Duas empresas agrícolas na freguesia de Longueira-Almograve, no concelho de Odemira (Beja), que tem uma cerca sanitária devido à pandemia de covid-19, têm parte da produção comprometida, por falta de mão de obra para as colheitas.
“Vamos perder produção. Mesmo que levantem a cerca na quinta-feira, ficamos só com um terço da produção. Não vai pagar os custos”, lamentou hoje Susana Prado, da empresa Sousa Prado & Filhos, em declarações à agência Lusa.
Na quinta-feira, em Conselho de Ministros, o Governo decidiu que a cerca sanitária, em vigor desde dia 30 de abril, nas freguesias de São Teotónio e Longueira-Almograve vai manter-se, devido à elevada incidência de casos de covid-19, mas definiu “condições específicas de acesso ao trabalho”.
A entrada nas duas freguesias para o “exercício de atividades profissionais” e para o “apoio a idosos, incapacitados ou dependentes e por razões de saúde ou por razões humanitárias” depende da apresentação de comprovativo de teste PCR negativo realizado nas 72 horas anteriores ou de teste rápido antigénio negativo realizado nas 24 horas anteriores, segundo um despacho publicado, na sexta-feira à noite, em Diário da República.
A saída das duas freguesias pelos mesmos motivos depende também de apresentação de novo teste rápido de antigénio com resultado negativo, realizado nas 24 horas anteriores, de acordo com o mesmo despacho.
Segundo a empresária, a Sousa Prado & Filhos iniciou a colheita da sua produção de ervilhas em 100 hectares, na segunda-feira, com cerca de duas semanas de atraso e apenas com “uma pequena parte” dos trabalhadores.
O início da cerca sanitária, disse, coincidiu com “o pico da colheita” e a empresa foi obrigada a adiar o arranque dos trabalhos, uma vez que, nessa altura, “os trabalhadores que vivem fora da cerca foram impedidos de passar”.
“Na sexta-feira à noite, chegou o novo despacho [do Governo] com as novas condições para acesso dos trabalhadores, mas só ontem [segunda-feira] à tarde, com uma parte pequena dos nossos trabalhadores, é que conseguimos começar a colheita”, adiantou.
Agora, com as “novas condições”, frisou Susana Prado, a empresa deparou-se com “dificuldades” para colocar na sua exploração as “120 a 150 pessoas” de que precisa diariamente para a colheita, porque “os centros de testagem não têm capacidade para tanta gente”.
Além disso, acrescentou, a empresa para “ter as pessoas todas a trabalhar e salvar ainda a produção” tinha de gastar mais de 10 mil euros numa semana”.
“Temos feito a colheita com as poucas pessoas que conseguem passar” a cerca sanitária, sublinhou Susana Prado, precisando que a empresa tem “45 trabalhadores efetivos”, mas precisa de “outras cento e tal pessoas para serviços temporários”.
A empresária mostrou-se preocupada com a possibilidade de a Sousa Prado & Filhos perder clientes, sustentando que os contratos e os prazos não estão a ser cumpridos.
“Fizemos investimentos em câmaras de frio e aumentámos as instalações. Isso vai ter que ser pago e deveria começar a ser pago com a receita desta colheita”, salientou.
A Sousa Prado & Filhos é uma empresa familiar que se dedica à produção de ervilhas, milho e plantas ornamentais para exportar para a Dinamarca, Inglaterra, França e Holanda.
Também a The Summer Berry Company, que produz mirtilo, framboesas e amoras, sobretudo, para exportação, numa área de cultivo com 80 hectares, enfrenta dificuldades em ter trabalhadores que residem fora da cerca sanitária, disse à Lusa Daniel Portelo, diretor de operações desta empresa inglesa.
“Durante a semana passada, não puderam vir trabalhar cerca de 20% dos nossos colaboradores”, o que corresponde a “cerca de 50 trabalhadores”, sem incluir os elementos da gestão e agrónomos, frisou.
De acordo com o responsável, a situação provocou um “atraso na colheita e, consequentemente, desperdício alimentar e perdas de produtividade”, além de “grande parte” da restante operação estar “comprometida”.
“Para minimizar as perdas imediatas, nomeadamente não termos capacidade para colher a fruta, acabámos por deixar as restantes operações para segundo plano”, mas “são operações que vamos ter recuperar”, sublinhou.
Daniel Portelo deu como exemplo o adiamento de plantações, que comprometeu “os programas de produção para a campanha de outono”, correndo a empresa o risco de ter a sua produção “coincidente com a de outros mercados”.
“Espanha e Marrocos produzem no outono um pouco mais tarde do que nós e, claro, que isso compromete preços e produtividade”, salientou.
Quanto ao desperdício resultante da falta de capacidade para a colheita, o diretor de operações da The Summer Berry estimou que a percentagem “deverá ter aumentado 15% a 20%”, desde que a cerca foi decretada.
“E, provavelmente, irá continuar durante a próxima semana, porque é difícil acompanhar os campos quando se deixam tarefas para trás”, acrescentou.