O Hospital de Faro voltou ao centro das atenções mediáticas, desta vez com uma sombra de incerteza e contradição que envolve o seu serviço de Cirurgia Geral. No espaço de dois dias, foram divulgados relatórios e inquéritos contraditórios sobre alegadas más práticas médicas, levantando dúvidas e, sobretudo, a necessidade de esclarecimento urgente. Afinal, como ficamos?
No dia 23 de setembro de 2024, a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) comunicou que foram detetados indícios de responsabilidade disciplinar em vários casos denunciados pela médica Diana Pereira, em abril de 2023. Segundo a médica, um conjunto de 11 doentes tratados no Hospital de Faro, entre janeiro e março daquele ano, teria sido vítima de erros médicos, resultando na morte de três deles, lesões corporais em outros, e dois internamentos em cuidados intermédios. A IGAS concluiu que havia fundamento suficiente para instaurar processos disciplinares a alguns dos profissionais envolvidos.
Sobre os casos reportados pela médica Diana Pereira, o que os cidadãos do Algarve e os utentes do Hospital de Faro exigem é a verdade
No entanto, no dia seguinte, a Unidade Local de Saúde do Algarve (ULSALG) divulgou um comunicado que contraria completamente esta narrativa. Segundo a ULSALG, os inquéritos realizados por comissões independentes de peritos da Ordem dos Médicos e pela direção do colégio da especialidade da Cirurgia Geral concluíram que não houve erros. A unidade referiu que mantém “toda a confiança” nos cirurgiões visados e que não existe qualquer decisão condenatória, seja de caráter disciplinar ou judicial.
Esta dicotomia não é apenas confusa, mas também perigosa. Em questões de saúde pública, especialmente num hospital que se quer de referência como o de Faro, é crucial que os processos de investigação sejam claros, transparentes e que as conclusões se alinhem com a verdade dos factos. A divergência entre as declarações da IGAS e da ULSALG não só desorienta o público, como pode prejudicar gravemente a confiança nos serviços de saúde, especialmente entre os utentes algarvios.
Além disso, o histórico deste caso é preocupante. Após as denúncias de Diana Pereira, a Ordem dos Médicos suspendeu preventivamente dois cirurgiões, incluindo o diretor do serviço de Cirurgia Geral, medida rara e que por si só indicava a gravidade das acusações. Ao mesmo tempo, o Ministério Público instaurou um inquérito que ainda está em curso. Estes elementos sugerem que, independentemente das conclusões da ULSALG, há questões por responder e investigações por finalizar.
O que está em jogo aqui não é apenas o bom nome dos médicos envolvidos, mas a própria integridade do sistema de saúde. A ULSALG, ao afirmar que pretende recorrer a todos os mecanismos legais para “repor o bom nome e reputação” da entidade, reconhece implicitamente o dano que estas acusações podem causar. Contudo, a mesma preocupação deve ser direcionada para garantir que, se houver responsabilidade, esta seja adequadamente apurada e punida.
A presunção de inocência é, sem dúvida, um princípio fundamental em qualquer investigação. No entanto, quando estamos a falar de vidas humanas e da confiança do público no sistema de saúde, não pode haver espaço para opacidade ou julgamentos apressados. É imperativo que todas as instituições envolvidas – a IGAS, a Ordem dos Médicos e o Ministério Público – prossigam com as investigações de forma rigorosa e célere, oferecendo respostas claras à população algarvia e ao país.
O que os cidadãos do Algarve e os utentes do Hospital de Faro exigem é a verdade. Se houve negligência ou má prática, os responsáveis devem ser responsabilizados. Se, pelo contrário, as acusações forem infundadas, a reputação dos médicos e da instituição deve ser protegida. Mas, acima de tudo, o sistema de saúde deve continuar a funcionar com transparência, profissionalismo e, sobretudo, com respeito pela dignidade de cada doente.
Afinal, como ficamos? O Algarve merece uma resposta clara e rápida.
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