No seguimento das declarações feitas pelo Presidente da República, num evento com jornalistas estrangeiros, sobre a necessidade de Portugal assumir a responsabilidade total pelos crimes cometidos no passado colonial português, André Ventura vem a público ponderar uma ação criminal por “traição à pátria”.
O assunto das reparações surgiu a propósito do levantamento, por outros países europeus, de inventários em museus de obras e artefactos das ex-colónias e posteriores devoluções, como foi o conhecido caso dos Bronzes de Benim. Inevitavelmente, alguns países acabaram por avançar até com pedidos de reparações económicas e foi nesse seguimento que as palavras de Marcelo Rebelo de Sousa geraram polémica. Será que quando mencionou “pagar” os custos da escravatura, as suas palavras seguiam um sentido pecuniário?
André Ventura acusa-o de defender interesses de outros países e não de Portugal e de ofender muitos portugueses, nomeadamente os que viviam nas colónias
Em desacordo, muitos questionaram a sanidade do nosso Presidente da República nestes contados 75 anos de idade. Houve até quem lhe descredibilizasse como inimputável. O “tio Marcelo”, como a figura política emblemática distribuidora de beijinhos, passa agora a “caquético” Chefe de Estado.
Se por um lado é verdade que a leveza com que este tema foi trazido por ele a debate foi pouco séria, também é verdade que o desespero do Chega em ganhar tempo de antena apontando o dedo a toda e qualquer nota menos feliz de outras figuras políticas torna-se, para além de triste, ridículo.
No art. 7º da lei sobre a responsabilidade de titulares de cargos políticos encontra-se plasmado o crime de traição à pátria, “o titular de cargo político que, com flagrante desvio ou abuso das suas funções ou com grave violação de inerentes deveres… tentar separar da Mãe-Pátria, ou entregar a país estrangeiro, ou submeter a soberania estrangeira, o todo ou uma parte do território português, ofender ou puser em perigo a independência do País será punido com prisão de 10 a 15 anos”.
André Ventura acusa-o de defender interesses de outros países e não de Portugal e de ofender muitos portugueses, nomeadamente os que viviam nas colónias e que tiveram de vir para Portugal, perdendo em muitos casos os seus bens. Note-se, porém, que para dar início ao processo a Constituição da República Portuguesa exige a aprovação por maioria de dois terços dos deputados em efetividade de funções e não me parece que consiga contar com os votos do PS e PSD. E acredito que é mesmo isso que ele quer:
Estas manobras políticas disparatadas servem para, mais tarde, o partido poder gritar em plenos pulmões que é a força partidária mais patriota, nacionalista e, o adjetivo que mais persuadiu o eleitorado português, anti-sistema. Parece-me que todos os partidos no geral, receiam (ou anseiam) a convocação de eleições antecipadas pelo possível chumbo do orçamento de estado, em outubro. Então, lançam-se nestas pseudo campanhas eleitoriais implícitas, olhando cada um para o seu umbigo partidário e esquecendo-se do essencial: (des)governar o país.
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