A conveniência e eficiência das casas inteligentes são amplamente elogiadas, mas um novo estudo suscita preocupações significativas sobre a privacidade dos utilizadores dessas tecnologias. A nossa casa está cada vez mais equipada com dispositivos inteligentes que se comunicam entre si e com o mundo exterior, mas o que acontece com os dados que estes dispositivos recolhem?
De acordo com um estudo conduzido por várias universidades e centros de pesquisa, os equipamentos inteligentes das nossas casas podem recolher informações sensíveis sem o conhecimento dos utilizadores, expondo as famílias a riscos significativos de privacidade. A invasão da privacidade é uma das principais preocupações levantadas pelo estudo, partilhado pela Sapo, que destaca a facilidade com que informações pessoais podem ser obtidas através desses equipamentos.
“Um dos maiores problemas é a invasão de privacidade”, reconheceu David Choffnes, professor da Northeastern University (Boston, Estados Unidos), coautor do estudo. “Essas fraquezas dão aos invasores uma ideia clara do que há em sua casa, quem está lá e também quando e para onde estão a mover-se. Descobrimos que algumas aplicações aproveitam isso para recolher dados de residências, para fins que nada têm a ver com a sua função. Se as nossas casas são o local mais privado, parece-me uma grave invasão de privacidade”, acrescentou.
Os investigadores montaram um “laboratório de apartamento” com mais de 100 equipamentos. O estudo investigou as ligações entre os dispositivos e as apps que os gerem, bem como as apps nos smartphones dos utilizadores que interagem com os equipamentos. A análise revelou que as informações transmitidas variavam desde endereços únicos de dispositivos até detalhes como números de série, versões de protocolos vulneráveis e nomes de dispositivos específicos.
“Não creio que as pessoas tenham a menor ideia de que todos os dispositivos conectados ao Wi-Fi conversam entre si de alguma forma. E isso tem implicações”, afirmou Juan Tapiador, professor da Universidade Carlos III, em Espanha, coautor do estudo.
Estas informações podem permitir que terceiros obtenham uma visão detalhada da vida de uma família, desde hábitos de movimentação até informações financeiras. Os dados podem ser usados para criar perfis de utilizadores, direcionar publicidade personalizada e, em alguns casos, rastrear as atividades e relacionamentos dos utilizadores.
“A exposição dessas informações sem controlo permite que serviços de publicidade ou aplicações criem uma impressão digital da sua casa que a identifique exclusivamente ou possa inferir o seu nível de rendimento e hábitos.”, denunciou Narseo Vallina-Rodríguez, investigador da Imdea Networks e coautor.
Os utilizadores geralmente subestimam o risco envolvido na recolha destas informações técnicas, muitas das quais ocorrem sem o consentimento explícito dos utilizadores. “Uma das coisas que foi mais difícil entendermos é o valor informativo dos dados técnicos”, afirmou Juan Tapiador
O nome da rede Wi-Fi (SSID) do router pode ser usado para identificar a localização de um utilizador, e o acto de conectar-se a uma rede Wi-Fi partilhada pode revelar informações sobre a proximidade física com outros utilizadores. “Existem muitos serviços online que fornecem informações de geolocalização com base nesse nome”, disse Juan.
“Se um ator malicioso abusa da informação que flutua livremente nas redes domésticas inteligentes que podem rastrear um utilizador em dispositivos de vários fornecedores: por exemplo, se uma aplicação maliciosa recolher impressões digitais de casas inteligentes de vários utilizadores, e alguns deles visitarem a casa de um dos utilizadores, digamos Juan, com o seu telefone, a aplicação poderá inferir as relações sociais e os horários do utilizador Juan continuamente.”, referiu Vijay Prakash, investigador da universidade de Nova Iorque e também coautor do estudo.
O estudo também realça a falta de regulamentação nessa área e a necessidade de os utilizadores estarem mais conscientes dos riscos de segurança relacionados com dispositivos inteligentes.
Embora muitos destes cenários levantem questões legais, o ambiente Android, por exemplo, carece de regulamentação rigorosa, o que permite que essas práticas ocorram sem o conhecimento dos utilizadores.
O estudo destaca a necessidade de regulamentação mais rigorosa e da conscientização dos utilizadores sobre a importância da privacidade em um mundo cada vez mais conectado. A era das casas inteligentes pode oferecer inúmeras vantagens, mas a proteção da privacidade dos utilizadores deve ser uma prioridade.
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