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Valorização sociocultural
Para além de estarem ao serviço das práticas religiosas, entendemos que se deve partilhar com as comunidades o conhecimento científico produzido, o que pode ser mais adequadamente caraterizado como socialização patrimonial.
Sendo a acessibilidade ao património uma prioridade do Estado a que a Igreja também dá grande importância, pretende-se promover a acessibilidade pública às catedrais, igrejas e antigos conventos da região através de uma oferta estruturada em torno do património religioso, por via de espaços musealizados ou outras valências, como arquivos e bibliotecas, ou através de uma programação cultural que contribua para a sua valorização (vontade expressa no projecto da Rota das Catedrais que inclui Faro e Silves). Contudo, vicissitudes várias – como seja a falta de dotação financeira para realizar os investimentos necessários – têm privado a DRCAlg de assumir, neste âmbito, a sua participação plena neste programa.
Por outro lado, tendo em vista a requalificação do património religioso como factor de diferenciação da oferta turística regional e de partilha deste património com as comunidades, procurou-se congregar diversas Entidades num Projecto Regional de Património Religioso e Turismo: Diocese do Algarve, Pastoral do Turismo Religioso, União das Misericórdias, AMAL, CCDR, UALG, IPDJ, IEFP, RTA, ATA, Associações de Defesa do Património, DRCAlg.
Em torno dos edifícios e locais identificados pelos parceiros como prioritários, procurou-se estruturar a possibilidade de abertura concertada nos períodos de férias de alguns templos sob responsabilidade da Diocese, com o apoio dos municípios. Considerou-se a viabilidade de um Programa de Voluntariado para os jovens maiores de 16 anos para este efeito, a possibilidade de envolvimento de desempregados para desenvolverem as tarefas de recepção de visitantes, a criação de uma Bolsa de Voluntariado e a realização de cursos de formação com formadores certificados, tendo em vista a preparação de recursos humanos para acolhimento e acompanhamento do visitante que pretenda descobrir e experienciar o património religioso.
No âmbito da divulgação, considerou-se uma possível edição promocional dedicada a este património, a colocação de informação na internet, articulando os sites da DRCAlg, Pastoral do Turismo Religioso e municípios, bem como a disponibilização de dispositivos de interpretação dos bens culturais e a melhoria de segurança nos locais.
A economia e a integração social que o património religioso pode gerar como mais-valia para a região é uma necessidade que as várias entidades envolvidas identificaram mas que exige: pequenas intervenções de requalificação, conservação e restauro, organização de voluntariado jovem, bolsas de participação para desempregados, edições, divulgação em vários meios de informação e suportes, material interpretativo, segurança/vigilância. Seria importante desenvolver uma memória descritiva (incluindo estado de conservação dos imóveis, horários religiosos e de abertura para visitas) com aquilo que deverá ser concretizado para cada espaço ou conjunto dos vários espaços, quer de intervenção física quer de conteúdos e outras necessidades, para organizar um documento estruturado com as acções que cada paróquia, e que cada congregação pretende implementar nas igrejas e nos espaços musealizados que poderão integrar esta rede.
Há trabalho realizado e muito ainda por fazer
Temos que reconhecer que há um trabalho em desenvolvimento no âmbito da musealização e da valorização deste património e que se criaram a nível nacional e na estrutura interna da União de Misericórdias o Gabinete do Património Cultural que se dedica ao desenvolvimento destas preocupações, mas também existe desde o ano passado um novo protocolo de colaboração com o Ministério da Cultura para a salvaguarda, valorização e divulgação no património imóvel, móvel museográfico, arquivístico e imaterial das Santas Casas portugueses que pressupõe o apoio técnico e consultivo de vários organismos do Ministério da Cultura, entre as quais as Direcções Regionais.
Há trabalho conquistado no Algarve com a Rede Regional de Museus que poderá contribuir para a partilha de boas práticas e para a criação de sinergias interinstitucionais. Também com a Rede Regional de Arquivos alguns frutos começam a surgir em relação ao património documental e arquivístico.
As práticas museológicas aplicadas a este património na região devem incluir não só a introdução de práticas de inventariação e de registo, mas também de salvaguarda e de valorização. Para que este trabalho possa ser prosseguido será necessário o estreitamento da relação com a academia, nomeadamente com a Universidade do Algarve. Nomeadamente, ao nível dos fundos manuscritos a situação continua muito deficitária, pesem embora os esforços da Rede de Arquivos do Algarve.
Finalmente, apontou-se a adesão à Rede Regional de Museus e a designação de um interlocutor regional das misericórdias como aspectos principais para o estreitamento do trabalho conjunto e para a consumação do protocolo existente a nível nacional.
Os museus, pólos museológicos ou núcleos são testemunhos do real através dos objectos que incorporam. Esses objectos seleccionados representam valor de conhecimento e de informação, pois comprovam uma realidade e transmitem uma narrativa.
As misericórdias são amplamente reconhecidas pela sua dimensão de protecção social, todavia, também foram espaços de lutas partidárias e mesmo instrumentos de domínio político. Foram instituições hospitalares e instituições de crédito. No passado dia 18 de Maio comemorou-se o Dia Internacional dos Museus, este ano com o tema Museus e Histórias controversas: dizer o indizível nos museus, que se constitui como excelente oportunidade para conhecer as histórias locais das misericórdias.
O desejo fica também manifesto das “Misericórdias do Algarve” passarem a integrar, com uma representação de proximidade regional, as redes de cooperação regional.
O desafio de criação de umas jornadas regionais de museologia ficou também expresso e foi aceite, para que esta possa ser uma reflexão continuada e partilhada publicamente.
Musealizar significa dar voz a objectos, às colecções. Representar a história das misericórdias, criar uma narrativa e apresentá-la ao público é essencial. Este é um trabalho que se pode e deve ser iniciado em rede.
(Artigo publicado no Caderno de Artes Cultura.Sul)