Todos os caminhos vão dar a Roma ou cão que ladra não morde… são expressões que ouvimos com bastante frequência e que reconhecemos como provérbios.
A cidade de Tavira é conhecida como a capital do provérbio, pois recebe todos os anos especialistas de provérbios originários de todo o mundo para debater questões subjacentes a esta temática.
Este ano, o 13º Colóquio de Provérbios teve lugar entre os dias 3 e 10 de novembro, em Tavira.
Rui Soares, organizador do colóquio, explicou ao POSTAL que “o evento superou as expetativas. Foi muito bom. Tivemos mais de 100 participantes distribuídos por 31 países de todo o mundo, que vão desde a Nova Zelândia até vários países da zona asiática, como é o caso do Uzbequistão e ainda o Tartastan. Um outro país que nos visitou pela primeira vez foi o Zimbabué”.
“Depois tivemos ainda os países habituais: Turquia, Irlanda, América, Rússia, República Checa, Estados Unidos, Polónia, Finlândia, entre outros”, acrescenta.
Rui Soares relembra que “os continentes estavam todos representados, nomeadamente através do nosso correspondente Charles Mazango que é professor na Universidade do Cabo, na África do Sul”.
Colóquio contou com um programa intensivo durante sete dias
O organizador explicou ao POSTAL “que o colóquio se desenrolou ao longo de sete dias bastante intensos, com a realização de diversas atividades”.
“Este ano a abertura do colóquio foi feita no Salão Nobre da Câmara Municipal de Tavira, o que constituiu uma novidade e que quebrou a tradição de se fazer a abertura no Hotel Vila Galé, que tem sido ao longo dos últimos anos o parceiro que aloja os participantes e que nos disponibiliza uma sala”, complementa.
Durante a sessão de abertura do colóquio, e perante as entidades oficiais, foi lida uma mensagem do associado Edward Zellem e apresentados dois dos seus livros de provérbios afegãos – um em Irlandês e outro em Tailandês.
“Gostava ainda de realçar uma nota interessante sobre a tradutora Petai Jirakongpipat da edição em tailandês. É uma jovem tailandesa com deficiência que passou a vida em cadeira de rodas. É, ainda, autora premiada na Tailândia, pelo seu novo romance “Golaab Jan” e constitui um exemplo para todos”.
O livro desta autora também foi apresentado no decorrer da sessão de abertura.
No decorrer do colóquio existiu uma mostra de livros de provérbios para que os participantes de todo o mundo pudessem ter contacto com outras publicações de outros países.
“Temos sempre uma exposição feita na biblioteca com livros de todo o mundo de provérbios, para que as pessoas da Holanda que nunca viram um livro de provérbios do Chile possam efetivamente contactar com isso. A exposição que está a decorrer pode ser vista até ao final do mês”.
“É importante não esquecer que um colóquio que se desenrola ao longo de uma semana não é o mesmo do que um que se faz em dois ou três dias. Ali se trocam muitas impressões preciosas, para além das discussões das comunicações que os vários investigadores trazem”, relata o organizador.
Ao longo do colóquio existem vários jantares integrados neste evento e outros que não são tão oficiais, mas “cujo objetivo é que as pessoas possam tomar contacto com a nossa gastronomia e possam trocar impressões”.
Rui Soares refere que “é natural que existam assuntos que nos interessem mais do que outros e nesses momentos informais as pessoas procuram aprofundar as áreas que mais lhes interessaram”.
“O colóquio está planeado de tal maneira que as pessoas ao longo deste semana possam tirar o máximo de proveito em relação à parte científica do estudo dos provérbios, mas também que tomem conhecimento relativamente àquilo que é o nosso país”, salienta.
Ao longo destes anos existem dois slogans importantes relacionados com o colóquio. O primeiro é uma adaptação de “Todos os caminhos vão dar a Roma” para “Todos os caminhos vão dar a Tavira” e é fácil perceber o porquê. “Por aqui já passaram milhares de investigadores de todo o mundo a falar e a discutir questões relacionadas com os provérbios e áreas afins”, clarifica Rui Soares.
“O outro slogan é que ‘Tavira é a capital mundial do provérbio’. A nível mundial não existe nenhuma aldeia, cidade ou país que tenha efetivamente uma concentração maior de especialistas na área dos provérbios como nós temos tido ao longo destes 13 anos”, defende o organizador.
Rui Soares é presidente da Associação Internacional de Paremiologia
Rui Soares, para além de organizador do colóquio, é também presidente da Associação Internacional de Paremiologia.
“A atividade da associação não se resume ao colóquio, no entanto, digamos que este evento é a atividade com mais visibilidade. Nós ao longo do ano dinamizamos muitas atividades”, refere.
“Decorrente destas atividades destes anos todos estabeleceu-se um protocolo com a Comissão Nacional da UNESCO que criou em Tavira o Clube UNESCO de Parameologia. É o único clube que existe no país para o estudo e reconhece a associação como a única entidade ao nível da UNESCO de consultoria para a arte dos provérbios”, realça.
