Mais do que um alojamento, o primeiro olhar identifica a loja da sorte Campião e, ainda no rés-do-chão, a livraria Bertrand. Ao passar na movimentada Rua Francisco Gomes, no centro de Faro, não se presta muita atenção ao nº 27. Porém, este discreto e modesto edifício é um elogio ao Modernismo algarvio. Além de uma boa cama, o The Modernist é um refúgio e caso de estudo para amantes de arquitetura.
O primeiro olhar de Cristophe e Angelique de Oliveira, em 2016, deparou-se com um prédio “descascado e com pombas”. Uma imagem pouco agradável, mas o casal francês viu mais além. Há 15 anos que compram e recuperam edifícios que foram palco de artes ou de ofícios em Paris, dando a conhecer a sua história aos hóspedes, e fizeram o mesmo em Portugal. Repararam em elementos que lembravam o movimento arquitetónico modernista, como as linhas retas, e decidiram renová-lo. O projeto desenvolvido pela plataforma PAr “respeitou esse legado modernista”, valorizando o património existente.
A renovação obedeceu a um “espírito de conservação, nem que fosse com réplicas feitas por medida por artesãos locais”, e sempre tendo em conta o conceito modernista em que a “decoração é mínima” e é “tudo pensado para ser funcional”, explica Cristophe. O The Modernist abriu em maio de 2021 e tem seis apartamentos (desde €120) com cozinha equipada e com reserva mínima de duas noites. Todos apresentam cama dupla, sobriedade cromática, varandas ou terraços. São amplos, sem divisórias, com poucos móveis – alguns de influência Art Déco – e dispostos de forma a maximizar o espaço. O sofá-cama permite alojar até quatro pessoas em cada apartamento. Minimalista e acolhedora, a decoração inspira-se nos anos 70 do século passado. Observe a pedra algarvia, a iluminação e os puxadores na mesma estética modernista: “Tudo produzido no Algarve ou a menos de cem quilómetros de distância para reduzir ao máximo a pegada ecológica e promover a economia local e os seus artesãos”.
Os apartamentos não têm televisão, mas disponibilizam wi-fi, chá, café, welcome drinks como cervejas artesanais locais, vinhos ou espumante, e jogos de inspiração arquitetónica com peças para montar. Para entrar no prédio e recolher a chave do quarto utiliza-se um código. Além da privacidade e autonomia, os hóspedes podem usufruir de um jardim exterior de uso comum com cadeiras de design e de um terraço onde podem apanhar sol e deslumbrar-se com a vista sobre o casario farense e a Ria Formosa. Para combater o calor, refresque-se no duche ao ar livre.
A par das dormidas, o The Modernist (Rua Francisco Gomes, 27, Faro, Tel. 0033624785874) disponibiliza um roteiro, desenhado pelos proprietários, que convida a conhecer exemplos de arquitetura modernista em Faro. E são muitos mais do que se possa pensar! “O Algarve tem uma das maiores coleções de edifícios com inspiração modernista, assinados por muitos dos que se reviram na ‘Escola do Porto’, como Manuel Gomes da Costa, Manuel Laginha e António Vicente Castro”, enquadra uma nota de imprensa. Manuel Gomes da Costa nasceu há cem anos, em Vila Real de Santo António, e é considerado “um dos grandes impulsionadores do movimento Modernista”, tendo deixado obra por todo o Algarve, sobretudo no Sotavento. Formou-se na Escola Superior de Belas Artes do Porto e “criou uma linguagem singular, que adaptou as características do modernismo à construção local”. Entre 1953 e 2002, assinou mais de 400 projetos, como a Casa de Retiros e o Colégio da Senhora do Alto, em Faro, ou a Igreja de Santa Luzia, em Tavira.
Para Cristophe e Angelique, Manuel Gomes da Costa (1921-2016) foi “o Frank Lloyd Wright português”. O casal despertou para o Modernismo nas viagens aos Estados Unidos da América e passagem por Palm Springs e Phoenix, no estado do Arizona, locais onde o arquiteto Frank Lloyd Wright deixou muita obra, inclusive a sua casa de inverno e escola, onde hoje funciona a fundação com o seu nome. Para Lloyd Wright, “qualquer edifício que seja bom no seu tempo será sempre um bom edifício”. Conheça os pontos de interesse elencados no The Modernist Arquitecture Walking Tour elaborado por Cristophe e Angelique, para quem Faro “é provavelmente a cidade mais modernista do Sul da Europa”, tendo sido identificados cerca de 500 edifícios associados a esse estilo. Atente à simplicidade das linhas e à prevalência azulejar e da geometria como pontos de partida. O edifício do Chelsea Café, a Casa Verde e a Casa Gago são alguns dos locais que constam nesse detalhado guia enviado aos hóspedes para eles terem “uma experiência cultural” durante a permanência em Faro.
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