A época dos fogos
Apesar de todas as medidas de prevenção, como limpeza de terrenos e de bermas de estradas, volta-se hoje a verificar o flagelo dos incêndios florestais, destruindo casas, património e, por vezes, também vidas humanas.
Foi com enorme esforço financeiro e de recursos que se verificou a aquisição por parte do Estado de sistemas de comunicação como o SIRESP, a aquisição de serviços que, bem ou mal, foram realizados para tentar combater em tempo, o caos anunciado da época dos fogos. No entanto, após tudo isto, continua, ano após ano, o flagelo a acontecer, e com uma dificuldade de gestão enorme, em momentos de crise.
O problema é complexo e persiste, porque é estrutural do nosso território. A economia da floresta não funciona, logo, não existe o cuidado da sua proteção e também o estímulo económico e o plano adequado para que seja realizada a plantação de espécies mais resilientes. A floresta que existe é de monocultura, a população não tem alternativa senão optar por algo que seja economicamente mais vantajoso e logo as espécies autóctones como o carvalho, o azinheiro, o sobreiro, são tantas vezes preteridas. Compreende-se que as pessoas abandonadas, tantas vezes, pelo Estado após o desastre, tentem aquilo que mais lhes poderá render, não tendo apoios para fazer algo que seja diferente.
Dos chamados Planos Municipais da Defesa da Floresta Contra Incêndios só se obteve apenas mais uma restrição urbanística à construção e pouca prática de proteção efetiva no que diz respeito à Proteção Civil. No Algarve, os referidos planos foram quase todos elaborados pela anterior legislação, não tendo sido traduzidos para os PDMs, uma vez que não foram revistos.
Assim, não se respeitou o direito à participação pública, nem o direito à transparência, sendo, no entanto, exibidos e aplicados como um plano a cumprir do ponto de vista da proibição, desprezando os direitos mais fundamentais da Constituição.
As reconstruções das habitações e os novos PDMs
A reconstrução das habitações ardidas é de uma necessidade imperiosa para a fixação das populações, no entanto, parece ter existido uma delonga e um arrastar da situação nas zonas ardidas no Algarve, como seja, em Monchique.
Qual a motivação para atrair pessoas e investimento para um concelho deprimido, se não existe proteção do Estado em eventos extraordinários como sejam os fogos?
Será de toda a importância planear e criar as oportunidades certas para atrair população. Para tal, a reconstrução é de grande relevância e os apoios financeiros do Estado absolutamente necessários para tal objetivo. A construção de habitação social, o planeamento de parques industriais ligados à água por exemplo, ou à matureza, serão algumas das opções a ter em conta, para a revitalização do concelho. Se conseguir inverter a tendência da desertificação do interior, naturalmente, os incêndios serão também reduzidos, uma vez que existirá um desenvolvimento mais equilibrado do interior.
A revisão do PDM será de toda a relevância, mas mantendo a visão da excecionalidade, das regiões deprimidas, e não a aplicação cega de regras nacionais, como seja a redução de perímetros urbanos.
Visão integradora e de consciencialização do cidadão
As estruturas locais e nacionais terão obrigatoriamente que acautelar a visão integradora de um território, pelo que a floresta, os matos, a agricultura e o solo rural devem progredir economicamente, devendo ser tratados com igual atenção. O isolar, proibindo, poderá nalguns casos piorar o estado atual de abandono, daí, o problema ser complexo. A estruturação do território deverá obedecer a leituras cruzadas, privilegiando os compromissos e o crescimento sustentável dos territórios. Daí que os estudos criteriosos, da geografia, da ocupação do solo, da estrutura viária, das fontes de água e das estruturas urbanas, devem ser rigorosos sob pena de existirem planos pouco fiáveis, criando injustiças.
A formação das populações é também uma aposta importante, uma vez que aumenta a preparação das pessoas para encarar os novos fenómenos naturais, podendo salvar vidas. Esta situação não deverá ser descurada, para que a consciencialização do cidadão seja a maior aliança, no momento de crise.
(Artigo publicado no Caderno Cultura.Sul de agosto)
(CM)