É o mais recente livro publicado nos ensaios da Fundação Francisco Manuel dos Santos, a autora tem créditos firmados também nos estudos sobre o envelhecimento: “Envelhecimento e Políticas de Saúde”, por Teresa Rodrigues, Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2018.
A sua investigação aborda quatro problemáticas: o processo de envelhecimento das estruturas etárias da população; dada a inevitabilidade deste processo, que futuro temos por diante, como seremos, o que vai mudar na educação, no comportamento perante a vida e a saúde, que tipo de consumo de lazer e estilo de vida; apresenta a realidade atual da saúde em todo o seu processo adaptativo, como evoluirá o olhar profilático para a atitude preventiva e proativa; nesse futuro, de que políticas de saúde carecemos, entre certezas e incertezas.
Primeiro aspeto, o retrato do nosso envelhecimento, estamos a perder residentes, é a evolução negativa do salto natural, é incontestável o processo de envelhecimento demográfica da população na base (redução do total de jovens) e no topo (aumento do total de idosos). Portugal é hoje o sexto país mais envelhecido do mundo. E vivemos mais, cada português vive mais 14 anos caso tivesse nascido em 1970, ou seja, o equivalente a duas vidas dos seus avós. Residem no país, desde 1999, mais idosos que jovens. Desde o início do século XX, os portugueses ganharam 41 anos de vida no caso dos homens e 44 anos no caso das mulheres. A descida da mortalidade infantil e juvenil foi determinante. Hoje, as principais causas de morbilidade e mortalidade devem-se a doenças crónicas e degenerativas, neoplasias e doenças do aparelho circulatório, que afetam predominantemente os velhos. No interior do país encontram-se as localidades onde faltam mais jovens ou onde 30 a 40% dos residentes tem 65 anos ou mais. É o envelhecimento do envelhecimento e a grande aposta numa vida com mais qualidade nessa longevidade, um viver mais saudável, mais inclusivo, um envelhecimento bem-sucedido.
O que está a mudar neste envelhecimento é que temos indivíduos mais escolarizados, melhor informados; o sistema político terá que saber gerir esta transformação, os gastos com a saúde dos idosos, e daí a construção de cenários onde deverão ser equacionados certos dados fundamentais: redução do número de residentes e alteração do seu perfil etário; maior variedade étnica e cultural; maior nível de educação e formação profissional, isto em cenários onde pontuam incertezas sobre a recuperação económica, sucesso das medidas tomadas para garantir a melhoria do desenvolvimento humano e do bem-estar social coletivo e até mesmo um cenário de dinâmica económica que contribua para mitigar os efeitos indesejados do envelhecimento.
Que saúde temos? E a autora espraia-se sobre a criação e evolução do Estado social português, as suas sinuosidades, isto para destacar que um dos grandes desafios que o nosso país irá enfrentar decorre da procura de cuidados diferenciados de saúde imposta no fenómeno do envelhecimento. A delicada questão política em função das diferentes opções e custos de saúde é saber quem paga. Sabido é que as medidas de contenção dos gastos públicos pós-crise afetaram várias funções de cuidados de saúde, traduzidos na redução de pessoal, cortes nos salários e diminuição do cofinanciamento para os pacientes. Em 2016, a despesa corrente em saúde, que corresponde a 8,9% do PIB é percentualmente igual à registada em 2003. Daí estarmos numa posição superior à média comunitária. São analisados os modos de financiamento dos cuidados de saúde em Portugal e a autora volta-se agora para o futuro, precisamos de saber se os serviços e os recursos humanos da saúde existentes respondem adequadamente às necessidades da população utente, atual e futura, que custos estão associados a estas respostas e que ajustamentos serão necessários em serviços e recursos humanos especializados.
Um perito não é bruxo nem profeta, mas pode prever certezas e conformar os números. Diz a autora que sabemos como será a população portuguesa e a oferta em saúde terá de contemplar o novo perfil da procura, centrado na gestão de doenças crónicas e outras patologias físicas e psicológicas associadas a idades mais avançadas. Podemos falar de um triplo envelhecimento (no topo, pelo aumento da esperança média de vida; na base, pela diminuição dos nascimentos; e pelo aumento da idade média da população), do envelhecimento do envelhecimento (mais acentuado no grupo com 80 e mais anos), na feminização do envelhecimento, num envelhecimento territorializado mas também num envelhecimento informado. A autora tem uma observação otimista: “Apesar das pressões, o nosso sistema de saúde tem demonstrado ser resiliente, mantendo de forma geral os seus serviços e padrões. Prevê-se nos próximos anos: 1) a redução da despesa pública no total das despesas de saúde; 2) algum agravamento nas condições de acesso a cuidados de saúde para os mais vulneráveis economicamente; 3) o reforço da participação das famílias no total das despesas de saúde; e 4) o crescimento do setor privado, alternativo para os cidadãos com seguros de saúde e beneficiários de subsistemas contributivos obrigatórios”.
A autora deixa algumas reflexões para a parte final do seu trabalho, diz claramente que será necessário encontrar o caminho para uma nova geração de políticas públicas capazes de revitalizar os mecanismos virtuosos do modelo social europeu. Haverá que repensar: a reorganização dos serviços de saúde; ter em conta que as unidades de reabilitação existentes no país são suficientes para fazer face ao previsto aumento de patologias incapacitantes; as respostas de âmbito social impõem uma reorganização do tipo de oferta mais adequada ao perfil localmente diferenciado do utilizador; é fundamental garantir importância e regularidade aos estudos e ao planeamento de base local como ferramentas de apoio à tomada de decisão. Estará na berra a qualificação dos recursos humanos, a responsabilização do cidadão utente e a dos profissionais detentores de informação, que têm competências para definir as escolhas mais racionais e eficazes de diagnóstico e de tratamento.