O primeiro-ministro disse ter estranhado a colaboração da GNR de Loulé na recuperação das armas de Tancos “devido à distância” com o local da operação, mas admitiu poder tratar-se de uma operação conjunta em diversas localidades.
Esta é uma das 100 respostas de Antonio Costa ao juiz de instrução Carlos Alexandre sobre o processo de Tancos, num depoimento escrito entregue no tribunal a que a Lusa teve acesso.
Carlos Alexandre quis saber se o primeiro-ministro “estranhou, no comunicado, a PJM [Polícia Judiaria Militar] informar que tinha tido a colaboração do Núcleo de Investigação Criminal da GNR de Loulé, na recuperação do material”.
A esta pergunta António Costa respondeu: “Estranhei, tendo em conta a distância entre Loulé e o local da operação. No entanto, admiti que resultasse de uma operação que decorrera em diversas localidades, no âmbito da cooperação que deve existir entre órgãos de polícia criminal”.
O primeiro-ministro disse também que tomou conhecimento pelo comunicado da PJM de que a GNR de Loulé tinha colaborado na operação, não tendo relacionado esta informação com o comunicado da Procuradoria-Geral da República (PGR) de 04 de julho de 2017 que determinava que o processo-crime onde se investigava o assalto a Tancos passava a ser da “titularidade do DCIAP [Departamento Central de Investigação e Ação Penal]”.
Referindo que o comunicado da PJM não lhe suscitou perplexidades, António Costa refere que este “não permitia supor que a recuperação não tinha sido efetuada no quadro da colaboração institucional a que a PJM estava vinculada”.
No depoimento escrito o chefe do Governo refere também que teve conhecimento da recuperação do material militar na Chamusca no próprio dia, a 18 de outubro de 2017, através de um contacto telefónico do então ministro da Defesa Nacional (MDN)
“Soube pelo MDN que nessa madrugada a PJM recuperou, na região da Chamusca, o material militar furtado dos Paióis Nacional de Tancos. Soube também que o material recuperado já se encontrava nos Paióis de Santa Margarida, à guarda do Exército, onde estava a ser realizada a peritagem para identificação mais detalhada. Toda esta informação foi divulgada publicamente pela PJM nessa mesma manhã”, refere o primeiro-ministro.
Numa outra pergunta o juiz questionou António Costa se sabia se o arguido e ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes deu a concordância ao arguido Luís Vieira, na altura diretor da PJM, para este executar todas as diligências necessárias à recuperação do material militar com total desconhecimento do Ministério Público e da Polícia Judiciária.
“Não. Nem creio que isso pudesse ter acontecido. Como tive oportunidade de declarar à Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o caso de Tancos, considero que o professor Dr. Azeredo Lopes sempre desempenhou com lealdade as funções de ministro da Defesa Nacional”, respondeu António Costa.
O primeiro-ministro negou também ao juiz Carlos Alexandre ter conhecimento da entrega por Luís Vieira ao então ministro da Defesa Nacional de três documentos: um denominado ‘memorandum’, com o timbre da PJM e assinado por Luís Vieira; a denominada fita do tempo e uma cópia do despacho do Ministério Público datado de 07 de julho de 2017 de um processo-crime que se encontrava em segredo de justiça.
António Costa disse ainda não ter tido conhecimento que Azeredo Lopes terá dado ordens ao seu chefe de gabinete para lhe enviar uma cópia desses documentos, assegurando que não os recebeu.
O primeiro-ministro respondeu por escrito na qualidade de testemunha do ex-ministro da Defesa e arguido do caso de Tancos Azeredo Lopes.
O juiz Carlos Alexandre aceitou que o depoimento de António Costa fosse prestado por escrito, tal como tinha sido autorizado pelo Conselho de Estado, depois de ter insistido na importância em ouvir presencialmente o primeiro-ministro.
O processo de Tancos tem 23 acusados, incluindo o ex-diretor nacional da Polícia Judiciária Militar (PJM) Luís Vieira, que já foi inquirido nesta fase, o ex-porta-voz da PJM Vasco Brazão e o ex-fuzileiro João Paulino, apontado como cabecilha do furto das armas, que respondem por um conjunto de crimes que incluem terrorismo, associação criminosa, denegação de justiça e prevaricação, falsificação de documentos, tráfico de influência, abuso de poder, recetação e detenção de arma proibida.
O caso do furto das armas foi divulgado pelo Exército em 29 de junho de 2017 com a indicação de que ocorrera no dia anterior, tendo a alegada recuperação do material de guerra ocorrido na região da Chamusca, Santarém, em outubro de 2017, numa operação que envolveu a PJM, em colaboração com elementos da GNR de Loulé.