Andrei Kozyrev foi o primeiro ministro dos Negócios Estrangeiros da Federação Russa após a dissolução da União Soviética, cargo que ocupou entre 1990 e 1996, durante a presidência de Boris Ieltsin. Kozyrev é alguém que conhece bem Putin, que descreve como “um ator racional”, motivo pelo qual não acredita que a Rússia use armas nucleares, mesmo depois de o Kremlin ter dado ordens às suas chefias militares para colocarem as forças nucleares do país em alerta máximo.
“Há muitas discussões sobre a ameaça de uma guerra nuclear por parte do Kremlin e sobre se Putin é racional”, escreveu o antigo MNE russo no Twitter. Na mesma publicação, Andrei Kozyrev partilhou a sua visão: “Não acredito que a Rússia usaria armas nucleares e acredito que Putin é um ator racional”.
Na opinião de Kozyrev, “a ameaça de uma guerra nuclear é outro exemplo da racionalidade” do presidente russo. Porquê? “O Kremlin sabe que pode tentar extrair concessões, seja da Ucrânia ou do Ocidente, ao puxar da última carta no baralho: armas nucleares”.
O ex-MNE russo acredita que Putin “não usará intencionalmente armas nucleares contra o Ocidente”. E diz intencionalmente porque “bombardeios indiscriminados perto de uma central nuclear podem causar um desastre nuclear não intencional na Ucrânia”, adverte Kozyrev.
Numa análise às dúvidas levantadas sobre a racionalidade de Putin, o ex-ministro discorda da “maioria das pessoas, principalmente no Ocidente” que “consideram a decisão de invadir a Ucrânia como totalmente irracional”. “É horrível, mas não é irracional”, sentencia Kozyrev. Por outras palavras, as do antigo MNE russo, Putin “calculou mal” a invasão da Ucrânia, “mas isso não o torna louco, simplesmente errado e imoral”.
De acordo com a análise de Andrei Kozyrev, “Putin passou os últimos 20 anos a acreditar que a Ucrânia não é uma nação real e, na melhor das hipóteses, deveria ser um estado satélite” russo.
A revolução da Maidan, sustenta o antigo ministro dos Negócios Estrangeiros, “acabou com qualquer esperança de manter a Ucrânia independente e pró-Kremlin”. E na cabeça de Putin, acrescenta, “o Ocidente estava por trás disso”. Ora, “se o governo da Ucrânia não pode ser mantido independente e pró-Kremlin secretamente, como Putin provavelmente concluiu, então ele irá forçá-lo abertamente a ser”, observa Andrei Kozyrev.
Até porque o presidente russo “começou a acreditar na sua própria propaganda de que a Ucrânia é governada por um bando de nazis e seguidores de Stepan Bandera”, nacionalista ucraniano que colaborou com Hitler durante a Segunda Guerra Mundial, acusado de perseguir e denunciar judeus, russos e polacos. Este foi, refere Kozyrev, o “pretexto perfeito para “desnazificar” a Ucrânia.
Além disso, completa o ex-MNE, “a elite governante russa acreditou na sua própria propaganda de que o Presidente Biden é mentalmente inapto” e convenceu-se de que “a UE é fraca por causa do quão inúteis foram as sanções em 2014”. O fracasso dos EUA na retirada do Afeganistão, conclui Kozyrev, só “reforçou essa narrativa”.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL