Durante seis semanas e até ao passado sábado decorreu um curso de empreita no Palácio Gama Lobo – palacete do século XVIII recuperado pela autarquia para alojar a sede do Loulé Criativo -, onde a Lusa falou com artesãs e formandas.
Devidamente espalhadas pela sala, respeitando a distância social imposta pela pandemia de covid-19, uma dúzia de mulheres praticam ou ensinam a arte da empreita. Nas suas mãos vão nascendo peças de diversas formas e funções mas tendo sempre como base a palma, as folhas da palmeira anã.
Eugénia Duarte nasceu a ver os familiares a fazer empreita nos “serões lá em casa”, mas “o praticar ficou sempre para depois”. A pré-reforma e o curso do Loulé Criativo deram-lhe a oportunidade para dar largas à sua criatividade e meter as mãos na palma para criar novas peças.
“Levo daqui as técnicas, vou para casa e desenvolvo-as, praticando e procurando um produto que possa ser útil”, confidencia a bancária de 56 anos.
Durante muitos anos a arte da palma era praticada ao serão “por quem precisava de mais uns tostões”, por isso o valor pago por cada peça “era muito baixo” e há a necessidade de “atualizar as peças”, destaca.
Numa mesa ao seu lado estão um candeeiro, um guarda-joias, uma base de fruta e um marcador para pratos desenvolvidos ao longo da formação, para além de uma mochila que elaborou como trabalho final, a partir de um molde em papel de jornal “feito durante a noite”.
Odete Rocha é, aos 65 anos, uma das mestres artesãs que aceitou partilhar o seu saber, tanto neste curso como na Casa da Empreita, espaço criado em 2017 na zona histórica de Loulé inteiramente dedicado aos trabalhos em palma, com loja e oficina com trabalho ao vivo.
Foi aos oito anos que aprendeu a arte “com uma vizinha”, à qual juntou o esparto, a ráfia, a cana e se estabeleceu como artesã. Mostra agora “satisfação” por ver estas artes perdurarem já que há “novas pessoas a quererem aprender”.
Do outro lado da sala está Maria João, de 40 anos, uma das formandas mais novas do grupo. Das suas mãos viu nascer uma peça com a folha ainda verde, porque a cor “encantou”, mas rapidamente ficou a saber que “irá perder a cor”, porque a folha ainda não foi tratada: “Uma das coisas que aprendi”, graceja.
“É algo que quero continuar. Daqui, vamos continuar na Casa da Empreita, onde posso aprender mais um pouco e depois vamos ver” afirma, enquanto coze mais uma trança de empreita para que a peça vá ganhando forma.
Teresa Mascarenhas e Patrícia Rita são funcionárias do Loulé Criativo, responsáveis pela organização do curso e revelam que o objetivo é “manter viva a arte”, aumentar o número de artesãs na Casa da Empreita e “baixar a média de idades”, já que mais nova ronda os 60 anos e a mais idosa tem 85.
“As pessoas vinham a Loulé à procura de empreita, porque era associada à cidade e muitas vezes saíam com peças marroquinas a achar que estavam a comprar produto nacional”, lamentam.
Abriram apenas “oito vagas” para o curso que decorreu durante seis fins de semanas, mas para o qual receberam “mais de 30 inscrições”, para além dos contactos posteriores para “novos cursos”, que garantem estarem a ser equacionados para o “início do próximo ano”.
A valorização dos produtos é outra das preocupações de quem pretende valorizar a arte de empreita e algo que tem norteado a vida da artesã Sónia Mendes, agora também formadora.
Com 59 anos, conta que aprendeu a arte da empreita aos oito, tendo decidido aos 17 “fazer dela profissão”, mas numa luta constante para que “as pessoas percebam que têm de valorizar as suas peças”.
Para exemplo escolhe a alcofa, peça que pode levar “umas oito, dez horas a fazer”, mas que era vendida “a dez euros”. Hoje em dia, na Casa da Empreita, o preço já ronda os “35 ou 50 euros”, realça.
“É uma peça única, amiga do ambiente e que dura. Tenho alcofas com 40 anos”, sustenta.
Sónia revela que sempre procurou “abraçar projetos fora da caixa” e que o convite para ingressar neste projeto, foi a “cereja no topo do bolo”.
“Estamos no bom caminho. Já há pessoas que aparecem e vão entendendo que é possível fazer alguma coisa com isto, misturar esta técnica com outros materiais. Estou mais otimista”, confessa.
O Loulé Criativo é um projeto municipal que apoia a formação e atividade de artesãos e profissionais do setor criativo, contribuindo para a revitalização das artes tradicionais e para dinamização de novas abordagens ao património imaterial.