A sensibilização para a endometriose foi a causa escolhida pelo algarvio Marco Pereira para percorrer a pé toda a Estrada Nacional (EN) 2, com 738 quilómetros que ligam Chaves a Faro, como forma de sensibilização para esta doença.
Apaixonado por caminhadas há vários anos, Marco Pereira vai tentar ser o primeiro caminheiro a fazer este percurso a pé ao longo de 24 dias, com início no dia 26 de Setembro e final em 20 de Outubro.
A motivação passa por sensibilizar para a existência da endometriose, uma doença que afecta muitas mulheres e que em Portugal ainda tem algumas carências ao nível do diagnóstico e do tratamento.
“A EN 2 é a maior estrada do país e a terceira maior do mundo, é bonita e emblemática, mas queria juntar uma causa. Depois de ajudar algumas mulheres com endometriose a organizar uma marcha em Quarteira, onde resido, propus caminhar por elas, aceitaram e decidi abraçar esta causa”, afirmou à Lusa.
É estimado que o número de mulheres afectadas pela endometriose a nível mundial seja de cerca de 175 milhões. Em Portugal os sintomas ainda não têm o devido acompanhamento, segundo a médica ginecologista Tatiana Semedo Leite.
“Existe uma taxa de cerca de 3% a 20% das mulheres a nível mundial afectadas por esta doença, em Portugal os números são semelhantes. Muitas vezes há um atraso no diagnóstico, que está descrito entre 6,7 e oito anos de atraso, devido ao facto de os sintomas serem mais ténues no início ou se baralharem com sintomas de outros órgãos”, esclareceu.
A endometriose é uma doença crónica
A endometriose é uma doença crónica e os sintomas consistem maioritariamente em dores menstruais mais intensas, dores durante a micção ou na dejecção, ou dores durante as relações sexuais, um quadro que afecta a mulher a vários níveis.
“Ainda existe alguma falha ao nível do conhecimento sobre esta doença. Por vezes o diagnóstico acontece numa fase mais avançada. Também existe alguma diminuição da sensibilidade dos médicos, falo de todos nós, para estarem predispostos, perante alguma desta sintomatologia, a associar à endometriose”, descreveu a especialista em genecologia e obstetrícia.
A opinião é partilhada por quem sofre de endometriose, como Joana Leal, de 33 anos, que alerta para a falta de resposta e acompanhamento por parte do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
“Uma em cada dez mulheres sofre de endometriose, é bastante comum e muitas nunca saberão que têm a doença, julgam ser normal. Infelizmente ainda há muita falta de informação, por vezes até falta de interesse da parte dos médicos e auxiliares de saúde. Somos obrigadas a recorrer ao privado, que é muito dispendioso, e nem toda a gente tem essa possibilidade”, evidenciou.
Joana Leal assume que a doença condiciona a vida da mulher em todos os sentidos – “a nível social, familiar, sexual e de fertilidade” – e lamenta o facto de muitas doentes serem obrigadas a deslocações ao centro do país ou ao norte por “não existir no Algarve qualquer médico especializado no Serviço Nacional de Saúde” (SNS).
Doença tem implicações a nível psicológico, afectivo e relacional
Face à falta de resposta, muitas pacientes optam por aceder a clínicas privadas.
“Muitas mulheres aparecem sem saber que têm endometriose, somos nós que diagnosticamos e reencaminhamos para as especialidades adequadas, muitas vezes no privado, porque o SNS infelizmente ainda não funciona muito bem nesta área”, salientou Joana Freitas, enfermeira numa unidade de saúde privada, especializada no tratamento de infertilidade.
A enfermeira apresenta a doença como fisiológica, mas que tem implicações a nível psicológico, afectivo e relacional, no seio familiar e no trabalho, “porque provoca muitas dores”. Por isso, destaca a importância da caminhada ao longo da EN2 em nome desta causa.
“Há muitos profissionais de saúde, inclusive da área da ginecologia, que nem sequer têm conhecimento de que existe esta doença, daí ser muito importante para alertar para a existência da mesma”, referiu.
A caminhada tem um significado ainda mais especial para quem sofre de endometriose, como é o caso da “endoguerreira” Joana Leal.
“O que o Marco está a fazer é fantástico, ainda mais sendo um homem. Esta doença não é só da mulher, influencia os companheiros e todo o ambiente familiar e social. Estamos todas com o Marco, umas de coração outras fisicamente, e quem puder apareça para caminhar um bocadinho com ele ao longo do país”, convidou.