A AGECAL organizou durante os dias 4 e 5 de Maio de 2018, em Tavira, uma “Conferência Internacional sobre Gestão Cultural”, cujos textos, reflexões e perspectivas partilharemos com as pessoas interessadas e também no “Cultura.Sul”.
Portugal é um ser histórico-cultural de cuja preservação e evolução positiva depende um futuro inclusivo e integrador.
Num território soberano há mais de oito séculos, continental e insular, Estado e nação continuam a coincidir. O português com 290 milhões de falantes é a quinta língua mundial e idioma oficial de oito Estados independentes.
A importância cultural do País é uma evidência, existe património de origem portuguesa reconhecido pela UNESCO em todos continentes, o que transcende largamente a dimensão geográfica ou demográfica.
A cultura e a língua deveriam ser, em nossa opinião, eixos estratégicos das políticas públicas.
Para analisar com profundidade e detalhe a situação cultural portuguesa e das políticas publicas nas últimas décadas, a sociologia da cultura recorre e analisa informação caracterizadora produzida por organismos oficiais e séries estatísticas disponíveis. Do ponto de vista da economia cultural portuguesa o saldo das transações de bens culturais teve em 2016 um agravamento de -25,7 %, isto é o País importou nesse período 150 milhões e exportou apenas 39,55 milhões de euros. Interessa a todos aprofundar estes dados.
A atribuição à Cultura de 0,2% do Orçamento Geral do Estado representa o desfasamento entre a importância da cultura nacional e os meios disponibilizados para a sua afirmação.
As dificuldades do sector em se organizar e de ter uma voz resultam de estruturas excessivamente corporativizadas e pouco cooperantes entre si, a que se juntam outros fenómenos negativos internos. A discussão dos regulamentos sobre os apoios à criação artística parece ser o principal motivo mobilizador, como se as políticas públicas para a cultura se resumissem ao modelo de distribuição de recursos financeiros para as artes.
O sector profissional da cultura em Portugal com 81.700 trabalhadores era em 2016 o mais qualificado de todos, 43,9% dos seus trabalhadores possuíam o ensino superior, contudo continuava a precariedade laboral e instabilidade, necessidades de reforços e de formação. Não existe ainda em Portugal licenciatura em Gestão Cultural, disciplina fundamental e incontornável na formação de quadros para a crescente complexidade das tarefas, mas algumas pós-graduações e mestrados.
No plano do consumo cultural, que inclui despesas com tecnologias, as assimetrias são evidentes, as famílias portuguesas gastaram em média 845 euros anuais contudo nas zonas rurais apenas 500 euros enquanto em Lisboa e Vale do Tejo 1138 euros e no Algarve 829 euros.
Monumentos, museus e palácios tiveram entre 2011 e 2016 uma enorme procura com +44% de visitantes, um aumento médio de 10% anuais. Contudo subsistem velhos problemas de manutenção de edifícios, escassez de recursos humanos, pouco investimento na investigação, em reservas e na aquisição de espólios.
As bibliotecas públicas em Portugal registaram ligeira diminuição do acesso à leitura presencial mas aumento das actividades complementares como conferências, encontros de leitores, hora do conto. Cerca de 17,7 % de adultos e 24,7 do público infanto-juvenil estão inscritos nas bibliotecas portuguesas.
No cinema em 2016 dos filmes 1168 exibidos em Portugal 63,5 % eram de origem norte-americana, 30% co-produções internacionais e apenas 5% produzidos na União Europeia. Os filmes de origem portuguesa foram apenas 2,3%, 0,9 % de França e 0,5% de Espanha.
Em 2016 surgiram 64 novos festivais em Portugal sendo nesse ano 249 o total de festivais, a grande maioria de música ligeira e jazz, apoiados por empresas e autarquias. Todos os dias surgem novos festivais para onde são canalizados importantes recursos financeiros.
Algumas tendências actuais são evidentes: o aumento de actividades culturais efémeras, designadas por “eventos”, virtualização, festivalização e turistificação da cultura.
Os centros históricos das cidades europeias estão a ser transformados em parques temáticos, polos de negócios das empresas multinacionais com saída dos habitantes para as periferias. A continuar este processo ficarão os monumentos e museus como plataformas que interessam na atracção de consumidores.
Do ponto de vista económico-cultural a globalização é predominantemente anglo-saxónica, o que induz dependências várias na esfera da economia, diminuição de capacidades regionais e locais, empobrecimento da riqueza e diversidade cultural.
Face ao enorme potencial cultural do País e da Europa será decisivo que Governos, profissionais da cultura e cidadãos compreendam e tomem as medidas, e não apenas defensivas, para preservar e transmitir a herança cultural do País, tal com defende a UNESCO nas suas Convenções para a defesa do equilíbrio ambiental e social do planeta.
(Artigo publicado no Caderno Cultura.Sul de Maio)