A incerteza ainda é grande, mas a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) não tem dúvidas: “A guerra vai resultar num entrave de curto-prazo substancial ao crescimento global e em pressões inflacionistas significativamente mais fortes”. As palavras constam do documento “Impactos económicos e sociais e implicações para as políticas da guerra na Ucrânia”, publicado esta quinta-feira pelo organismo sedeado em Paris.
O documento destaca que as economias europeias serão as mais afetadas pelo conflito. E, em caso de restrições às importações de energia, Portugal será o sexto país da UE mais penalizado no crescimento.
Frisando que a magnitude do impacto “é altamente incerto, e vai depender, em parte, da duração da guerra e das respostas das políticas públicas”, a organização avança projeções. O crescimento mundial pode ser reduzido em mais de um ponto percentual e a inflação global aumentar em perto de 2,5 pontos percentuais no primeiro ano completo após o início do conflito.
As estimativas, baseadas na assunção de que os choques nos mercados de commodities e financeiros observados nas primeiras duas semanas do conflito persistem por, pelo menos, um ano, não correspondem exatamente ao conjunto do ano de 2022. Como a guerra começou a 24 de fevereiro, o primeiro ano completo só termina a 24 de fevereiro de 2023. Mas é uma aproximação bastante grande, dado que a diferença não chega a dois meses.
Ora, a projeção feita em dezembro pela OCDE para a economia global em 2022 era de um crescimento de 4,5%. Retirar um ponto, significa um crescimento de 3,5%.
EUROPA É A REGIÃO MAIS AFETADA
A OCDE espera uma “recessão profunda” na economia russa, alvo de diversas sanções internacionais após a invasão da Ucrânia. O cenário traçado é um recuo do Produto Interno Bruto (PIB) em mais de 10% e a inflação a aumentar perto de 15 pontos percentuais.about:blank
Frisando que “o impacto dos choques difere entre regiões”, a OCDE salienta que “as economias europeias, coletivamente, serão as mais atingidas, em particular as que fazem fronteira com a Rússia ou a Ucrânia”. Tudo por causa de “preços mais elevados do gás na Europa do que noutras partes do mundo e a força relativa dos laços de negócios e energéticos com a Rússia antes do conflito”.
Para o conjunto da zona euro, a projeção da OCDE é que a guerra na Ucrânia ‘roube’ 1,4 pontos pontos percentuais ao crescimento económico no primeiro ano completo após o início do conflito.
Como referido, esta projeção não coincide exatamente com o ano de 2022, mas é uma aproximação. Por referência, em dezembro, a OCDE projetava um crescimento da zona euro de 4,3% este ano. Retirando 1,4 pontos percentuais, significa que a expansão económica da zona euro ficará pelos 2,9%.
Este número fica aquém do cenário traçado há uma semana pelo Banco Central Europeu (BCE), que, apesar de ter revisto em baixa o crescimento no espaço da moeda única este ano, espera uma expansão de 3,7%. Contudo, o BCE avisou que, no cenário mais pessimista, o crescimento pode ficar pelos 2,3%.
A OCDE não apresentou projeções para os países da zona euro individualmente, mas dado que o maior choque económico advém dos produtos energéticos, faz um exercício calculando os efeitos diretos no crescimento de uma redução dos inputs energéticos, caso surjam restrições às importações de energia. E Portugal é dos países mais afetados da UE por este cenário.
Assim, um declínio de 20% nos inputs energéticos importados (importações diretas e indiretas de combustíveis fósseis, combustíveis refinados e fornecimentos de eletricidade e gás) levaria, no caso de Portugal, a uma redução do crescimento em 1,6 pontos percentuais face ao cenário base. É o sexto impacto mais expressivo entre os 22 países da União Europeia avaliados pela OCDE.
Recorde-se que a projeção feita em dezembro pela OCDE para o desempenho da economia portuguesa este ano apontava para um crescimento de 5,8%, ou seja, bem acima da média da zona euro.
GOVERNOS TERÃO DE “AMORTECER” ESCALADA DE PREÇOS DA ENERGIA
Neste contexto, a OCDE deixa recomendações para os Governos: “Apoio orçamental bem desenhado e cuidadosamente dirigido pode reduzir o impacto negativo sobre o crescimento com apenas um impulso extra menor sobre a inflação”.
Assim, “no curto prazo, muitos Governos terão de amortecer o impacto de preços da energia mais elevados, diversificar as fontes de energia e aumentar a eficiência energética onde for possível”, lê-se no documento.
Em relação à alimentação, a OCDE pede aos países que “refreiem o protecionismo” e apoio multilateral em termos de logística.
Já no que toca à política monetária, a recomendação é clara: “Deve continuar focada em assegurar expectativas de inflação bem ancoradas”. Considerando que que “a maioria dos bancos centrais deve continuar os seus planos pré-guerra”, a OCDE destaca a “exceção das economias mais afetadas, onde uma pausa pode ser necessária para avaliar completamente as consequências da crise”.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL