Este verão, como em todos os outros, tenho ido a algumas festividades locais dinamizadas por grupos ou pessoas individuais que dão som e entretenimento às pessoas presentes. Contudo, de alguns anos a esta parte, o som da “música” é ensurdecedor, não se consegue conversar com ninguém porque não nos ouvimos, o peito bate ao ritmo das colunas do som, saímos desses ajuntamentos com dor de cabeça devido ao ruído. Ora, esses eventos deveriam servir para as pessoas conviverem, não é o que acontece actualmente, claro que só está lá quem quer. Creio que é impossível alguém, que viva nas imediações, descansar à noite, para não falar também nas pessoas doentes.
O Decreto-Lei 9/2007 aprovou o Regulamento Geral do Ruído, que no art.1º “estabelece o regime de prevenção e controlo da poluição sonora, visando a salvaguarda da saúde humana e o bem-estar das populações.” E no art. 2º diz que “aplica-se às actividades ruidosas permanentes e temporárias” como sejam “Espectáculos, diversões, manifestações desportivas, feiras e mercados;” e estabelece os níveis de ruído a que as pessoas podem estar sujeitas.
Consultei um estudo, da ANA – Aeroportos, publicado em 2017 o qual refere os níveis de ruído e as consequências para as pessoas, conforme a figura junta.
No mesmo estudo pode ler-se:
“Para a Organização Mundial de Saúde (1993) o limiar da incomodidade para ruído contínuo situa-se em cerca de 50 dBA, LAeq diurno, e poucas pessoas são realmente incomodadas por valores até 55 dBA. No período noturno os níveis sonoros devem situar-se 5 a 10 dBA abaixo dos valores diurnos para garantir um ambiente sonoro equilibrado.
Já para a Organização de Cooperação e desenvolvimento Económico (1990), para LAeq diurno, valores a partir de 65 dBA são inaceitáveis – “pontos negros” de ruído e níveis sonoros entre 55 e 65 dBA não asseguram conforto acústico aos residentes – “zonas cinzentas”.”
Aquela entidade afirma que a partir de 65 decibéis é um ruído inaceitável e na tabela podemos ver que a partir de 100 decibéis é perigoso e a partir de 120 é doloroso. Não é por acaso que os funcionários nas pistas dos aeroportos andam com auriculares protectores.
A Câmara Municipal de Tavira define no PDM que as zonas de ruído são classificadas de “Mistas”, cujo limite máximo de ruído à noite é de 55 db, estabelecido pela Agência Portuguesa do Ambiente. Não consultei o PDM de outros municípios porque não pretendi fazer uma análise comparativa.
Como não gosto de falar por falar, adquiri um decibelimetro, medi o ruído em alguns eventos e resumi os resultados na tabela seguinte.
Medi o som ambiente antes do dinamizador musical começar a actuar e em dois momentos após o início da actuação.
Como se pode ver, os valores estão muito acima do que está definido por lei. Refiro que verifiquei picos de som superiores aos máximos registados. Com estes níveis sonoros não se consegue conversar, ainda que seja em voz alta.
Saliento que nas medições do som em Santo Estêvão durante a actuação dos ranchos folclóricos as pessoas presentes podiam conversar e pareciam estar agradadas.
A amostra de resultados é pequena e serve apenas para ilustrar o meu desconforto em tais eventos.
Recordo que o Regulamento Geral do Ruído estabelece que “Atividades ruidosas temporárias – são proibidas na proximidade de:
- Habitações, aos sábados, domingos e feriados e nos dias úteis das 20 às 8 horas;
- Escolas durante o período de funcionamento;
- Hospitais e estabelecimentos similares;”
Não são necessárias mais leis ou regulamentos, basta cumprir (sem ser à risca) o conjunto normativo já existente. As entidades legalmente obrigadas a fazer cumprir a lei deviam exercer o seu poder, critico muito especialmente a falta de bom-senso e sentido cívico social dos dinamizadores e organizadores dos eventos que não mostram ter qualquer consciência acerca deste assunto.
* Licenciado em Economia pelo ISEG – Lisboa;
Mestre em Educação de Adultos e Desenvolvimento Comunitário pela U. Sevilha;
Professor aposentado.