Jay Parini é poeta, romancista biográfico e autor de biografias de autores de relevo, como John Steinbeck, Robert Frost e William Faulkner. A sua obra A Última Estação retrata os últimos dias de Tolstoi, e foi adaptada ao cinema.
A Travessia de Benjamin de Jay Parini, obra publicada pela Elsinore, segue o mesmo modelo dessa obra (e de outra ainda não publicada entre nós sobre Herman Melville), mas agora com maior profundidade, ao narrar os últimos meses da vida de Walter Benjamin, quando em 1940 este alemão de origem judaica, que se faz acompanhar constantemente de uma mala onde transporta a sua obra de uma vida, um manuscrito com cerca de 100 páginas e outros textos, se vê enclausurado com a sua irmã numa Paris cercada pelos nazis.
Neste romance biográfico, vamos seguindo o percurso de Walter Benjamin, um homem com os seus cinquenta anos, desfasado da realidade, desde os dias que passa numa biblioteca, onde fica conhecido como «o homem que se senta na Bibliothèque Nationale e nada produz» (p. 204), passando por um período em que esteve detido num centro de recolha (quase como um campo de concentração) onde é instado a dar prelecções como forma de ocupar o tempo e as mentes de uma série de refugiados, também eles intelectuais, até ao dia que é atirado, com a sua omnipresente pasta e manuscrito, borda fora de um barco onde tentava fugir, para por fim tentar uma travessia por terras de Espanha que o levem até Portugal.
«Atravessaríamos Espanha e entraríamos em Portugal, que era considerado um local mais adequado do que Marrocos para esperar pelo fim da guerra. Portugal manter-se-ia, certamente, uma zona neutra, e o nível de vida lá era razoavelmente elevado.» (p. 197)
A personagem de Walter Benjamin, uma das mentes mais brilhantes de uma geração de intelectuais e de um círculo de figuras com que conviveu, como Bertolt Brecht ou a sua prima Hannah Arendt, é sabiamente refractada através da perspectiva de outros que com ele conviveram, e poucas vezes a uma luz abonatória: «Ouvir um homem como aquele punha à prova a paciência de uma pessoa. Tudo lhe fazia recordar um livro, uma personagem de um livro ou o autor de um livro. No seu leito de morte, haveria de gritar: «Lembro-me de uma cena num livro onde acontece assim!» Só com a sua morte cessariam as referências, provavelmente tanto para ele como para toda a gente.» (p. 213)
O autor recorre ainda a fragmentos escritos da obra de Walter Benjamin no início de cada capítulo, traduzidos por si mesmo, e na própria narrativa não se inibe em, por vezes, levar-nos em dissertações filosóficas que equivalem a entrar na cabeça do nosso protagonista. Os eventos, locais e datas são fiéis à realidade, e o autor baseou-se ainda em cartas bem como testemunhos escritos e escutados de quem conviveu com Benjamin, figuras essas também convertidas nesta obra em personagens.
(CM)