Agricultores e cidadãos organizam a marcha de protesto “o CEAT também é dos Agricultores” a acontecer no dia 3 de dezembro, pelas 16:00, com início frente à Câmara Municipal de Tavira e fim frente ao Centro de Experimentação Agrária de Tavira (junto à estação de comboios de Tavira).
A manifestação decorre enquanto se discute o plano estratégico nacional da política agrícola comum (PEPAC) e vai contar com a presença de cidadãos, agricultores biológicos e pequenos e médios agricultores tradicionais.
O Movimento de Cidadãos pelo CEAT e Hortas Urbanas de Tavira explica em comunicado que “os agricultores e cidadãos reivindicam infraestruturas de apoio no CEAT, espaço público do estado português tutelado pelo Ministério da Agricultura. Denunciam destruição do conceito de “centro agrário” e a total deturpação do propósito histórico para o qual foi desenvolvido este espaço que conta com 95 anos de existência. Exigem que a Delegação do Sotavento da Direção Regional de Agricultura e Pescas do Algarve apoie e sirva os agricultores os quais são justamente os garantes da segurança alimentar e da produção dos produtos que alicerçam os valores e princípios da apregoada Dieta Mediterrânica e da alimentação sustentável, encontram-se em “vias de extinção” e enfrentam inúmeras dificuldades, nomeadamente a falta de suporte e infra estruturas públicas que assegurem a formação de agricultores e trabalhadores agrícolas no âmbito de cursos práticos de poda, enxertia, apicultura, horticultura, fruticultura, máquinas agricultura, competências ligadas às cadeias de produção e comercialização, bem como de carências no que concerne à aprendizagem de práticas mitigadoras das mudanças climáticas no âmbito duma agricultura regenerativa, biológica ou tradicional, só para mencionar algumas”.
Para já os agricultores ficaram “sem casa”. O atual plano para um novo Pólo de Inovação para a Alimentação Sustentável (Terra Futura) privilegia na prática todo o tipo de entidades, actividades e interesses menos os interesses dos agricultores e de uma agricultura realmente sustentável, preservadora da biodiversidade e produtora de alimento bom, limpo e justo. Cidadãos de várias cidades do Algarve e do País já confirmaram presença na marcha de protesto que está marcada para o próximo dia 3.
Na sessão ocorrida no passado dia 24 de novembro de 2021 de apresentação da nova arquitetura para o Centro de Experimentação Agrária de Tavira (CEAT), como polo de inovação, “foi tudo muito bonito mas para os agricultores não há lugar naquela que deveria ser a casa dos agricultores, de apoio a todos os agricultores”, pode ler-se no comunicado.
O edificado que é historicamente para a formação dos agricultores passa a ser para uma clínica biomédica, a ABC Biomedical Center e porventura o restante edificado é entregue a outras “entidades” sem qualquer ligação direta à agricultura e não é dada nem uma palavra para a formação e para estruturas de suporte aos agricultores.
O movimento diz que ficou a saber que “a antiga estação agrária de Tavira vai receber um campus ligado à dieta mediterrânica, mais um centro digital de bem-estar e cuidado no envelhecimento”.
Através de um protocolo assinado entre a Algarve Biomedical Center, a autarquia tavirense e a Direção Regional de Agricultura e Pescas do Algarve, atribuem a “essa clínica o edifício que sempre serviu para dar formação aos agricultores. Esse edifício foi historicamente o local da formação dos agricultores, porque tem condições e está vocacionado para tal: tem cantina, sala de convívio, quartos para alojamento, 30 hectares de terra para praticar. Nele se realizaram cursos de tratoragem, de podas, jornadas, intercâmbios, concursos, convívios e trocas de experiências”.
Os agricultores afirmam que divulgaram “informação que não foi mencionada na sessão de anteontem [24 novembro] mas que está explícita na TERRA FUTURA – Agenda de Inovação para a agricultura – GPP: o pólo de alimentação saudável de Tavira é o único pólo não agrícola do país! Supomos que na sequência de decisão unilateral da Capital do nosso país que pretende continuar a olhar o território Algarvio como um grande resort turístico. Denote-se que também o Algarve não possui pólo regional do INIAV nem tem recursos de investigação suficientes no curso de agronomia da UAlg a que os agricultores possam recorrer apesar de conter inúmeras tradições agrícolas centenárias e nichos de mercado específicos dadas as suas condições climatéricas”.
O Movimento de Cidadãos pelo CEAT e Hortas Urbanas de Tavira lembra que “em Tavira, a valorização e o preço da terra subiu de 100% no espaço de dois anos e 2400% no espaço de uma década. Dados do último recenseamento agrícola indicam que há menos 15 mil explorações activas apesar do aumento da superfície agrícola útil. Ou seja, perderam-se pequenos e médios agricultores, mas as áreas de agricultura intensiva de sobreexploração e o interesse dos investidores, principalmente estrangeiros, sequiosos de recursos globalmente escassos como solo, água e clima não pára de aumentar”.
Ora, para que exista a produção de alimentos em pequena escala e multiproduto, para garantir a tão propalada segurança alimentar, “tem que se criar condições para que os agricultores produzam, ou sequer existam. Um dos maiores problemas na agricultura actual é o da formação e da existência de pessoal que saiba trabalhar na agricultura. Estarão a acabar com o conceito de “posto agrário”? a alimentação sustentável é alicerçada em quem? com produtos variados de onde? quem é que sabe trabalhar hoje em dia para produzir a alimentação apregoada? o CEAT transformou-se de centro agrário em centro de alimentação? e essa alimentação é proveniente de quem? e como é que é produzida?”.
Talvez a primeira ideia que se deveria ter equacionado projetar para aquele espaço fosse “a criação de um pólo de formação profissional (género escola agrícola) ou ainda um politécnico (género escola superior agrária) onde houvesse ao mesmo tempo serviços de apoio aos agricultores da região”
“É inadmissível Tavira estar tão afastada da formação dos jovens e do apoio aos agricultores, tomando em linha de conta a importância estratégica que já teve no passado, ao nível da região do Algarve, e das infraestruturas que o CEAT possui direcionadas para investigação, apoio e preservação de património agrícola, mas também tendo em linha de conta o presente actual e um futuro a longo prazo”, refere o movimento.
“Defendemos a existência do centro de Dieta Mediterrânea. Mas não podemos aceitar que, num centro de formação e experimentação agrária uma das primeiras acções a cumprir seja dar o edifício dedicado à formação dos agricultores (não só de Tavira, mas da região e até do país), e outros edifícios, a diversas entidades, SEM sequer terem estabelecida a logística e a calendarização para o suporte e formação dos agricultores; isso é a demonstração de que os discursos repetem o que no momento ‘fica bem’ dizer, mas as decisões continuam no sentido de gastar o dinheiro sem ter em conta o que é fundamental para que o país ganhe independência alimentar e para que os benefícios fruam para todos os cidadãos. Falam em ‘alhos’ e as decisões são sobre ‘bugalhos’”, pode ler-se no comunicado enviado às redações.
O Movimento de Cidadãos em Defesa do CEAT diz que se “conseguiu travar a estrada para ali proposta pela Câmara Municipal – trata-se de contar a história corretamente – também irá conseguir o seu objectivo principal, a Revitalização do CEAT como centro de experimentação agrária”.
Atualizado 09:30 29/11/21