Um grupo de investigadores de Nova Iorque transplantou dois corações de porco para dois pacientes que se encontravam em morte cerebral. Este é o desenvolvimento mais recente numa série de experiências que visam aproximar-nos da possibilidade de salvar vidas humanas com órgãos de animais e fazer frente às longas filas de espera por dadores.
O novo estudo foi anunciada esta terça-feira, tendo sido realizado na NYU Langone Health (centro médico académico da Universidade de Nova Iorque) primeiro no mês passado e novamente na última semana. Os pacientes que receberam o transplantem eram um veterano da guerra do Vietname oriundo da Pensilvania com um longo histórico de problemas cardíacos e uma mulher de Nova Iorque que já tinha recebido um transplante anteriormente.
Para realizar a investigação, os cientistas seguiram os protocolos normalmente utilizados num transplante de órgãos humanos. Como tal, a equipa viajou para uma instalação que abriga porcos geneticamente modificados, removeram os corações e viajaram de avião de volta para Nova Iorque com os órgãos em gelo.
“Quando tiramos a clampe e restauramos o fluxo sanguíneo para o coração, este começou a bater. Eu faço isto há mais de 20 anos e foi simplesmente inacreditável”, conta Nader Moazami, o médico que liderou os procedimentos à Associated Press. “Fica-se ali parado em admiração.”
Antes da operação, os órgãos foram ainda sujeitos a um novo método especial que deteta a presença de virus animais. Seguiram-se três dias de testes intensivos (mais do que um ser humano vivo teria capacidade de suportar) antes de os médicos terem desligado as máquinas. “Aprendemos tanto do primeiro [transplante] que o segundo foi muito melhor”, afirma Nader Moazami.
Este não foi contudo a primeira tentativa para estudar este tipo de transplantes com dadores animais. Há várias décadas que este tipo de operações – a que os cientistas chama xenotransplantes – têm sido tentadas sem sucesso, visto que o sistema imunitário humano rejeita e começa a atacar instantaneamente o tecido que lhe é estranho. Agora, os porcos criados com vista a estes procedimentos têm sido geneticamente modificados para que os seus órgãos sejam mais próximos dos humanos.
O estudo mais ambicioso até ao momento ocorreu no início deste ano, quando uma equipa do University of Maryland Medical Center realizou uma operação histórica ao transplantar um coração de porco para um paciente em fase terminal. O transplante acabaria por falhar e David Bennett, de 57 anos, morreu dois meses após a operação. Os testes iniciais realizados no coração falharam em detetar um virus animal, sendo contudo desconhecido qual o vírus ou o que causou a falha cardíaca. Este caso serviu ainda assim para provar que o xenotransplante é possível.
Por outro lado, tanto a Universidade de Nova Iorque como a do Alabama estão também a realizar separadamente experiências com transplante de rins suínos em humanos, neste caso pessoas mortas que tenham doado os corpos à ciência. Robert Montgomery, o cirurgião responsável por estes estudos no NYU Langone Health, considera que a continuação destes estudos irá permitir encontrar os melhores métodos a aplicar “num cenário em que a vida da pessoa esteja em risco”.
“Esta não é uma situação única. Serão anos de aprendizagem do que é importante e o que não é importante para que isto funcione”, afirmou o médico que indica ter uma lista de quase 50 pessoas que o contactaram para se voluntariar para um transplante de rim de porco.
“[Estes testes com pacientes mortos] servem como um importante trampolim”, acrescenta David Klassen, da United Network for Organ Sharing, agência que gere o sistema nacional de transplantes dos EUA.
Enquanto as investigações continuam, a FDA já está a considerar a hipótese de autorizar que um pequeno número de americanos se voluntarie para receber transplantes tanto de corações como de rins de porco. O NYU Langone está entre os três centros médicos que esperam realizar ensaios médicos em breve, tendo para já uma reunião marcada com a FDA para agosto na qual deverão discutir os requisitos necessários.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL