Transpor a porta de um hotel no qual não se está hospedado pode ser intimidante. Mas esta barreira está cada vez mais ultrapassada em nome de algo maior. Pelo menos para os foodies, os hotéis com restaurantes com estrela Michelin são um destino, que os faz encarar o possível desconforto e até mesmo viagens de longa distância.
A nova sala do LAB by Sergi Arola é onde a experiência começa, com um estendal de ‘Loucuras’. Foto D.R.
Para quem mora em Lisboa, ir a Sintra apenas para jantar ou almoçar é equivalente à ideia de passar a fronteira nacional, duas vezes no mesmo dia. Mas o facto de ser um hotel fora da capital (integrado no Parque Natural Sintra-Cascais) não é uma barreira aos inspetores do Guia Michelin, que distingue com uma estrela três dos nove restaurantes do Penha Longa Resort. Um deles, porém, encontra-se em Lisboa e é o premiado mais recente, mas já lá vamos.
Comecemos por aquele que é o primeiro ‘estrelado’ e que este ano tem uma nova sala, que divide a experiência entre o primeiro piso e a sala já existente. O LAB by Sergi Arola ganha uma estrela em 2016 (um ano depois de ser inaugurado) e mais do que um restaurante é um laboratório gastronómico. Aqui, o chefe catalão não coloca limites nas combinações de ingredientes, técnicas e apresentações mais improváveis, que cruzam as referências gastronómicas de Portugal e de Espanha.
No Midori, o falso tofu de couve-flor, a tartelete de grão-de-bico e o toro com gema de ovo e caviar são algumas das propostas da entrada Hassun. Foto Luís Ferraz D.R.
O primeiro momento da refeição, denominado ‘Loucuras’, lança o mote, apresentando um estendal (literalmente) de tapas frias e quentes, com reinterpretações do gaspacho e do bolo do caco, por exemplo. Apesar de os dois menus de degustação terem sido criados por Sergi Arola, o serviço é assegurado por Vladimir Veiga, que faz as honras da casa na nova sala no primeiro piso, com cozinha aberta e vista panorâmica sobre o campo de golfe. O segundo momento passa para o piso inferior e as opções dividem-se entre os menus ‘Pela Serra Dentro’ e ‘Pela Serra Fora’. Neste último destaca-se o inusitado pregado escalfado em água da praia do Abano e a improvável sobremesa que junta sardinha, amêndoa, coco e alho negro.
O LAB abre de quarta-feira a sábado, mas o Midori encerra apenas ao domingo e à segunda-feira, ambos servindo só jantar. Não é por funcionar mais um dia da semana que o Midori é menos exclusivo. Aliás, há mais de 20 anos que é o motivo que leva apreciadores de comida japonesa até ao Penha Longa. Mas desde 2017, a experiência eleva-se para a alta cozinha de autor pelas mãos do chefe Pedro Almeida, refletindo a sua origem portuguesa e percurso pelo Japão. A referência nipónica está presente na lógica dos dois menus disponíveis, que recriam o kaiseki, banquete formal da cozinha tradicional japonesa, com vários pratos e porções minimalistas.
Camarões da costa com gel vegetal e granizado de tomate ‘velho’ são parte do menu do Eneko. Foto D.R.
A forma de apresentação dos menus disponíveis (‘Kiri’ e ‘Yama’) honra o passado, mas os seus conteúdos materializam uma espécie de ficção gastronómica luso-japonesa. Falso tofu de couve-flor, miso de caldo verde e cabeça de xara com enguia são algumas das criações, que terão contribuído para somar pontos na atribuição da estrela Michelin, em 2018. A distinção acontece um ano depois de reabrir com o novo posicionamento, espaço redecorado com acesso por uma porta secreta e apenas 18 lugares por noite. A opção pelo surpreendente em oposição ao normal é assumida por Pedro Almeida, que além de liderar o Midori é o chefe executivo de todos os restaurantes do Penha Longa, que se encontram dentro ou fora da propriedade em Sintra.
A extensão da estratégia de aposta na gastronomia de autor para fora de portas acontece em 2019, com a abertura em Lisboa do Eneko, que divide o antigo espaço do Alcântara Café com o Basque, que tem um conceito mais informal. Para ficar à frente dos dois restaurantes, o Penha Longa vai buscar o chefe basco Eneko Atxa, que em Espanha já soma seis estrelas Michelin. É no restaurante que leva o seu nome que Eneko Atxa ganha, em 2020, a primeira estrela em Portugal, com dois menus de degustação que destacam as suas raízes bascas.
As novas suites ‘Sintra’ (na foto) e ‘Cascais’ são um acréscimo à oferta e a sua decoração será seguida na renovação do hotel, em 2022. Foto D.R.
O fortalecimento da posição na alta cozinha é deliberado e assumido por Oliver Key, diretor-geral do Penha Longa, certo de que a gastronomia eleva o perfil do resort e atrai hóspedes que valorizam esta componente. Metade dos clientes dos restaurantes estrelados que se encontram dentro da propriedade com 220 hectares são não-hóspedes, na maioria portugueses e estrangeiros residentes em Portugal. Para Oliver Key é difícil aferir o impacto das estrelas Michelin na venda de quartos, mas há quem se hospede no Penha Longa por causa desses restaurantes.
Nesta matéria, o hotel também tem uma estratégia concertada. Desde maio e até dezembro de 2021, há o Pacote Gastronómico Michelin, que inclui dormida, pequeno-almoço e jantar num dos três restaurantes. As opções são entre o menu ‘Umi’ no Midori, o ‘Descoberta’ no LAB by Sergi Arola e o ‘Erroak’ no Eneko. A pernoita pode ser também o pretexto para ‘estrear’ uma das duas novas suites (‘Sintra’ e ‘Cascais’), com vista sobre o Parque Natural Sintra-Cascais, o Penedo, o mosteiro do século XIV e o palácio do século XVI, que integram a propriedade a par com dois campos de golfe premiados. Para os não-foodies, há vida além da gastronomia.
Penha Longa Resort
Pacote Gastronómico Michelin a partir de €350 por noite
Quartos a partir de €230 até €2500 (Suite Imperial)
Estrada da Lagoa Azul, 2714-511 Linhó, Sintra
Tel. 219 249 011
Notícia exclusiva do parceiro do jornal Postal do Algarve: Expresso