O presidente da Junta de Freguesia de Armação de Pera acusou, este sábado, a autarca de Silves de ser como “Putin” por não facilitar a transferência de competências para aquele órgão, acusação que a autarca já considerou “lamentável”.
Durante uma intervenção no XVIII Congresso da Associação Nacional de Freguesias (Anafre), que decorre até domingo, em Braga, Ricardo Pinto criticou a “postura” da presidente da Câmara de Silves e do executivo relativamente ao processo de descentralização de competências para as freguesias.
“Em Silves, a minha presidente de Câmara pensa que ainda dispõe de todo o poder”, afirmou o autarca social-democrata, dizendo que tem reivindicado a transferência de competências para a freguesia que deu “provas repetidamente” que tem capacidade de “fazer mais e melhor” pela população.
“É isso que queremos e reivindicámos. E o que acontece quando temos essa postura? Somos inclusivamente ameaçados pessoalmente pela presidente da Câmara e pelos vereadores de perseguição, de que tudo farão para nos prejudicar inclusivamente pessoalmente […]. Parece que temos o Putin [Presidente russo] em Silves, não é nada diferente”, salientou Ricardo Pinto.
Confrontada com as críticas, Rosa Palma, eleita pela CDU, lamentou, em declarações à Lusa, “as palavras duras” utilizadas pelo autarca, recusando, contudo, as acusações feitas relativamente ao processo de delegação de competências. “Que raio de descontextualização o leva a dizer uma coisa deste género? Lamento imenso que tenha vindo falar da minha pessoa na Anafre e fazer acusações tão graves”, lamentou a presidente da Câmara de Silves.
Recusando as acusações, Rosa Palma adiantou que o executivo tem tido “um cuidado incrível” com as juntas de freguesia e que, “prova disso”, é o reforço “em mais do dobro” do valor das verbas a transferir para aqueles órgãos autárquicos.
“Foram tidos em conta critérios muito rigorosos e tiveram em conta as características das juntas de freguesia. Se na ótica do senhor presidente da junta isto não é negociar e tratar as juntas tendo em conta a universalidade, sem aumentar a despesa da câmara, e se isto é ser o Putin, então o Putin tem muito que aprender connosco”, acrescentou.
Aos mais de 1.000 congressistas presentes em Braga, o presidente da Junta de Freguesia de Armação de Pera deixou a garantia de que irá “continuar a lutar”. “No meu caso, não me calarei, não desistirei e não parei de lutar por Armação de Pera”, disse.
A Associação Nacional de Freguesias (Anafre) iniciou esta sexta-feira em Braga o seu XVIII Congresso, na sequência das eleições autárquicas, onde se discutirão temas como as novas competências, a reorganização administrativa, a reversão de uniões de freguesia imposta pelo ‘lei Relvas’ e o acesso a fundos comunitários.
FREGUESIAS FARTAS DE ANDAREM DE CHAPÉU NA MÃO
No segundo dia do Congresso da Anafre, vários presidentes de juntas de freguesia reclamaram acesso aos fundos comunitários, dizendo-se “discriminados e cansados de serem o parente pobre” deste processo. A candidatura a verbas da coesão europeia é uma reivindicação comum a quase todas as intervenções. “Esse é o grande e o próximo desafio das freguesias”, sublinharam diferentes autarcas locais.
“As juntas de freguesia continuam a ser discriminadas no acesso a fundos comunitários e quem melhor do que nós para implementar verdadeiras reformas?”, questionou a presidente da Junta de Freguesia de Lousã e Vilarinha, do distrito de Coimbra, Helena Correia, eleita pelo PS, posição similar à do líder da Assembleia de Freguesia da Junta de Palmeira, do distrito de Braga, João Ferreira. “Somos o parente pobre da democracia”, atirou, concluindo que os autarcas de freguesia não podem continuar a estar de “chapéu na mão” perante os executivos municipais.
Também por considerar que o acesso a fundos comunitários “não pode estar apenas” disponível para as câmaras municipais, a presidente da Junta de Freguesia de Germil, no distrito de Viseu, Lúcia Lopes, defendeu que o acesso por parte destes órgãos autárquicos deve ser “uma prioridade para os próximos quatro anos”.
Já o presidente da União de Freguesias de Mação, Penhascoso e Aboboreira, no distrito de Santarém, José Fernando Martins, sublinhou que não basta pedir acesso aos fundos, mas é também necessário depois concretizar os projetos quando eles estiverem disponíveis.
MARCELO ALERTA PARA CORRIDA CONTRA O TEMPO ÀS VERBAS DO PRR
Na abertura do XVIII Congresso da Anafre, o Presidente da República afirmou ser “muito importante” que fique “atempadamente” definida a participação e o acesso das freguesias aos fundos europeus por tratar-se de uma “corrida contra o tempo”, aludindo ao facto de a disponibilização da ‘bazuca’ ter um horizonte temporal curto. “E desta vez não há prazos adicionais, nem prolongamento”, advertiu Marcelo Rebelo de Sousa
“É essencial que fique definido o regimento da vossa participação e acesso aos fundos europeus e aos fundos do Plano de Recuperação e Resiliência [PRR]”, frisou.
Jorge Veloso, presidente da Anafre que tudo indica será reeleito durante do Congresso, assinalou no discurso de abertura do encontro em que participam mil autarcas locais que as freguesias estão atentas à guerra na Ucrânia, às vítimas inocentes e aos refugiados em fuga, a quem prometeu “disponibilidade para ajudar”. “Podem contar com as freguesias”, garantiu.
Para o líder da “casa comum das freguesias”, a descentralização é a verdadeira reforma do Estado, processo que pretende seja acelerado com base no diálogo e compromisso, lembrando que, até ao momento, apenas 106 dos 308 municípios portugueses assinaram “autos de transferência de competências com 1.100 freguesias, num universo total de 3.092, correspondentes a um valor de € 90, 6 milhões”.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL, com Lusa