A candidata presidencial Marisa Matias reiterou hoje a necessidade de tratar a imigração como “uma questão de direitos humanos, dignidade e inclusão”, criticando os muros burocráticos da regularização depois de visitar a associação “Solidariedade Imigrante”.
Num canto da pequena sala com duas mesas de atendimento onde, diariamente, a associação de defesa dos direitos dos imigrantes recebe dezenas de pessoas, pilhas de fichas representam as várias centenas de imigrantes que aguardam pelo agendamento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) para iniciar o seu processo de regularização.
“É uma situação absolutamente vergonhosa”, criticou a candidata apoiada pelo Bloco de Esquerda, afirmando que esse é o resultado de “olhar para a imigração e para os imigrantes como se fossem todos suspeitos”.
Ao invés, Maria Matias defende que a forma como a imigração é tratada em Portugal tem de mudar drasticamente em relação àquilo que se verifica atualmente.
“Se não olharmos para esta questão como uma questão de direitos humanos, de dignidade e de inclusão, se continuarmos a olhar como uma questão de criminalização, não vamos resolver este problema”, referiu.
Para a eurodeputada e agora candidata à Presidência da República, a realidade ilustrada por aquela pilha de folhas que encontrou na associação não é aceitável, sobretudo porque muitas daquelas pessoas estão há vários meses à espera de uma primeira resposta.
“Pudemos ver centenas e centenas de processos. Cada um daqueles processos é uma pessoa e cada uma dessas pessoas está, muitas vezes, há um ano ou mais à espera de um agendamento para poder começar o seu processo de regularização. Não é admissível”, sublinhou.
Maria Matias lembrou ainda que muitos dos imigrantes que continuam em situação irregular em Portugal, além de estarem no país há muito tempo, trabalham e contribuem para a Segurança Social.
À saída da associação encontrou precisamente um desses casos: um homem que está no país há cerca de dez anos, sempre trabalhou, mas continua ilegal.
“(São) pessoas que trabalham, que têm os seus descontos, que já estão integrados na comunidade, mas que o Estado não reconhece essa integração nos seus direitos”, disse, insistindo na necessidade de serviços administrativos céleres.
Quando Marisa Matias chegou à “Solidariedade Imigrante”, pelas 10:00, quase 20 pessoas aguardavam na rua à espera para poderem subir ao 2.º andar do prédio centenário em plena Baixa Pombalina onde a associação têm a sua pequena sala de atendimento.
Diariamente, a associação recebe entre 60 a 80 pessoas. Por mês, são milhares que vêm de todo o país à procura de ajuda, relata o presidente, Timóteo Macedo.
“Vêm aqui falar connosco, na expectativa de nós darmos uma mão e de tentarmos resolver com eles, fazendo dos imigrantes parte da solução dos problemas e lutando pelos seus direitos”, sublinhou Timóteo Macedo.
Quando saiu da reunião com os responsáveis da “Solidariedade Imigrante”, Marisa Matias parou para falar e conhecer a história de algumas das pessoas que estavam à espera. Uns de Lisboa, outros do Algarve, há mais de um ano em Portugal, foram à procura de apoio da associação, mas sabiam bem o que estava em causa e citavam os artigos da Lei de Estrangeiros que os tinham levado ali.
Mas o que mais surpreendeu Marisa Matias foi a forma como muitos reagiram às suas perguntas, puxando dos documentos para comprovar que estavam a contar a verdade.
“Não precisa de me mostrar nada, eu confio na sua palavra”, repetia a candidata. Cá fora, admitiu que a situação a comoveu e voltou a sublinhar: “A imigração não se trata como se fossem processos criminosos, trata-se com inclusão”.
As eleições presidenciais, que se realizam em plena pandemia de covid-19 em Portugal, estão marcadas para 24 de janeiro e esta é a 10.ª vez que os portugueses são chamados a escolher o Presidente da República em democracia, desde 1976.
A campanha eleitoral decorre entre 10 e 22 de janeiro, com o país a viver sob medidas restritivas devido à epidemia. Além de Marisa Matias, concorrem às eleições outros seis candidatos, Marcelo Rebelo de Sousa (apiado pelo PSD e CDS/PP) Tiago Mayan Gonçalves (Iniciativa Liberal), André Ventura (Chega), Vitorino Silva, mais conhecido por Tino de Rans, João Ferreira (PCP e PEV) e a militante do PS Ana Gomes (PAN e Livre).