Anabela Morte nasceu em Torres Novas mas foi o Algarve que a criou Estudou em Portimão no 6o ano e do 7o aos 12o anos frequentou a Escola Secundária João de Deus (na altura com o nome Liceu de Faro). Com 16 anos foi viver para Olhão. Admite-se especialista em começar de novo, devido a todas as mudanças que passou na vida. Envolvida desde sempre em vários projetos de arte, foi dos primeiros elementos da Tuna Feminis Ferventis. O POSTAL foi saber como tudo se passou
Como surgiu a Feminis Ferventis?
A Formação da Feminis Ferventis aconteceu meses depois da for-
mação da Versus Tuna (masculina). Algumas alunas da Universidade quiseram juntar-se aos meninos da tuna mas foi-lhes vedado o acesso. Não havia casting, nem hierarquia, entrava quem queria. Lembro-me do dia em que escolhemos o nome e foi uma alegria imensa porque o nome encaixava mesmo no que pretendíamos. Não tem significado em Latim, mas foi escolhido por parecer Latim e por representar toda a mensagem que queríamos passar: uma Tuna Feminina cheia de “power”. Ti- vemos alguma resistência da Tuna Masculina, na medida em que afirmavam que as tunas, por tradição,eram masculinas e, também, a verba que o reitor atribuía para a tuna tinha de ser dividido por dois. A Tuna Académica Feminina da Universidade do Algarve – Feminis Ferventis foi fundada a 10 de dezembro de 1992 e atuou pela primeira vez na Tasca do Estudante na comemoração do Dia do Estudante, a 24 de março de 1993
Porque decidiu entrar para a tuna?
Lembro-me que fui convidada por uma colega. A minha irmã, Susana, também entrou para a tuna e, como fui sempre muito ativa e sempre gostei de me envolver em projetos (fiz teatro e rádio), pensei que seria fantástico juntar-me também. Na altura, nem pensei que estava a iniciar uma coisa maior. Participei na escolha do nome e na ideia de nos diferenciarmos dos restantes estudantes, usando culotes debaixo do traje. Participei também na escolha das músicas que iríamos cantar e na escrita do Hino da Tuna, que permanece até hoje. Os ensaios… Ai os ensaios! Que noites maravilhosas de riso despreocupado. Entrar para a Feminis Ferventis era a promessa de alegria e liberdade acrescida.
As tunas eram olhadas como algo para os rapazes?
Pessoalmente nunca liguei muito ao que os homens pudessem pensar de nós. Éramos, na altura, um grupo gigante de raparigas alegres, bonitas, jovens e que dava nas vistas. Andávamos sempre juntas e éramos muito unidas. Penso que fomos pioneiras e muitas pessoas achavam que éramos umas devassas. Mas mesmo assim afirmamos a nossa presença. Hoje, nem se fala nisso e já se vêem as coisas de outra maneira. A prova é a existência até de uma Tuna Mista.
Como mãe de três filhos, gostaria que eles um dia tivessem uma experiência como a sua?
As duas mais velhas já frequentam a universidade. Secretamente, seria um orgulho que passassem por esta experiência, mas o respeito que me merecem, passa por deixar isso ao critério delas. Atualmente, os jovens já não precisam de entrar para uma tuna académica para sentirem essa tal ‘liberdade acrescida’. Hoje, há imensos locais de convívio, os pais não são tão rigorosos na autorização das saídas e há imensa vida social, inclusive nas redes sociais. Em 1992, a nossa melhor rede social eram as aulas na universidade, os jantares e a tuna. Os jovens hoje, e perdoem-me nos casos em que não será verdade, não gostam de compromissos, gostam de viver no improviso, no estar disponível para algo que surja. E estar numa tuna pressupõe pelo menos a disciplina de ir regularmente aos ensaios. Pelo que sei, as minhas filhas já foram a um ou dois ensaios da Feminis Fervents. Até lhes foi atribuído nome na Tuna: a mais velha “a Herdeira” e a mais nova “a Morte” (o que eu gostei de ouvir isto!).
Depois de sair da universidade abandonou a tuna?
Sim, abandonei. Na altura não se falava que era possível continuar. Se fosse hoje, tinha continuado. Comecei a trabalhar e a vida seguiu o seu rumo. Um ano depois casei e fui para o Alentejo, onde morei 17 anos. Já foi por lá que soube que tinham gravado um CD. Acompanhei sempre a vida da tuna ao longe. Numa das vindas ao Algarve comprei o CD. Cantei tanto as músicas que ouvia e me traziam as melhores recordações. O CD já não sei onde anda. Nostalgia daqueles dias em que era uma féfé (fé-minis fé-rventis). Ainda sou, porque uma vez féfé, para sempre féfé. Sempre que há jantares com os ex-membros, eu tenho sido a única das fundadoras (infelizmente) a estar presente. Tem sido uma honra testemunhar o que, ao longo destes quase 28 anos, a Feminis Ferventis cresceu e conseguiu.
Que concelho deixaria para as jovens que se interessam pela Tuna mas nunca tiveram coragem de arriscar?
Experimentem. Vão a um ensaio. À terça e à quarta-feira no Complexo Pedagógico da Penha (garagens). Persistam. Sei que agora há uma hierarquia e procedimentos específicos até terem a oportunidade de fazer parte efetiva da tuna. Mas valerá a pena. Ganharão uma família que vos apoiará em todos os anos que estiverem na academia e poderão representar com orgulho toda a Universidade do Algarve, pelos mais variados locais. Viverão decerto histórias que levarão convosco para o resto da vida, co mo algo feliz que viveram. É tão bom chegar a certa altura da vida e ter histórias bonitas para recordar, poder sorrir ao olhar para trás Apesar de todas as voltas que a vida me fez dar, há uma que voltaria a dar sem hesitar: à formação da Tuna Académica Feminina da Universidade do Algarve – Feminis Ferventis, em 1992. É Fé, É Fé, É Feminis Ferventis!