída pela Vicentina – Associação para o Desenvolvimento do Sudoeste, Direção Regional de Cultura do Algarve, os Municípios de Lagos, Vila do Bispo, Aljezur, Monchique, Silves e a Região de Turismo do Algarve, que constitui um incentivo ao desenvolvimento das acções necessárias à concretização do desiderato de inscrição da rede na Lista do Património Mundial da UNESCO. Com financiamento do CRESC Algarve 2020 e três edições previstas – a primeira das quais ocorrerá entre 16 e 23 de Março com um vasto e diversificado programa cultural –, este projecto vai ser apresentado publicamente no próximo dia 24 de Janeiro em Sagres.
(Artigo publicado no Caderno Cultura.Sul de Janeiro)