“Quando a UNESCO precisa de um parecer relacionado com provérbios, é a nós que recorre para avaliarmos a credibilidade”, acrescenta.
A sessão inaugural do colóquio contou ainda com a presença do representante da UNESCO em Portugal e a representação do presidente da Federação Nacional das Associações Centros e Clubes UNESCO, a diretora Regional de Cultura do Algarve, os membros da autarquia tavirense e ainda os embaixadores da República Checa e Polónia.
“Este é um trabalho de continuidade e é muito importante este reconhecimento público da autarquia”, explica.
Associação Internacional de Paremiologia vai ter uma sede em Tavira
Rui Soares confidenciou ao POSTAL que a associação vai ter uma sede em Tavira, anúncio que foi feito na abertura do colóquio pela autarquia.
“Foi anunciado que teremos em breve uma sede mais central e mais eficiente, o que constitui um importante passo, pois nós fazemos várias atividades ao longo do ano, nomeadamente, exposições. O que acontecia é que os espaços em Tavira não são tantos quanto isso e existiam exposições que não chegavam a vir até nós porque não tínhamos uma estrutura para as acolher”, recorda.
Durante o colóquio, a parte científica é abordada de segunda a sexta. “No fim de semana damos um cheirinho aos participantes do que é a nossa terra e da beleza que temos. Ao longo destes 13 anos eles já conhecem o Algarve de ponta a ponta e parte do Alentejo”, explica.
“Já fizemos a parte do mar, do barrocal e da serra algarvia. Este ano fomos no sábado a Castro Marim, que coincidia precisamente com a feira e no domingo a Montemor o Novo”, refere o organizador.
“É muito importante este contacto para o entendimento de alguns provérbios, como por exemplo, aquele que diz que “De Espanha nem bom vento nem bom casamento”, explana.
Rui Soares entende que “neste provérbio é preciso entender aquilo que foi o seu nascimento. Nós perdemos a nossa independência devido a um casamento com um rei espanhol. O povo aproveita-se destes marcos históricos para criar os provérbios. A parte do vento vindo de Espanha explica-se exatamente pelo facto de este ser mais frio”.
“Há muitos provérbios que devem ser explicados. Os provérbios não podem ser lidos tal e qual aparecem, pois têm de ser entendidos à luz da época”, refere.
Rui Soares explicou ao POSTAL que “os provérbios têm, muitas vezes, uma vertente de aconselhamento e podem ter várias interpretações”.
“Os exemplos vêm de cima”. Quando dizemos isso queremos realçá-lo pela positiva, mas também o podemos dizer noutros contextos e com outras conotações”, fundamenta.
Mas, afinal o que é um provérbio?
Rui Soares disse ao POSTAL que existem várias definições de provérbio: “a definição que eu gosto de dar é que um provérbio é o resultado de uma atividade do nosso quotidiano, é experiência de vida”.
“Como sou formado em matemática, interessa-me muito mais o conteúdo do que a forma. Existem muitos provérbios que podem ser redutíveis a uma fórmula matemática como é o caso dos provérbios sobre a agricultura”, explica.
Rui Soares lamenta o facto de “em Portugal ainda não existirem nas universidades e nos departamentos de línguas, seções que estudem a Paremiologia. Lá fora já existem, inclusivamente aqui ao lado, em Espanha. Em Portugal existem alguns centros de estudo, mas coisas muito ténues”.
“Nós temos um dos nossos associados, o professor Filipe Pires, que se especializou nos provérbios das obras de Saramago, em que estuda os provérbios e a sua desconstrução, algo que consideramos absolutamente fantástico e útil para o país”.
Associação de Paremiologia realiza atividades com jovens e seniores
A associação realiza com frequência atividades com as escolas e com os mais idosos.
“Este ano calhou a duas escolas, uma do primeiro ciclo de Tavira e outra de Estoi, fazerem trabalhos e virem apresentá-los ao colóquio”, recorda Rui Soares.
“Este ano a UNESCO celebra o Ano Internacional das Línguas indígenas e nós tentamos sempre envolver as escolas nisso. Este ano coincidia ainda com os 500 anos dos Descobrimentos. Os meninos fizeram um trabalho muito bonito”, relembra.
Rui Soares não tem dúvidas: o colóquio é um evento que tem uma importância acrescida para a cidade de Tavira.
O organizador relembra que recebeu, no ano passado, no final do colóquio, uma carta de Charles Mazango, onde o investigador utilizava duas expressões para definir o evento. Em primeiro lugar, utilizou a expressão “Rainbowfamily – Família Arco-Iris. “Esta expressão mostra bem a diversidade cultural que existe no colóquio”, explica o organizador.
A outra expressão utilizada foi Week Stress Free, ou seja, uma semana relaxante, sem stress.
No final do evento, os participantes “receberam ainda um livro com todas as comunicações feitas no colóquio em inglês e português, em que as capas e contra-capas são fotografias que pretendem realçar a cidade de Tavira”.
E como devagar se vai ao longe… Resta-nos esperar pelo colóquio do próximo ano para discutir mais assuntos relacionados com os provérbios.
(Stefanie Palma / Henrique Dias Freire)