“Em cúmulo jurídico, o arguido é condenado a pena de seis anos de prisão”. Esta foi a sentença lida pelo líder do coletivo de juízes Francisco Henriques relativamente a Ricardo Salgado.
Na definição da sentença, não houve referência à doença de Alzheimer, que levara a defesa do ex-banqueiro a pedir a absolvição ou pena de prisão suspensa, e o juiz não fez, esta segunda-feira, 7 de março, qualquer referência à suspensão da pena. Sobre a doença, disse apenas que o diagnóstico se deu como provado.
“Feita a prova do processo, o tribunal deu como provado a quase, quase totalidade dos factos constantes da acusação, principalmente relativamente aos três grandes grupos factuais, os movimentos financeiros com a Green Emerald [via Helder Bataglia], da Enterprises diretas para o arguido, e o terceiro grupo dos movimentos para a conta do Bergolino [via Henrique Granadeiro]”, segundo declarou o juiz Francisco Henriques.
Salgado precisa de autorização para sair de Portugal
Por cada transferência, a coima parcela foi de 4 anos, resultando nos seis anos de prisão da sentença.
Esta foi a decisão do coletivo de juízes liderado por Francisco Henriques, tomada no Campus de Justiça, em Lisboa, esta segunda-feira, 7 de março. Ricardo Salgado não ouviu presencialmente a sentença, tendo sido dispensado da sessão.
Após a leitura da sentença, o juiz deu espaço para que o Ministério Público e a defesa se pronunciassem sobre se se justificava a alteração das medidas de coação aplicadas a Ricardo Salgado. O procurador Vítor Pinto viu “perigo de fuga” e quis acrescentar à lista de medidas impostas a proibição de se ausentar para o estrangeiro, com a obrigação de entrega do passaporte.
“O perigo de fuga tem de ser real, não presumido”, respondeu Adriano Squilacce, advogado de Salgado, lembrando que é necessário “perigo concreto”, e que sempre se ausentou comunicando aos autos com uma “morada concreta”, referindo nas viagens feitas à Suíça, onde ia ter com a filha.
O juiz concordou considerou que havia uma alteração das circunstâncias, solicitou a entrega do passaporte e disse que qualquer saída para o estrangeiro carece de autorização de um juiz.
A acusação do Ministério Público apontava para três crimes de abuso de confiança, justificados por três transferências suspeitas de 10,7 milhões de euros que saíram de entidades do Grupo Espírito Santo para a esfera privada de Ricardo Salgado, inclusivamente através de Henrique Granadeiro e Helder Bataglia.
Estes crimes saíram da Operação Marquês, tendo sido os únicos que, relativamente a Salgado, passaram pela instrução do juiz Ivo Rosa.
Este é o primeiro processo-crime em que há uma decisão judicial relativamente a Ricardo Salgado, o homem todo-poderoso que esteve à frente do Banco Espírito Santo por 22 anos e que chegou a ser apelidado de “Dono Disto Tudo”. Até aqui, houve condenações a Ricardo Salgado, mas relativamente a contraordenações administrativas, saídas do Banco de Portugal.
Decisão pode ser alvo de recurso
A defesa de Ricardo Salgado, liderada por Francisco Proença de Carvalho, tentou a suspensão do julgamento devido ao diagnóstico de doença de Alzheimer, que não foi aceite pelo coletivo de juízes. Mesmo assim, esse foi o argumento dos mandatários para que não houvesse nenhuma pena de prisão efetiva – caso não houvesse lugar a absolvição, como defendiam. O Ministério Público pediu uma pena de prisão mínima de dez anos de prisão para Ricardo Salgado, até por não haver arrependimento.
Esta decisão é recorrível e suspende a ordem de prisão, que só se efetiva quando o caso transitar em julgado e se confirmar a pena agora decidida.
Salgado ausente
Ricardo Salgado não se dirigiu ao tribunal para ouvir a sentença do coletivo de juízes relativamente aos crimes de abuso de confiança, mas, ao entrarem para o tribunal, os seus advogados receberam perguntas de lesados do Banco Espírito Santo – apesar de esse não ser o tema deste processo que não saiu da derrocada do GES, mas sim da Operação Marquês, que tinha José Sócrates como protagonista.
Explicando que Salgado tinha sido dispensado de vir a tribunal, o advogado Francisco Proença de Carvalho respondeu que o antigo banqueiro sempre se preocupou com quem perdeu dinheiro com a queda do banco.
“Temos muito respeito pelos lesados. O Dr. Ricardo Salgado também tem muito respeito pelos lesados”, respondeu Proença de Carvalho quando interpelado por um lesado, que pediu um documento escrito que garantisse que havia uma provisão escrita nas contas do antigo BES para pagar aos prejudicados pela derrocada da instituição financeira.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL